A opção de encerrar as conversas com a primeira das letras que compõem a sigla ESG – Ambiente, Social e Governo de Sociedade, na tradução livre da sigla em inglês – não foi inocente. A verdade é que este é o pilar de mais fácil compreensão por parte quer dos empresários e quer do público, em geral – afinal, quem não entende o que acontecerá quando o planeta decidir ver-se livre de nós, por já não aguentar o nosso impacto? Mas é também no pilar relacionado com o Ambiente que as empresas têm tido mais métricas e diretivas concretas a cumprir, seja em relação às alternativas ao consumo de energias fósseis seja em relação à poupança de água nos processos de produção.
Mas, salienta o CEO da Flexdeal, esta não deixa de ser uma área em que a execução não é óbvia para muitas das PME, sobretudo porque ainda não está incorporada na forma de pensar dos gestores. “Se não conseguir perceber, racionalmente, porque isto existe, um empresário terá mais dificuldades em adotar estas normas, exigências e métricas que todos temos de cumprir. As empresas, naquilo que é a sua normal atividade, têm um impacto ambiental, maior ou menor. Todas as atividades têm um impacto no ambiente, atual e futuro. E se não tivermos a consciência de que, dentro da nossa atividade, é possível fazer mais e melhor, então não percebemos o que andamos cá a fazer”, começa por realçar o executivo. “O capitalismo por si só e a noção de que o lucro por si é a essência não fazem sentido, porque amanhã vamos ser penalizados por a nossa empresa não estar a contribuir para a solução e até estar a agudizar o problema. Qual problema? O impacto climático com todas as manifestações que este tem.”
Para Alberto Amaral, é preciso que os empresários tenham bem claro que, “no seu modelo tradicional de negócio, têm de assegurar duas coisas: todo o processo construído dentro da sua atividade tem de cumprir um conjunto de regras de acordo com todas as métricas instituídas para o ambiente – e aqui estamos a falar sobre se tem as melhores práticas em termos de reciclagem, se tem ou não a capacidade de substituir as energias fósseis por energias renováveis, se existe ou não política de tratamento de resíduos, enfim… – e o meu produto ou serviço, depois de processado, de realizado, também vai ter o menor impacto possível no ambiente. Já não é só a minha atividade, é também a prestação do meu serviço ou a entrega do meu produto, porque, quando estamos a falar num mercado normal e dinâmico, a minha empresa não é um ser único e individual. Nós estamos num ecossistema global e, portanto, sempre que eu tomo uma determinada ação dentro da minha empresa, ela vai ter um impacto. É isso que nós temos de ter a capacidade de fazer”, avisa.
Se não tivermos a consciência de que, dentro da nossa atividade, é possível fazer mais e melhor, então não percebemos o que andamos cá a fazer
alberto amaral
Na mesma ocasião, o responsável fez questão de recordar a importância de se pensar na sustentabilidade na totalidade do seu “tripé”, com todas as áreas relacionadas e a trabalharem para um objetivo comum. “Temos de ter os três objetivos claros – o propósito de um ambiente responsável, um social justo e um económico viável. Por isso é que é um tripé, porque eu não consigo retirar nenhum deles deste processo, sob pena de ele não funcionar.”
É por esta razão que pensar em empresas sem lucro é absurdo, tal como não faz sentido pensar nelas sem políticas justas para os trabalhadores. Claro que “tem de haver um propósito além do lucro, porque, se eu olhar para o lucro numa lógica de criação, retenção e distribuição desse mesmo lucro, em bom rigor eu estou a cumprir com os três pilares da ESG”, apressa-se a esclarecer.
“Se eu conseguir criar lucro, cumpro o propósito da existência da minha empresa. Portanto, garante-me toda a sustentabilidade para pensar em tudo o que quero executar no momento seguinte, quer sejam as melhores práticas de acordo com as necessidades e benefícios, que quero dar aos meus colaboradores, quer seja com aquilo que é o ambiente e tudo o que eu posso investir dentro e fora da empresa para garantir que a minha pegada, em termos de impacto ambiental, é cada vez menor. Acho que, no final do dia, se conseguir segurar algum [dinheiro] para distribuir pelos meus colaboradores, para distribuir pelas associações sem fins lucrativos, que precisam de nós e que também fazem parte da nossa responsabilidade social – o impacto direto na comunidade também é medido em termos de ESG –, eu diria que temos aqui o mundo perfeito.”
Para o CEO da Flexdeal, era importante ver o Estado mais comprometido com a prossecução destes objetivos, e deixa mesmo um desafio concreto que dispensa investimentos e pode ter um impacto profundo no tecido empresarial. A criação, através do IAPMEI, de uma distinção, de um selo PME Sustentável, que, à semelhança do que já acontece com a PME Líder ou a PME de Excelência, destaca as organizações com melhores resultados nesta área.
“Isto poderia ser uma forma de criar aqui uma distinção que permitisse a um empresário sentir orgulho pela diferenciação que está a apresentar. É uma boa prática e não custa dinheiro. É o próprio Estado também a dar um sinal de que isto é um fator importante para o que todos nós queremos que aconteça na nossa economia.” No mesmo sentido, as associações empresariais são chamadas a valer-se do papel fundamental que têm para as PME, uma vez que são as organizações a que os gestores mais recorrem em caso de dúvidas ou quando precisam de tomar decisões, já que são também as detentoras de maior volume e de mais qualidade de informação válida.
O CEO da Flexdeal é taxativo a pedir um trabalho conjunto entre os vários atores da economia, numa altura “em que o tempo já é curto” para cumprir não só os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, que têm como prazo 2030, mas sobretudo vários critérios relativos a acessos a financiamento, por exemplo, que começam a ser aplicados em 2024 e que vão ter em conta o que foi a atividade das empresas em 2023.
Por essa mesma razão, o responsável considera fundamental que, ainda neste ano, “todas as entidades competentes assumam como propósito comum posicionar as PME ao nível das grandes empresas e das cotadas, relativamente ao tema da sustentabilidade”, até para provar, num País onde 99% do tecido empresarial é composto por PME, que elas não ficam atrás das grandes empresas e das cotadas, quando se fala de competência e de capacidade de execução, à sua escala e proporcionalidade.
A conversa que encerra o ciclo Traduzir Sustentabilidade em Negócio. Descodificar ESG para PME pode ser vista e ouvida, na íntegra, abaixo.