Vanessa Selbst não se formou apenas em Ciência Política na prestigiada Universidade de Yale. Ela também completou o curso de Direito nesta instituição de ensino, por onde passaram presidentes dos Estados Unidos da América, como Bill Clinton ou os dois George Bush, pai e filho, quase 60 prémios Nobel (o economista Paul Krugman, por exemplo), ilustres do cinema, como Meryl Streep, Paul Newman, Jodie Foster e Oliver Stone, e homens fundadores de grandes negócios – o caso de William Boeing (Boeing), de Frederick W. Smith (FedEx) ou de Harold Stanley (Morgan Stanley).
Nem os estudos políticos nem o conhecimento das leis, porém, terão pesado decisivamente no currículo de Vanessa, ao ser convidada para reforçar a equipa de uma das mais importantes sociedades gestoras de investimento do mundo. Foram decerto outros atributos a fazer a diferença. Capacidade de análise, velocidade de raciocínio, paciência e autocontrolo refletem a perspicácia felina que chamou a atenção da americana Bridgewater Associates, com um portefólio de 350 clientes institucionais e cerca de 150 mil milhões de dólares (122 mil milhões de euros) a seu cargo para gerir nos mercados financeiros. A nova-iorquina de 33 anos, natural de Brooklyn, não se destacou a trabalhar para a concorrência, até porque nem sequer tinha experiência na área, mas nenhuma mulher até hoje ganhou mais dinheiro a jogar póquer profissional. Foi a jogar às cartas – e a ter lucro – que aterrou no complexo mundo dos fundos de investimento.
“O ambiente é muito parecido ao do póquer – um grupo de miúdos cromos a colaborar para vencerem os nossos adversários num jogo”, resumiu Vanessa, na sua página de Facebook, quando, no último dia de 2017, anunciou a sua retirada do póquer profissional e a sua entrada em Wall Street. “Também é extremamente difícil. Há tanto para aprender neste mundo totalmente novo para mim que, cada dia em que penso que já estou a apanhar-lhe o jeito, falho o desafio no dia seguinte.” Cabe-lhe definir estratégias e pesquisar opções de investimento, mas agora não são ases nem valentes que governam – são instrumentos financeiros de risco elevado, ações, obrigações, derivativos, etc. “É exaustivo, excitante e faz-nos ser humildes todos os dias.”
Vanessa Selbst habituou-se a lidar com boas quantias de dinheiro nos últimos anos, mas era o seu e de mais ninguém. Ao longo da última década, amealhou quase 12 milhões de dólares (€9,8M) nas mesas de jogo e fez do póquer o seu modo de vida. Para se ter uma ideia do impacto de Selbst, a segunda mulher com mais lucros na história da modalidade arrecadou não mais do que metade daquele valor. É também a única jogadora com três braceletes, símbolo de vitórias em provas da World Series of Poker, uma espécie de circuito mundial.
Adeus, vida de nómada
Esta popularidade terá aguçado o interesse da Bridgewater Associates, fundada em 1975 pelo bilionário Ray Dalio – hoje o 54.º homem mais rico do mundo, segundo a lista da Forbes, com uma fortuna pessoal de 16,8 mil milhões de dólares (13,7 mil milhões de euros). A firma não publicitou a contratação de Vanessa Selbst, que tão-pouco revelou esta informação.
No seu post no Facebook, apenas anunciou o adeus ao póquer e a mudança para uma carreira na Bolsa, que dizia já ter iniciado há quatro meses (agora cinco).
A notícia sobre a sua inclusão na gigante do investimento, avançada pela Bloomberg, surgiu em janeiro e despertou ainda mais a curiosidade sobre os pontos de contacto entre o póquer e o mercado de capitais. Tal como no jogo de cartas é essencial saber esperar pelo momento certo para se jogar uma mão, um dos segredos nos investimentos é a paciência necessária para se aguardar pelo momento ideal para se apostar. E se já não é possível avaliar as reações do adversário para lhe descobrir a força das cartas, torna-se vital saber analisar o comportamento dos mercados para conhecer as tendências e ponderar os riscos.
Isto é o que diz a teoria; na prática, Vanessa ainda está a dar os primeiros passos na nova atividade e tem dúvidas. “Não sei se esta coisa do hedge fund vai resultar. É bastante difícil encontrar uma nova carreira quando a primeira foi tão divertida”, escreveu nas redes sociais para os seus 14 mil seguidores no Facebook e 96 mil no Twitter.
Embora sem valorizar em demasia uma justificação para a retirada do póquer profissional – “Não há uma razão específica”–, a nova-iorquina refere como argumento principal a vida de nómada que levava, com viagens regulares ao estrangeiro e no interior dos EUA (onde Las Vegas era ponto de paragem frequente). Homossexual assumida, Vanessa casou-se em 2013 com a sua namorada de vários anos, Miranda Foster, e diz ser agora tempo de assentar para dedicar mais tempo à família – isto se o frenesim dos mercados financeiros o deixar.