Ainda sou do tempo em que as grandes frustrações do futebol nacional aconteciam nas fases de qualificação para Europeus e Mundiais. Não era nascido ainda em 1966, mas lembro-me bem das inúmeras ocasiões em que Seleção Nacional ficou de fora, apenas interrompidas pelas extraordinárias proezas das qualificações para o Euro84, em França, e do Mundial86, no México. Dois feitos com resultados diametralmente opostos, como sabemos. Só a partir de 1996 é que Portugal começou a afirmar-se como participante habitual em fases finais. É verdade que nem sempre as coisas correram bem. Houve ocasiões em que a seleção não passou da fase de grupos, mas também houve participações extraordinárias, como o inesquecível título de Campeã da Euro, em 2006, como vários quedas em meias-finais e meritórias chegadas aos oitavos e quartos-de-final. O que isto quer dizer é que, em pouco mais de duas décadas, o futebol português passou a ter uma Seleção Nacional competitiva, capaz de chegar longe. Um motivo de orgulho para quem gosta de futebol, mas também um processo que fez aumentar a exigência em torno da equipa. Só isso justifica que, por esta altura, tanta gente em Portugal acreditasse que era possível a Seleção Nacional conquistar o título de Campeão do Mundo. Para muita gente, se esta não era a melhor equipa da atualidade, estava lá perto e seria capaz de se bater com qualquer uma das habituais candidatas. A realidade, porém, é outra.
Passada que já deve estar a raiva e a frustração de ver Portugal ser afastado do sonho por uma seleção teoricamente mais fraca, é hora de perceber a aceitar que a derrota foi justa e nada teve que ver com a arbitragem. Ao contrário de Marrocos, que tinha um plano e o soube executar, Portugal mostrou não ter descoberto a forma de desmontar a estratégia do adversário. Cada um dos jogadores portugueses deu o que tinham e procurou fazer melhor, mas nada resultou. Como já antes não tinham conseguido espanhóis e belgas. E não adianta fazer queixas contra este tipo de jogo defensivo da equipa marroquina, porque já foi assim que muitas equipas chegaram à glória. Basta recordar o título europeu da Grécia, em 2004, e até, em certa medida, a nossa própria conquista do Euro2016. Se formos capazes de aceitar que, naquele jogo, venceu quem mais fez para o conseguir estaremos mais perto de entender a verdadeira essência do futebol. A mesma que já tinha estado na base do afastamento de seleções fortíssimas como a Alemanha ou a Bélgica e que, nestes oitavos-de-final, ditou a eliminação, além de Portugal e da Holanda, dos megacandidatos Brasil e Inglaterra.
Não acredito em vitórias morais, nem acho que nos devamos contentar com pouco. A ambição de ir mais longe, de ultrapassar as próprias debilidades fazem-nos mais fortes e deixam-nos mais perto das vitórias e das grandes conquistas. Mas também penso que, perante um desaire, a resposta não pode ser deitar a baixo tudo que foi construído e desatar a criticar e condenar todos os que, nesta ocasião, não foram capazes de fazer melhor.
Esta não é, pois, a altura de começar já a exigir a cabeça do selecionador ou o afastamento deste ou daquele jogador. Este é o momento de parar e de refletir no que se pretende para o futuro da Seleção Nacional, que inicia já em março próximo a corrida ao apuramento para o Campeonato da Europa de 2024. Portugal continua a ter capacidade de formar bons jogadores e dispõe de um cada vez maior leque de escolhas. O que é preciso perceber é se Fernando Santos, que tem contrato válido até 2024, tem capacidade de construir, com esses jogadores, uma Seleção mais competitiva e vencedora ou se haverá outro técnico mais capacitado para o fazer. E se esse treinador estará disponível, claro. Não havendo uma alternativa melhor, não sei se a opção mais correta será a de rescindir contrato com Fernando Santos.
Finalmente, há que analisar com tempo e tranquilidade a situação de Cristiano Ronaldo, o maior jogador português de sempre, cujo papel no seio da Seleção Nacional, mudou durante o Mundial do Qatar. Nos próximos tempos se perceberá se o jogador está capaz de aceitar um papel de menor protagonismo mas, ainda assim, comprometido com a equipa. Há que perceber se o aceitará fazer com este selecionador ou tentará forçar a escolha de outro. E o que fará a FPF perante tudo isto.
Numa altura em que Portugal deve começar já a pensar no Euro2024, é importante que todas estas entidades se entendam, rejeitem a tentação de partir a loiça toda e sejam capazes de escolher um caminho que aproveite a extraordinária geração de futebolistas que aí está e continue a construir uma grande Seleção Nacional. Se for necessário trocar alguns protagonistas, que se troquem, mas isso seja feito em consciência, na convicção de que quem vem de novo poderá fazer melhor.
Viva a Seleção Nacional!