Se há algo que ficou provado nas eleições realizadas ao longo deste histórico ano de 2015 é que as noções de estabilidade e de continuidade deixaram de fazer sentido para a maioria dos eleitores da Grécia, de Portugal e de Espanha.
Percebeu-se isso, logo em janeiro, na Grécia, com a chegada do Syriza ao poder, após décadas e décadas de uma “estabilidade” sustentada não só em dois partidos, mas também em duas famílias (os conservadores Karamanlis e os socialistas Papandreu) – qualquer delas manchadas por inúmeros escândalos e acusações de corrupção.
No início de outubro, em Portugal, voltamos a ter a mesma sensação, quando os resultados eleitorais impediram a continuidade no Governo da coligação PSD-CDS (irrevogavelmente “estável”…) e abriram espaço a uma histórica e inédita aliança dos partidos de esquerda, que permitiu ao PS formar governo… sem uma garantia de “estabilidade” que vá mais além do que a ponderação, a cada 12 meses, entre os seus parceiros, do Orçamento do Estado que for apresentado.
Finalmente, neste domingo, 20, os espanhóis voltaram a confirmar esta tendência, numas eleições em que castigaram os dois principais partidos do poder – PP e PSOE obtiveram os seus piores resultados dos últimos 25 anos! – e abriram espaço a novas forças – Podemos e Ciudadanos – que serão essenciais para a formação de um novo governo… que dificilmente terá as características médias de “estabilidade, tendo em conta as alianças que podem estar em jogo.
Mas será que caiu o céu por causa disso? Será que entrou tudo em pânico no sul da Europa? Será que a perda dessa “estabilidade” fez regressar as ameaças de bancarrota ou, pior, um clima de quase guerra civil? Será que alguém pode dizer, com inteira autoridade, que a Grécia, Portugal e Espanha ficaram pior (ou melhor…) no dia a seguir às suas eleições?
A verdade é que a estabilidade deixou de ser um valor por si só. Embora custe a muitos admitir, o sistema bipartidário, que vigorou durante décadas na maior parte das democracias ocidentais, deixou de fazer sentido nas atuais sociedades, em que os cidadãos têm muito mais acesso à informação e possuem muito maior capacidade autónoma de comunicação.
No mundo de hoje já não faz sentido dividir as pessoas em dois grandes blocos – mesmo que, filosoficamente, eles possam continuar a existir. Somos hoje todos muito mais do que isso. A diversidade e pluralidade da sociedade vai muito para além das chamadas “esquerda” e “direita” – como se vê, por exemplo, quando deputados violam o sentido de voto do seu partido em questões de cidadania e direitos individuais.
O mundo mudou. E quero acreditar que a “estabilidade” mais importante está mais do que garantida: aquela que nos permite acreditar que, qualquer que seja o resultado das eleições, continuaremos a viver em democracia, porque já nenhum de nós tolera voltar a viver em ditadura. Foi com esse pressuposto que, em 2015, gregos, portugueses e espanhóis, contrariaram a noção de “estabilidade” quando foram chamados às urnas. E na base disso tudo, é preciso admiti-lo, está a ideia transformadora e sonhadora de uma Europa Unida. Assente em ideais de respeito, solidariedade, desenvolvimento e liberdade – e essa é que é a “estabilidade” que vale a pena proteger. O resto é conversa… que já nem serve para ganhar eleições com maiorias absolutas.