As imagens são poderosas: fixam-se na retina para sempre, constroem narrativas que valem por si, reforçando ou destruindo uma mensagem. Sempre assim foi, mas hoje, quando uma imagem dá a volta ao mundo num ápice, mais verdadeira é esta máxima. A história de Greta Thunberg começa com uma imagem, das mais poderosas que se podem encontrar: uma estudante de 15 anos completamente sozinha, pequena e com ar frágil, a manifestar-se com um cartaz escrito à mão em frente ao Parlamento sueco durante a sua primeira greve à escola, em agosto de 2018.
Um ano e um mês depois de esta fotografia ter sido feita, o mundo assistiu meio incrédulo a quatro milhões de estudantes que ocuparam ruas em centenas de cidades, exigindo o mesmo que Greta andou a proclamar durante este período: medidas urgentes para combater as alterações climáticas. É avassaladora a vaga de mobilização que esta miúda, em idade de andar a pensar em namorados e em selfies, conseguiu criar em torno de uma causa, envolvendo as gerações que realmente serão vítimas da inércia e da falta de visão dos líderes atuais. Nunca, mas nunca, subestimar o poder de um jovem inteligente e determinado.
Greta vale pelo símbolo em que se tornou: o de uma geração zangada e com o futuro em risco. Ela veio esfregar na cara dos adultos aquilo que eles já sabem há 30 anos, mas preferiram convenientemente ignorar: que o planeta está a atravessar mudanças profundas graças à ação do Homem e que, se nada for feito, as consequências são irreversíveis e potencialmente catastróficas. Ela gritou aquilo que todos sabiam, mas ninguém ousava dizer alto: que o rei vai nu. E fê-lo de forma articulada, percetível e mobilizadora, com bases rigorosas – os seus discursos e intervenções são revistos por cientistas. Deixou, para sempre, de ser possível ignorar a urgência da justiça climática, porque os jovens de todo o mundo estão a olhar para nós.
Em tempos de redes, a medida do sucesso de quem traz uma mensagem disruptiva é calculada pela quantidade de críticas e de haters que reúne. Greta tem a sua quota-parte de detratores, que já disseram dela de tudo um pouco: há quem diga que é uma menina mimada que só quer faltar às aulas, há quem goze com o facto de ser Asperger, há quem garanta que é um fantoche nas mãos da indústria antipetróleo, há quem a compare com as miúdas de tranças da propaganda nazi (o conservador Dinesh D’Souza, filho de indianos de Goa e com ascendência portuguesa, apoiante de Trump), há quem critique que o seu discurso é radical e catastrofista e que não aponta caminhos nem soluções, ou que as suas escolhas, que incluem ser vegan, não andar de avião por causa das emissões de carbono ou não comprar roupa nova – não são isentas de problemas.
Há três décadas que o diagnóstico está feito, e pouco ou nada se evoluiu. Espera-se, pois, que seja uma teenager a encontrar a solução mágica para o que líderes mundiais ignoraram e a ser a rainha da consistência? Greta incomoda porque nos recorda a nossa vergonha, a nossa inércia, o nosso conformismo. E isso mói na consciência de quem prefere ficar sentado a criticar nas redes do que mexer uma palha em prol do bem comum. E só por isso, Greta, a imagem da revolta de uma geração e do embaraço de outra, merece uma estátua. Ou mesmo o Prémio Nobel da Paz.