A chanceler alemã juntou a sua voz de peso à de milhares de outros que julgam que o problema das migrações, e particularmente das forçadas, é o maior da Europa neste momento. Não é a primeira vez. Desde a negociação do último resgate à Grécia, a chanceler tem dito que o verdadeiro problema da Europa é outro, o dos refugiados. E tem razão.
Com os conflitos no Iraque (e no Curdistão), na Síria, com a pobreza e a irracionalidade dos talibãs paquistaneses e afegãos, com a miséria no corno de África e no Sahel, a maior parte dos líderes europeus entreteu-se a construir castelos de areia (com arame farpado, é certo) enquanto crianças, mulheres e homens morrem nas suas fronteiras. Cameron mandou pôr arame farpado na França, o que Hollande aceita porque é… Hollande. Viktor Órban, na Hungria, constrói muros e cercas. Na Itália, Lampedusa tornou-se um gigantesco centro de triagem de refugiados e os marinheiros italianos continuam a recolher cadáveres que boiam nas águas mornas do Mediterrâneo ou a resgatar pessoas exangues de embarcações à deriva e sobrelotadas. Na Grécia, a porosa fronteira continua a ser ponto de passagem para milhares de pessoas e a ilha de Lesbos tornou-se num enorme campo de refugiados. De Passos Coelho nem se fala: foi para a Europa regatear o número de refugiados que poderíamos acolher, quando a discussão era sobre a relocalização de 40 mil e há mais de 4 milhões nos países vizinhos da União Europeia!
O que durante muitos anos esteve à porta da Europa está agora dentro da nossa casa. E a culpa é de quem? Dos que nos procuram à procura de sobreviver? O espetáculo é trágico. Na Macedónia, o exército impediu a passagem dos refugiados que se encontravam em solo grego durante três dias, antes de abrir as fronteiras e deixá-los passar, rumo à Sérvia. Na Hungria, o grupo de milhares de refugiados foi gaseado e Viktor Órban mandou reforçar, com o exército, o musculado contingente policial que já se encontrava no local. Na Áustria, um camião frigorífico foi o túmulo de 70 imigrantes, à hora que escrevo ainda de nacionalidades desconhecidas, mas certamente de algum destes países onde grassa a guerra, a fome ou a miséria. Foi abandonado na autoestrada e, tudo leva a crer, fazia parte de um esquema montado pelo máfia romena para o transporte ilegal e tráfico de pessoas. Não vos faz lembrar nada? Como eram tratados os judeus, durante a II Guerra Mundial? Ou como o foram os refugiados alemães, depois de finda a guerra de 1939-45?
Já aqui escrevi, e mantenho, que a Europa precisa de um plano Marshall para que os países da cintura do Mediterrâneo se desenvolvam. Se as nações nossas vizinhas tiverem uma chance de viver em paz e uma oportunidade para se desenvolverem economicamente, as migrações forçadas a que assistimos nos últimos anos acabarão. Depois disso, restará apenas uma necessária e organizada política de imigração, que nunca houve a nível europeu. Mas agora o tempo é de emergência: é necessário acudir a esta gente, que nos procura e precisa de nós. E não será certamente com arame farpado que os poderemos ajudar ou que se resolverá o problema…