Em junho de 2023, foi publicada a Diretiva Europeia sobre Transparência Salarial, em que se promovem novas regras em matéria de transparência remuneratória, que tem por objetivo combater a discriminação e ajudar a colmatar as disparidades remuneratórias em função do género na UE.
“Transparência tem tudo a haver com a partilha”, afirma Marta Dias, Rewards Leader da Mercer Portugal, em entrevista à VISÃO. “Existe transparência salarial quando a empresa partilha informação com os seus colaboradores sobre, por exemplo, a política de compensação, as formas de renumeração”.

Em linguagem simples: as empresas são convidadas a revelar os salários que pagam aos seus funcionários, de forma clara e transparente. Uma prática que, segundo o que se percebe pela experiência noutros países, contribui bastante para a justiça salarial e a potencial retenção de talentos.
Esta medida, recentemente aprovada pelos orgãos europeus, terá de ser transposta pelos estados-membros para a legislação nacional até 2026, mas é um tema ainda pouco claro para um número muito significativo de empresas em Portugal. A conclusão é do estudo “Readiness Assessment – Transparência Salarial”, desenvolvido pela Mercer Portugal, onde se apurou que 59% das organizações diz estar a trabalhar ativamente o tema da transparência salarial, mas 40% admite que ainda não conhece bem a diretiva e as implicações da mesma.
E isto acontece porque, segundo a especialista, “em Portugal, não existe uma cultura de partilha de informação relativamente à compensação. Até porque muitas organizações não têm uma estrutura que dê forma aquilo que são as suas práticas ou que regule aquilo que são as suas normas”.
No estudo analisou-se o panorama e o progresso das empresas no âmbito da equidade e transparência salarial e o nível de preparação para esta diretiva europeia, e que contou com a participação de 120 empresas de diferentes setores.
Este é um tema que é considerada uma prioridade alta ou média para 90% das organizações, enquanto apenas 10% a veem como um tópico de baixa prioridade a ser abordado nos próximos anos. Entre as razões mais frequentemente indicadas para as empresas trabalharem a transparência salarial, destacam-se a integração do tema na estratégia de equidade salarial (73%) e o facto de o tópico fazer parte do modelo de valores da organização (51%).
“A medida protagoniza duas componentes: a transparência e a equidade salarial. E, no fundo, a lógica que se pague o mesmo a quem trabalha o mesmo. No limite, o impacto que esta medida pode ter é uma questão de maior justiça no contexto das renumerações”, diz Marta Dias. “Será um impacto positivo para as organizações e para os colaboradores. Estes últimos têm cada vez mais expectativa sobre esta matéria. Num outro estudo que realizámos percebemos que um dos fatores que os colaborados consideram como crítico na sua decisão de ficar numa organização está relacionada com a justiça salarial.”
Outra das conclusões centrais deste estudo revela que 40% das empresas inquiridas afirmam ainda não conhecer suficientemente a nova diretiva e as suas implicações. As organizações reconhecem enfrentar desafios significativos, apontando como mais proeminentes estarem ainda a perceber o que fazer em matéria de transparência salarial (43%), a criação de uma estrutura de classificação que permita a identificação de postos de trabalho comparáveis (41%) e o desenvolvimento de análises de equidade salarial (38%).
“Fizemos este estudo com o foco de perceber quais eram as principais dores das empresas, digamos assim, mas também para conseguir identificar boas práticas que as organizações já implementaram”, analisa a Rewards Leader da Mercer.
A maioria [das empresas] não está pronta para comunicar aos trabalhadores as suas políticas e isso tem impacto na dinâmica da organização
marta dias
Atualmente, entre as participantes no estudo, apenas 33% das empresas partilha com os colaboradores a banda salarial para a sua função e apenas 10% partilha informação sobre a compensação prevista para a função. Adicionalmente, sempre que existe algum tipo de informação partilhada, a mesma é divulgada apenas internamente (61%).
“As empresas presentes no estudo podem dividir-se em dois grandes grupos: um que tem sistemas desenvolvidos e modelos de remuneração e que querem encontrar as adaptações que são necessárias para estarem preparadas para dar resposta à diretriz; e um outro que não tem este tipo de processos e está numa fase inicial do modelo”, explica a especialista.
Os setores de atividade das empresas em estudo estavam inseridas nas áreas de Aeroespacial e Defesa; Alimentação & Bebidas; Automóvel; Banca / Serviços Financeiros; Bens de Consumo; Ciências Médicas; Energia; Hi-Tech / Tecnologia; Logística; Outros Não-Produção; Outros Produção; Retalho e Venda por Atacado; Seguros / Resseguros; Serviços (Não-Financeiros); Serviços de Saúde.
Um outro ponto importante para Marta é a comunicação. “As empresas têm de apostar na comunicação, principalmente sobre este tema. A maioria não está pronta para comunicar aos trabalhadores as suas políticas e isso tem impacto na dinâmica da organização”, diz. Mas o principal mote é “preparar, preparar e preparar para aplicar este medida de forma suave, para que não seja uma dor para as organizações”.