A Trades Union Congress (TUC), a federação de sindicatos do Reino Unido, emitiu um relatório, na semana passada, onde avança que, na Grã-Bretanha, a maioria das mortes por Covid-19 com transmissão do vírus em local de trabalho não são reportadas como tal ao Health and Safety Executive (HSE), entidade do governo responsável por regular a saúde e segurança no meio laboral.
A federação sustenta que existe uma discrepância entre as 15.263 mortes por Covid-19 na população em idade ativa, apresentadas pelo Gabinete de Estatísticas Nacionais (ONS, na sigla inglesa), e as 387 mortes reportadas ao HSE como sendo devidas a transmissões em contexto de trabalho. Estes dados retratam o período entre abril de 2020 e abril de 2021.
“Simplesmente não é credível que apenas 2,5% das mortes por Covid-19 na população em idade ativa sejam devido à exposição ocupacional [no local de trabalho]. Acreditamos que os empregadores estão massivamente a não reportar o número de pessoas que morreram depois de apanhar Covid-19 no trabalho. Este era o principal local onde as pessoas se juntavam naquela altura e, portanto, é provável que muitas dessas mortes fossem relacionadas com o trabalho”, disse ao The Guardian Shelly Asquith, membro do gabinete de saúde e segurança da TUC.
A federação dos sindicatos mostra ainda que esta disparidade se torna mais significativa se olharmos para setores onde ocorreram grandes surtos de transmissão. No setor dos transportes, no qual entre março e dezembro de 2020 morreram mais de 600 pessoas devido à Covid-19, só houve registo de 10 mortes em que a transmissão ocorreu devido à exposição no trabalho, sendo estes dados de um período mais extenso, entre abril de 2020 e abril de 2021. Outro exemplo significativo desta disparidade é visto na produção alimentar – das 63 mortes causadas pela infeção, apenas foram reportadas três ao HSE. Também os trabalhadores de escolas e universidades, com 140 mortes, tiveram apenas nove reportadas.
É obrigatório que os empregadores comuniquem à HSE, num prazo de 10 dias, os casos de Covid-19 em que a transmissão se deu no trabalho. Como explica o relatório, o problema prende-se com o Regulamento das Lesões, Doenças e Ocorrências Perigosas 2013 (RIDDOR na sigla inglesa), que determina que os empregadores têm o poder de decisão, ou seja, no caso específico da Covid-19, são estes que determinam se a transmissão do vírus ocorreu dentro (ou fora) do contexto laboral.
“Isto faz com que seja mais difícil para os reguladores controlarem onde estão a acontecer os surtos e permite que maus patrões escapem impunes aos abusos flagrantes dos direitos dos trabalhadores. É impressionante que nenhum empregador tenha sido processado por colocar os trabalhadores em risco de contrair Covid-19. O governo deve corrigir as deficiências na forma como as mortes, doenças e ferimentos são relatadas”, afirmou Frances O’Grady, Secretário Geral da TUC, num comunicado de imprensa.
A questão torna-se especialmente pertinente numa altura em que o Reino Unido tenta voltar à “normalidade”, tendo como meta definida o levantamento de todas as restrições impostas pela pandemia até 21 de junho. Os receios aumentam com o aparecimento de novos casos da estirpe indiana, considerada pela OMS uma “preocupação” e que já se tornou a mutação dominante em algumas áreas do país.