Era o fator mais incerto da sequência conhecida como nucleossíntese do Big Bang e agora pode ter sido identificado e reproduzido de forma fiel por investigadores num laboratório situado debaixo de uma montanha, situada na zona centro de Itália. A equipa conseguiu recriar e medir o ritmo de fusão de deutério, um isotopo do hidrogénio que consiste num protão e num neutrão, uma reação que terá acontecido entre dois a três minutos após o Big Bang. “Muita gente vai estar interessada nesta descoberta, desde pessoas ligadas à física de partículas, à física nuclear, à cosmologia e à astronomia”, vaticina Ryan Cooke, astrofísico da Universidade de Durham que não participou no estudo, citado pela Quanta Magazine.
A criação e fusão de deutério foi o primeiro passo de uma série de reações nucleares que aconteceu nos primeiros minutos do Universo. A maior parte do deutério acabou por se fundir em elementos mais pesados e mais estáveis, como o hélio e o lítio, mas ainda é possível encontrá-lo na sua forma original atualmente.
Brian Fields, astrofísico da Universidade do Illinois, explica que “temos uns gramas de deutério no nosso corpo, que vem dos tempos do Big Bang”. A densidade de protões e neutrões, a rapidez com que se separaram e o volume de deutério que permanece, elementos medidos na experiência em Itália, revelam detalhes importantes sobre a reação que aconteceu no passado, fazendo com que o elemento seja uma ‘testemunha’ importante dessa época. A dedução destes pedaços de informação só foi possível agora devido à experiência feita no LUNA (de Laboratório Subterrâneo de Astrofísica Nuclear), que aferiu a taxa a que o deutério se funde com um protão para formar o isótopo hélio -3.
A incerteza sobre este fenómeno arrasta-se desde a década de 1940, quando os cientistas começaram a realizar as primeiras descobertas neste campo. Há cerca de uma década que a dúvida sobre a probabilidade de o deutério absorver um protão e formar o isótopo hélio -3 fez com que os físicos não se sentissem confiantes para avançar como o universo seria após 380.000 anos, quando arrefeceu o suficiente para os eletrões começarem a orbitar os núcleos atómicos.
Em 2014, Cooke e outros investigadores conseguiram medir com precisão a abundância de deutério no universo recorrendo a observações de nuvens gasosas distantes. O avanço conseguido agora no LUNA, com a velocidade da reação inicial, permite traduzir essa abundância na que se registava nesses primórdios. A cada segundo, os cientistas do LUNA experimentar disparar 100 biliões de protões contra um alvo de deutério, com a esperança de que a qualquer momento acontecesse a fusão. A escolha por uma localização subterrânea deve-se ao facto de à superfície os raios cósmicos poderem replicar o sinal produzido por reações de deutério. O trabalho prolongou-se por três anos, com a recolha contínua de dados, sob o olhar atento (e a pressão) da comunidade científica que ansiava pelos resultados.