Se há coisa de que a história do futebol está repleta é de excecionais jogadores e treinadores que nunca ganharam nada. O facto de não se ter conquistado um título relevante não define, por si só, a qualidade profissional nem o talento de um futebolista ou de um técnico. Seria, aliás, inconcebível que, em competições que se caracterizam por só poder haver um vencedor, todos os outros fossem automaticamente desprovidos de qualidades. Serve isto para falar de Carlos Queiroz, selecionador do Irão, que ontem ficou pelo caminho no Mundial do Qatar, depois de perder com os Estados Unidos da América.
Eu fiz parte daquelas centenas de milhar de pessoas que tiveram o privilégio de assistir, ao vivo, no antigo Estádio da Luz a rebentar pelas costuras, à conquista, pela Seleção Nacional de sub-20, em 1991, do segundo título de Campeã do Mundo. Isto apenas dois anos depois de, em esplanadas e cafés das imediações da Escola Secundária D. Pedro V, ali perto de Sete Rios, ter celebrado o primeiro título mundial do futebol português, disputado em Riade, na Arábia Saudita. E não me esqueço, como mais ninguém pode esquecer, que estes dois feitos únicos do futebol nacional têm, na sua génese, a obra de um senhor chamado Carlos Queiroz.
O que se seguiu numa carreira que já leva 40 anos, com passagens por clubes da grandeza de Sporting, Metro Stars, Nagoya Grampus, Manchester United e Real Madrid e de seleções como as de Portugal, Emirados Árabes Unidos, África do Sul, Colômbia e Irão foi, no que diz respeito a títulos, e à exceção de uma Taça de Portugal e uma Supertaça ao serviço dos leões, de uma Supertaça de Espanha, e dos vários que conquistou, como adjunto de Sir Alex Ferguson, com as cores dos Red Devils, uma mão cheia de nada. Trata-se de uma falta de currículo ganhador que, como disse anteriormente, não define a qualidade técnica de Carlos Queiroz enquanto treinador de futebol, bem patente numa carreira que o levou aos quatro cantos do mundo e a estar presente em várias fases finais de Mundiais, Taças das Nações Africanas, Copa América ou Taça da Ásia. Mas que diminui o prestígio de um treinador que, para além de ter poucos triunfos significativos enquanto treinador principal, também mostra uma enorme dificuldade em aceitar e encaixar as derrotas.
Esta é, provavelmente, a característica mais difícil de tolerar em Carlos Queiroz e que se tem repetido em demasiadas ocasiões. Foram recorrentes, na carreira do treinador português, as vezes em que aos insucessos das suas equipas se seguiram acusações a terceiros, a atribuições de responsabilidades a outros e muito poucas assunções de responsabilidades próprias. Ainda ontem, depois de uma eliminação digna do Irão, uma seleção que, depois da goleada sofrida no jogo inaugural contra a Inglaterra, conseguiu vencer o País de Gales e lutou até a último minuto para conseguir um golo frente aos Estados Unidos que lhe abriria a porta dos oitavos-de-final, Queiroz não resistiu a fazer, aos microfones da Sport TV, um discurso desculpabilizador. Queixando-se de que se falou excessivamente de direitos humanos, das mulheres, dos maridos – sim, emendou a frase, mas disse-o –, dos animais ou das árvores e que isso impediu os seus jogadores de se expressarem na plenitude e a ele de se focar apenas em orientá-los. Foi mais longe, e fez acusações sobre alegadas ameaças de morte que a equipa recebeu durante a competição, sem apontar, porém, a origem, deixando em aberto, com isso, que não terão sido oriundas do Irão. Caso contrário não poderia ter admitido, como acabou por fazer, a hipótese de se manter como selecionador daquele país.
Como dizia, há dias, num texto publicado na sua página de Facebook, João Querido Manha, uma das grandes figuras das história do jornalismo desportivo deste país, Carlos Queiroz “não passou ao lado de uma boa carreira, porque atingiu e mantém uma dimensão mundial, mas podia ter sido o maior treinador português de sempre. E não será.” Não podia estar mais de acordo e acrescento: não o será apenas porque não sabe ganhar, mas também, e sobretudo, por não sabe perder.