A pandemia deixou o nosso mundo virado do avesso e diariamente nos coloca desafios que poderão ser estruturais para o nosso futuro a curto e médio prazo. É o caso do trabalho ou melhor dizendo, do teletrabalho e das casas onde vivemos. Com pessoas e empresas a mostrarem que é possível o teletrabalho com produtividade, a uma escala global, que futuro haverá para os escritórios? E as casas vão ganhar novas vidas? Este foi o mote lançado por Pedro Lancastre, Diretor-Geral da consultora JLL no webinar que hoje se realizou para anunciar os resultados do mais recente estudo da JLL sobre o teletrabalho em Portugal.
A consultora inquiriu, durante o período de confinamento, cerca de 1.100 portugueses de empresas de todas as dimensões, das grandes às micro, para saber como foi a sua adaptação ao teletrabalho e de que forma a massificação do trabalho remoto influenciará a organização dos espaços de escritórios
E uma das principais conclusões que demonstra bem a adesão das pessoas é a de que 95% dos inquiridos acredita que o ideal seria trabalhar desde casa pelo menos um dia por semana.
Mas já lá vamos a outras conclusões do teletrabalho. A primeira remete desde logo para a importância que a casa passou a ganhar no contexto durante e pós-pandemia e que já está a ‘mudar o paradigma da forma como olhamos para a habitação’, realçou Patrícia Barão, diretora do departamento da JLL, também presente no webinar.
“Exemplo disso é a procura de habitação que temos sentido desde que começou o estado de confinamento – a procura disparou 80% por casas com espaços exteriores, sejam terraços, varandas, jardins. As famílias, ao estarem confinadas às suas casas, tiveram aquilo que a maior parte de nós não teve até esta situação ocorrer, que é tempo para viver as suas habitações. E viver as casas agora nesta situação de teletrabalho é muito diferente daquilo a que estávamos habituados a ter na nossa vida anterior onde mesmo ao fim-de-semana existiam estímulos no exterior que nos levavam para fora de casa”, realçou Patrícia Barão, acrescentando que esta nova ‘normalidade’ leva também a outras exigências por parte dos potenciais clientes como ter um espaço em casa para trabalhar sem interrupções.
Mas para já, com ou sem espaços próprios, e nesta situação bizarra que se vive com o surto, as pessoas e as empresas foram obrigadas a ajustar-se rapidamente e a evoluir tecnologicamente e em comportamentos “10 anos em apenas 10 semanas”, como sublinhou por seu turno Caetano de Bragança, responsável pelo departamento “Workplace Solutions”, da JLL.
O inquérito feito aos mais de 1.000 profissionais revelou que 86% das pessoas se adaptou ao teletrabalho desde o início da Covid-19 e 84% passou a valorizar o teletrabalho por questões profissionais.
“Já não há retorno. Se o teletrabalho nos tirou ou nos está a ajudar numa situação difícil, e com muita aceitação, então no futuro será uma ferramenta que todos quererão utilizar”, sublinhou este responsável, enfatizando que estes bons resultados ocorreram numa situação atípica, longe do que é o teletrabalho em circunstâncias normais, sem o enquadramento familiar.
Também a maioria (52%) salientou a vantagem em reduzir o tempo gasto em deslocações para o trabalho, reuniões, viagens e visitas. “O mundo está a tentar atingir em 2050 a neutralidade carbónica e o teletrabalho precisamente por exigir menos deslocações tem este lado da sustentabilidade que é muito valorizado”, realçou Caetano de Bragança.
A sustentabilidade e a preservação do planeta e a flexibilidade no trabalho encaixam-se assim, como uma luva, nas aspirações da geração Millennial (onde o peso dos chamados ‘nómadas digitais’ já era significativo) , tornando incontornável esta tendência. E se as estas constatações juntarmos os resultados até agora da gestão desta crise sanitária em Portugal, o país poderá potenciar ainda mais a sua capacidade de atração junto destes profissionais globalizados, defendem estes especialistas.
“Os millennials gostam de ser flexíveis, quer em termos de horário, quer em termos de mobilidade, hoje estão em Portugal, amanhã estão num outro país. E os resultados do inquérito mostram isso – 83% considera relevante a inclusão da possibilidade de teletrabalho associado a uma agenda flexível numa proposta de trabalho”, especificou Maria Empis, diretora do departamento de Research, acrescentando que “Portugal tem claramente uma oportunidade para se posicionar bem na questão do teletrabalho”.
“O país tem as boas condições que já se conhecem e com a implementação do teletrabalho pelo mundo podemos ganhar aqui uma enorme vantagem de atrair pessoas que querem viver cá, podendo trabalhar para fora”, enfatizou Maria Empis.
O inquérito mostrou, por exemplo, que 69% considera que o teletrabalho não impede a progressão das carreiras, 71% realçou que contribui para uma melhoria do desempenho profissional e 57% que favorece a redução do stress.
Mas será o fim dos escritórios? Não, de todo, referem os especialistas. O teletrabalho reveste-se de algumas “desvantagens como o isolamento social e o isolamento profissional” por isso vai haver, sim, uma adaptação às novas tendências. E é, no equilíbrio que está a virtude, defenderam os responsáveis da JLL.
“A palavra ‘experiência’ ganhou um novo sentido nestes tempos mais recentes, Porque as pessoas provaram a si próprias que conseguem fazer quase tudo a partir de casa. Mas é fora de casa que acontecem as grandes experiências. Boas ou más. Podemos trabalhar bem em casa mas também é fundamental a partilha de ideias e a comunicação presencial com colegas e chefias. As nossas crianças podem estudar bem em casa mas faz-lhe falta o convívio com os colegas. São estas experiências que enriquecem mais a vida e não vão deixar de existir”, rematou ainda Pedro Lancastre, diretor-geral da JLL.