A nova legislação americana sobre os alimentos resultantes de engenharia genética veio dizer, basicamente, que este é um não assunto. Nem os que sofreram alteração genética no laboratório, conhecidos como OGM (de organismo geneticamente modificado), nem os outros, livres de OGM, precisam de ter qualquer referência à questão.
Na verdade, já não era obrigatório rotular estes produtos. Mas com a aprovação do salmão de aquacultura, alterado para crescer duas vezes mais rapidamente, grupos anti-OGM e donos de restaurantes, por exemplo, esperavam que tivesse havido mudanças.
A novidade do diploma é o facto de a agência americana do medicamento e dos alimentos, FDA, desaconselhar a designação “livre de OGM”, vasta e imprecisa quando aplicada a produtos alimentares, alega-se.
“Muitos dos produtos que comemos são geneticamente modificados relativamente ao início da sua produção”, clarifica o biólogo e presidente do Centro de Informação de Biotecnologia Pedro Fevereiro. “Os trigos duros, usados para fazer massas alimentares, passam por um processo chamado mutagénese aleatória em que são provocadas alterações genéticas com radiação ionizante e estes alimentos acabam por não ser classificados como OGM,” exemplifica.
A FDA sugere em alternativa, para as empresas que insistam em garantir que os seus produtos não passaram por um processo de alteração genética controlada, a designação “não sujeito a bioengenharia” ou “este óleo é feito com soja que não foi sujeita a engenharia genética.”
A questão está longe de ser pacífica na sociedade americana, envolvendo variados interesses, com a questão económica à cabeça. Muitas empresas do ramo alimentar têm optado por obter uma certificação, atribuída por uma organização sem fins lucrativos, a Non-GMO Project, com a garantia estampada por escrito ou numa borboleta. Serão já mais de 34 mil produtos a receber a certificação, relata o jornal New York Times.
A Europa é uma ilha
Em Portugal, como em toda a Europa, a legislação obriga a que os rótulos contenham referência explícita à presença de organismos geneticamente modificados. O mais comum é encontrá-la em milho doce ou óleos à base de soja. Esta posição, mais conservadora, deixa a Europa numa espécie de ilha, rodeada de países onde quer a produção quer a comercialização estão bastante mais democratizadas. Vários estados têm criado regiões livres de OGMs – em Portugal são o Algarve, os Açores e a Madeira. Em França, por exemplo, à volta de 120 cidades declararam-se livres de organismos geneticamente modificados. Para os agricultores europeus será cada vez mais difícil competir com americanos ou asiáticos, onde o mercado é mais livre. “A Europa vai ter problemas complicados por causa disso”, defende Pedro Fevereiro.