E só nos apeteceu pegar nelas, nas bicicletas, oito dias depois! A vida em Beja foi muito caseira. Por um lado devido ao mau tempo, com chuvadas contínuas, por outro, pela presença da mãe do Rafael, dos nossos filhotes de quatro patas e duma amiga que veio de Lisboa para estar connosco. E também porque nos sentíamos bem ali – em casa do António Revez, amigo e companheiro de trabalho – entre o dormir, o calor da salamandra e as conversas postas em dia.
Foram dias cheios! A comida foi em abundância! Vinda do norte, a mãe do Rafael trouxe mil e uma iguarias: bolas de berlim, húngaros, caladinhos, eclaires, bolo-rei, bolo de chocolate caseiro, seitan panado, tarte de legumes, caril de tofu, jardineira de soja! Passámos dias e dias a comer, só comer e nada desejávamos mais, tudo a acompanhar com o verdadeiro pão alentejano! Percorremos cafés conhecidos, espaços de encontro onde sabemos poder encontrar sempre aquela e aquela pessoa! Adiávamos mais, e mais, a partida. Se um dia era por causa da chuva, no outro já era o cansaço ou o termo-nos deitado tarde… ou qualquer outra desculpa que encontrávamos à pressa para justificar este adiamento.
Mas o dia chegou e levou-nos Alentejo acima, a Montemor-o-Novo, percurso feito a muito custo em que, 90 dos 100 quilómetros nesse dia, foram contra o vento. Resultado? Além de termos ficado completamente de rastos, a noite que estava prevista, passou a duas e, assim, também nos deu mais tempo para visitar o local e algumas das instituições culturais que se instalaram em Montemor. É o caso do Espaço do Tempo, um espaço de residências artísticas, desenvolvido no Convento da Saudação pelo coreógrafo Rui Horta, e das Oficinas do Convento, no Convento de São Francisco, onde a nossa amiga trabalha. Pelo dia fora, a conversa cultura esteve sempre em cima da mesa… inevitavelmente! Dois dias depois pedalámos apenas 55kms para chegarmos a Coruche, a terra onde o Gonçalo Cabecinhas nos tinha oferecido poiso, se assim o desejássemos! E assim foi, contactámos o Gonçalo – um seguidor do nosso blog – e em resposta ele disse-nos: “Opá, isto foi mesmo muito em cima… mas venham pedalando que eu arranjo qualquer coisa!” O que não estávamos mesmo à espera era que, depois de termos esperado pelo Gonçalo uma hora no centro da vila, ele nos aparecesse e, como se nos conhecesse há anos, entabulasse uma conversa connosco e logo a empatia nascesse! A seguir, apontou-nos o local onde iríamos dormir, “lá em cima, perto daquelas vivendas” e, espanto nosso à chegada ao topo, era uma residencial… é verdade, o grande Gonçalo tinha reservado um grande quarto de hotel para nós, com uma grande cama, um grande pequeno-almoço e uma grande vista sobre Coruche! E a isto que podemos nós dizer? És grande, Gonçalo! Muito obrigado! Não estivemos com ele mais de meia hora, a não ser no dia a seguir, quando com ele falámos ao telemóvel, querendo saber se tudo tinha corrido bem! Excelente!
Dali, seguimos por ruas travessas até ao Cartaxo, não sem antes termos parado em Marinhais onde o Rafael se lembrou que o nome da terra não lhe era estranha. Depois de descobrir a razão, saltámos das bombas de gasolina para os correios e de lá para cafés e de lá para um supermercado, sempre dando apenas os 3 nomes principais das pessoas que conhecíamos e poucas informações mais. E perguntando de local em local, descobrimos quem os conhecesse e tivemos um encontro emocionante! Não fosse termos coisas já marcadas no Cartaxo, acho que tínhamos ficado ali a dormir! No entanto, uma prima da Tanya esperava-nos desde o dia 6, e já estávamos a 8! Pedalámos mais umas quantas aldeias até chegar à cidade e sermos acolhidos em “nossa casa”! Ali passámos 3 noites e, se desde a nossa entrada no Alentejo a viagem tinha sido de reencontros, aqui atingiu o seu auge! Não foram só as primas e os maridos, foram também os pais da Tanya e o irmão mais novo e o pai do Rafael que nos apareceram pela frente, de surpresa, no último dia da nossa estadia. As lágrimas nasceram nos olhos e os abraços foram ditribúidos cheios de emoção pelo meio! Há nove meses que os ouvíamos pelo telefone e os víamos pelo ecrã do computador. Assim, passámos mais um dia em família! Mas os encontros não ficaram por aqui! Mesmo ali ao lado, no CCC – Centro Cultural do Cartaxo, era apresentada a peça “Contos em Viagem – Brasil, outras rotas”, pelo Teatro Meridional e, encontrar amigos e companheiros de teatro outra vez, foi a verdadeira festa! À noite assistimos à peça e discutimos, como sempre, criticando e dando o nosso ponto de vista! O encontro em Lisboa, fica para breve! Quando vemos coisas novas ligadas a teatro, o bichinho lembra-nos que adoramos a nossa profissão e outro bichinho se levanta de imediato dizendo que adora viajar e outro ainda, que adorava ter um hostel e outro, um “negócio” vegetariano e outro…e por aí fora, sem parar, porque são tantos os bichinhos dentro de nós, a querer fazer tanta coisa, tantos desejos, que não sabemos para onde nos virar. Este fim que se aproxima, pois chegamos dia 16 a Ovar, vai exigir de nós uma paragem, uma reflexão e um plano para as nossas vidas! Tudo pode acontecer! Estamos abertos a propostas!