“Caibo mal apenas na little box [a caixinha] em que me metem.” Esta frase, na nota introdutória do novo livro de José Pacheco Pereira, 72 anos, Personalia (da Tinta-da-China) que é lançado nesta quinta-feira, 12, resume a ideia de uma obra que contempla alguns textos inéditos e que recupera, sobretudo, textos publicados, ao longo do tempo, no blogue Abrupto e em jornais, revistas e publicações diversas. “A qualidade de político”, escreve Pacheco Pereira, “é, por nenhuma boa razão, avassaladora e, como tende cada vez mais a ser um insulto, com o estado atual da radicalização nas chamadas ‘redes sociais’, serve os seus fins e tem publicidade assegurada”. Por isso, o que encontramos em Personalia é o outro lado do intelectual, a reflexão transversal ao tempo – e aos tempos históricos –, a recuperação de episódios sobre figuras universais (embora, algumas desconhecidas), em que o real se confunde com a recomposição formatada pela imaginação do autor. A política está sempre lá, claro, mas Pacheco, nestes escritos de breve leitura – 168 páginas –, cose-se, fundamentalmente, às paredes da pólis. Num dos armazéns da antiga zona industrial do Barreiro, na Rua 48, onde mantém um dos polos do imenso Ephemera, o maior arquivo privado nacional, recebe-nos de mangas arregaçadas, a acarretar livros, documentos e pastas, uma das quais reúne boa parte do quinto tomo da monumental biografia de Álvaro Cunhal, que ele há de terminar um dia destes.
No seu livro, declara-se “especialista do efémero”. O que é um “especialista do efémero”?
Quem trabalha com a História percebe que muito pouca coisa fica para a História. E se isso é verdade para a História em geral, é verdade para a História de Portugal, é verdade para a História da Literatura, etc. Ou seja: percebe-se que o tempo é um implacável selecionador. E, portanto, a maioria das coisas a que atribuímos valor, na realidade, não só não tem o valor que lhe atribuímos como não deixa especial registo. Isto [o arquivo Ephemera] está cheio de coisas que entram nesse catálogo. Aliás, no prefácio do meu livro, falo de um autor, o Pigault-Lebrun [transição entre os séculos XVIII e XIX] que foi um grande bestseller e que, hoje, não só ninguém o lê como está completamente esquecido. E eu trabalho com personagens: as principais mas também com personagens secundárias e, até, terciárias. E o que é muito relevante para a História está cheio de personagens secundárias e terciárias. Essas personagens, embora não marcando nada de decisivo, traduzem o espírito do tempo.