O impacto da pandemia de Covid-19 no setor turístico português já é significativo. E os tempos que se seguem parecem continuar carregados a negro, depois de um março para esquecer para a atividade. No mês que passou, marcado pelos estados de alerta e emergência, ligações aéreas inexistentes e recolhimento das pessoas em casa, cerca de um terço dos estabelecimentos (30%) dos setores da hotelaria e da restauração não foi capaz de pagar os ordenados aos seus trabalhadores. E a esmagadora maioria das empresas, cerca de 80%, antecipa que não venha a entrar qualquer dinheiro em caixa em abril e maio.
O retrato é feito pela Ahresp, nos resultados de um inquérito a 1.819 associados, e mostra um setor em standby quase total. Três quartos (74%) dos estabelecimentos estão encerrados à data (o inquérito foi feito entre 1 e 3 de abril) e quase dois terços dizem que não conseguem pagar salários se não tiverem apoio externo. E não restam muitas soluções pela frente para aguentar um negócio com procura fechada em casa ou sem possibilidade (ou intenção) de viajar, nomeadamente numa altura que costumava ser forte para o setor, a Páscoa, e de arranque para a época alta.
Perante a atual situação, ou reduzem provisoriamente a força de trabalho e/ou recorrem a balões de oxigénio que permitam ir garantindo o pagamento de despesas. Metade dos alojamentos e restaurantes admite que o desfecho passará por avançar para o lay-off, suspendendo temporariamente os contratos de trabalho. Para já, a grande maioria – de 77% – não recorreu a apoios financeiros, e continua a pedir medidas mais ajustadas à sua realidade, como apoios a fundo perdido, isenção de impostos e de encargos financeiros, conclui o relatório da Associação de Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal.
Apesar da situação difícil, que leva um terço das empresas inquiridas a revelar intenção de se apresentar à insolvência perante os incumprimentos, a esmagadora maioria (94%) ainda não despediu colaboradores. A manutenção de postos de trabalho é, aliás, uma das condições para as empresas poderem utilizar os apoios do lay-off simplificado.
“Efeitos inéditos” nos resorts
No segmento do turismo residencial o panorama não apresenta menos nuvens. Segundo um comunicado enviado esta sexta-feira às redações, os resorts preveem perdas superiores a 70% durante este ano. As novas vendas congelaram e as que estavam a andar não se concretizam por impossibilidade de realização das escrituras, refere a Associação Portuguesa de Resorts. Nesta crise de “efeitos inéditos”, o lay-off é já mecanismo incontornável para todas as empresas, que em alguns casos enviaram temporariamente para casa 95% dos trabalhadores.
Também esta área específica, das que mais cresceram nos últimos anos à boleia do aumento do turismo e de mecanismos como as autorizações de residência para investimento (ARI ou vistos gold) ou o regime dos residentes não habituais, reclama mais medidas do Governo para garantir o negócio que emprega mais de 4.500 trabalhadores. Entre elas estão o fim do adicional ao IMI e a isenção e adiamento de impostos como IMT ou IMI e a descida do IVA da construção para 6% durante o período de retoma.
Em março, o Governo lançou três linhas de crédito específicas para os setores da restauração, a hotelaria e das agências de viagem e animação turística, num bolo total de €1.700 milhões destinado a satisfazer as necessidades imediatas de tesouraria das empresas. As microempresas têm ainda acesso a uma linha de €60 milhões junto do Turismo de Portugal, à qual se candidataram mais de 2.000 empresas numa semana, num valor próximo de €20 milhões. Apenas foram concedidos incentivos de €3,7 milhões.