Parece mentira que ainda não vos tenha falado do Pedro e Inês chilenos. Uma história de amor que apesar de não ter um final tão trágico como a do nosso Pedro e Inês, não deixa de ser uma história de amor impossível em tempos difíceis. Mais uma coincidência improvável entre o imaginário coletivo chileno e português.
Pedro de Valdivia, conquistador do Chile e fundador das cidades de Santiago, La Serena, Concepción e Valdivia. Inés de Suárez, costureira de Placencia, “viúda de Índias” e, em virtude das tribulações que vos vou contar, a primeira mulher espanhola (e europeia) a chegar ao Chile.
Inés de Suárez, a nossa costureira de Placencia, casou-se com um tal Juan de Málaga, quem ao fim de um ano de casados, decidiu partir para o Novo Mundo em busca de façanhas, fama e glória. Correria o ano da graça de 1528, mais ano, menos ano, quando Juan de Málaga partiu rumo ao Panamá para “hacer las Americas”.
Inés deixou de ter notícias de Juan, os anos foram passando, dez anos para ser mais exatos, e cansou-se de ser “viúda de Índias” nome dado às mulheres casadas que ficavam sozinhas em Espanha à espera de notícias dos maridos embarcados para o Novo Mundo.
Em 1537, conseguiu, por fim, a licença real que permitia a uma mulher casada viajar sozinha para a América. Embarcou rumo ao Panamá à procura do seu marido. No Panamá soube que Juan de Málaga tinha seguido para Cuzco, capital do Império Inca, com as tropas de Francisco Pizarro e de Diego de Almargo. Uma vez chegada Cuzco, recebeu a notícia de que o seu marido tinha morrido na batalha das Salinas (batalha que enfrentou as tropas de Pizarro e Almargo pelo controlo da cidade de Cuzco). Por ser viúva de um soldado espanhol foi-lhe entregue uma casa onde viver. Voltou a trabalhar como costureira e adquiriu conhecimentos de enfermagem.
Só pelo facto de ter conseguido viajar sozinha até ao Perú nos idos de 1500 e de aí ter conseguido obter os meios para subsistir e ali fazer uma nova vida já me parece uma façanha digna de contar. Mas a história de Inés de Suárez não termina por aqui.
Em Cuzco conheceu Pedro de Valdivia, mão direita de Pizarro, quem lhe viria a incumbir a tarefa de conquistar os territórios a Sul do Império Inca. Segundo reza a história foi um “flechazo”, amor à primeira vista entre ambos. De tal forma que quando Pedro de Valdivia partiu com a sua expedição rumo à conquista do Chile em 1540, Inés juntou-se à expedição como ajudante de cozinha. Marchou junto aos conquistadores espanhóis durante 11 meses, cruzou o desertou de Atacama e assistiu à fundação da cidade de Santiago, atual capital do Chile, em 1541. Era a única mulher naquela expedição e foi assim como se tornou na primeira mulher europeia a pisar o Chile… mas a história de Inés de Suárez ainda não acaba aqui.
A história da conquista do Chile é também a história da resistência do povo Mapuche. 200 anos durou a guerra de Arauco. Uma vez fundada a cidade de Santiago, Pedro de Valdivia partiu em nova expedição deixando a cidade com pouco mais do que 50 pessoas e 7 prisioneiros mapuche. Um outro 11 de Setembro (terá sido coincidência a escolha da data 400 anos depois?) o toqui Michimalonco atacou Santiago com centenas de soldados indígenas. Aqui podemos contar a história do cerco à cidade de várias formas, mas long story short no meio do aperto e face à desvantagem numérica dos espanhóis, a nossa Inés de Suárez teve a ideia de matar os 7 prisioneiros e como se dúvidas houvesse quanto à melhor forma de matar os prisioneiros, terá ela própria pegado numa espada e ZÁS!!! cortou ela a cabeça ao primeiro prisioneiro. As cabeças e os corpos dos 7 prisioneiros foram espalhados na Plaza Mayor e lograram amedrontar os indígenas que queriam incendiar a cidade. Por esta razão, Inés de Suárez é normalmente retratada de espada em punho, até mesmo nos livros infantis. Como recompensa pela sua valentia foi-lhe entregue uma “encomenda de índios” (pessoas indígenas ao seu serviço a troco da educação e cuidado das suas almas). A sua história poderia acabar aqui, mas…E como fica a tal parte da história de amor impossível-mas-não-tão-trágica-como-a-nossa?
Inés era viúva, primeiro das Índias e depois viúva de verdade. Pedro era casado e tinha a sua própria viúva das Índias viva da silva em Espanha. O facto de Pedro e Inés viverem “em pecado” diante de todos numa casa ali mesmo na Plaza Mayor de Santiago incomodava muita gente, principalmente os adversários políticos de Pedro de Valdivia.
Em 1548, pouco depois de ter assegurado o seu reconhecimento como Governador do Chile junto do representante da Coroa Espanhola no Perú, os seus opositores lograram que fosse instaurado um juízo de residência, processo pelo qual se julgava o desempenho e bom cumprimento das instruções recebidas no decurso do mandato dos funcionários públicos na época do Império Espanhol na América. Pedro de la Gasca, então Vice-Rei do Perú viria a desestimar todas as acusações contra Pedro de Valdivia com exceção de uma: a sua relação ilegítima com Inés de Suárez. A sentença foi clara, Pedro deveria trazer para o Chile a sua legítima esposa e Inés deveria voltar a casar ou abandonar Santiago do Chile.
E assim foi. Pedro de Valdivia mandou trazer a sua mulher desde Espanha, porém os dois nunca viriam a reencontrar-se, pois Pedro viria a morrer pouco depois na batalha de Tucapel em 1553, antes de ela chegar ao Chile.
Inés de Suárez casou com Rodrigo de Quiroga, futuro Governador do Chile, e morreu de idade avançada em 1580, tendo sobrevivido a todos os conquistadores espanhóis que chegaram com ela ao Chile.
Colorín, colorado, este cuento se ha terminado!
VISTO DE FORA
Dias sem ir a Portugal: 2 dias
Nas notícias por aqui: A reforma do sistema nacional de pensões, maioritariamente privado na atualidade.
Sabia que por cá… se celebra o dia da mãe no segundo Domingo de Maio.
Um número surpreendente: 681 atropelamentos mortais na Região Metropolitana de Santiago desde 2015.