O domínio da teoria dos paradoxos na gestão preocupa-se com a análise de situações que desafiam as expectativas convencionais. No outro dia, li uma notícia sobre a Coreia do Sul e, no seu contexto, pensei que Portugal oferece dois exemplos bastante interessantes de paradoxos.
Apesar da narrativa predominante de que o País está a enfrentar um declínio demográfico e tem dificuldade em reter o seu talento, os salários têm permanecido consistentemente baixos. O que torna estes factos num paradoxo curioso é que se pensaria que uma diminuição do número de indivíduos resultaria num aumento das remunerações. Mas não, este fenómeno não se verifica.
Outro aspeto intrigante é que, embora Portugal seja um destino atrativo para turistas, nómadas digitais e diversos perfis de talento estrangeiro, os seus próprios jovens cidadãos continuam a sair do País em grande número. Isto levanta a questão de saber por que razão uma nação que atrai tantos estrangeiros não consegue reter os seus próprios habitantes.
Estas contradições suplicam por uma análise mais aprofundada. Será que as nossas políticas de imigração de mão de obra barata (ou falta dela) fazem com que as condições económicas e as mudanças se interliguem de maneira surpreendente e contraintuitiva?
Uma das consequências de depender fortemente de mão de obra pouco qualificada, sem um planeamento estratégico, é a diminuição do incentivo para investir em inovação. Quando as empresas têm acesso a um fluxo constante de trabalhadores a baixo custo (em linguagem de economia, uma elasticidade de oferta quase infinita) sentem menos pressão para atualizar processos, para adquirir novos equipamentos ou para explorar tecnologias de ponta. Isto pode tornar-se paradoxal em países como o nosso, que, ao mesmo tempo que valorizam o avanço tecnológico, acabam por desencorajá-lo ao permitir que trabalhadores baratos preencham lacunas no mercado de trabalho. Com o passar do tempo, instala-se um ciclo no qual as empresas continuam a usar métodos antigos, deixando de parte melhorias que poderiam gerar produtos de maior qualidade e fomentar um crescimento sustentável.
Uma das consequências de depender fortemente de mão de obra pouco qualificada, sem um planeamento estratégico, é a diminuição do incentivo para investir em inovação
Outra desvantagem prende-se com a estagnação salarial. Como há uma reserva de mão de obra disponível a custos reduzidos, os aumentos salariais podem abrandar em vários setores. Salários baixos não só mantêm margens de lucro estáveis para as empresas como também dificultam as perspetivas para os trabalhadores locais. Em particular, os jovens profissionais portugueses podem sentir-se compelidos a emigrar (na prática, é precisamente isso que vemos estar a acontecer) em busca de melhores salários, resultando na perda de parte da força de trabalho qualificada do País. Este cenário agrava a carência de trabalhadores especializados e reduz ainda mais os incentivos à inovação.
Em contrapartida, veja-se o caso da Coreia do Sul, que controla rigorosamente a imigração e, por isso, conta com um número muito menor de trabalhadores estrangeiros. Como resultado, cerca de 10% da sua força de trabalho é constituída por robôs ‒ um sinal de como as empresas investiram em automação e outras tecnologias avançadas perante a escassez de mão de obra. Estas inovações podem ajudar a sustentar a indústria, a reduzir certos custos laborais e a promover investigação de ponta.
Para navegar por estes desafios é essencial que os decisores políticos adotem uma abordagem equilibrada, proativa e baseada em dados. As políticas devem procurar maximizar os benefícios da imigração altamente qualificada, minimizando potenciais impactos negativos.
Embora não haja uma estratégia perfeita, uma política equilibrada ‒ que responda às necessidades reais de trabalho, mas também garanta um incentivo à procura de soluções inovadoras ‒ pode ajudar países como Portugal a evitar um ciclo de falta de investimento e de crescimento lento dos salários.