Três anos depois chegou o veredicto sobre a agressão cometida por um utente contra um médico que estava de serviço de atendimento permanente, no final de ano de 2019, no Centro de Saúde de Moscavide. Armando C. foi condenado pelo Tribunal de Loures a oito meses de pena de prisão – suspensa por cinco anos mediante o cumprimento de um plano de reinserção social – e a 120 dias de multa, por terem ficado provados os crimes de ofensas à integridade física qualificada, um de dano e ainda o de difamação agravada.
De acordo com o acórdão a que a VISÃO teve acesso, o condenado terá ainda de indemnizar o clínico Vítor Manuel Santos em mil euros, tendo em conta que o profissional do Serviço Nacional de Saúde (SNS) teve de ficar de baixa devido ao ataque.
No mesmo processo, Armando C. viu ainda o Juízo Criminal de Loures condená-lo pela prática de ameaças agravadas, já que, duas semanas antes dos acontecimentos e com 20 anos acabados de fazer há cinco dias, também intimidou a funcionária do Centro de Saúde do Prior Velho.
O jovem acabou por se livrar de outros vários crimes que corriam contra si, por nos dias seguintes ter cometido semelhante façanha num outro centro de saúde, mas em relação ao seu médico de família. Porém, não só não ficaram provadas as alegadas agressões físicas aí cometidas, como o clínico aceitou o seu pedido de desculpas mais tarde.
Além de Armando C., a namorada deste, Paula G., que o acompanhava nos dois episódios de violência, respondia igualmente por vários crimes, mas acabou somente condenada pelo de furto – já que terá roubado o carimbo das receitas do médico de família do jovem. Não ficou provado que, entre outras acusações a que respondia, Paula tivesse ajudado a manietar o primeiro médico e partido o teclado do computador.
Este caso, que ocorreu 31 de dezembro de 2019, levou não são as estruturas sindicais dos médicos a apelarem ao Governo por medidas urgentes contra as agressões aos clínicos do SNS, que na altura estavam a relatar casos de ameaças de utentes que desesperavam com tempos de espera nas urgências, como à ministra da Saúde de então, Marta Temido, a comprometer-se com um pacote de medidas que visassem a proteção de todos os profissionais do setor – algo que depois se concretizou.
IRRITADO COM NÃO À RENOVAÇÃO DE BAIXA
Foi a 31 de dezembro de 2019, pelas 15 horas, que Armando conseguiu uma consulta de urgência no Centro de Saúde de Moscavide – que naquele dia prestava o serviço de atendimento permanente na região. Acompanhado por Paula, o jovem começou por pedir ao médico Vítor Santos a vacina contra a gripe. Ora, o clínico esclareceu-o que ali naquela valência não a poderia tomar.
Na altura com baixa terminada a 26 de dezembro e a ter de justificar as ausência num armazém onde trabalhava como fiel, Armando pediu então a renovação do atestado. A vítima percebeu pelo sistema, ao consultar o processo do utentes, que o jovem não tinha levantado os medicamentos que lhe tinham sido prescritos e recusou declarar a baixa retroativa, encaminhado o assunto para o colega médico de família.
Terá sido aí que o agressor, além de ter quebrado um teclado e destruído o tele móvel do médico, começou por desferir um murro no olho do profissional do SNS. Seguiram-se depois murros e pontapés na face e no peito. O médico acabou por sofrer lesões graves no olho e nas costelas – ao ponto de ter ficado incapacitado por vários dias.
DEIXOU MÉDICO SEM PASSAR RECEITAS
Já depois deste caso, dois dias depois e de novo acompanhado por Paula, Armando C. voltou a fazer das suas; desta vez com o seu médico de família, no Prior Velho.
Na manhã de 2 de janeiro, o jovem foi a uma consulta com o médico de clínica geral Rower Figueiroa, para pedir uma baixa. Mas como começou a garantir à namorada que daria umas facadas ao médico Vítor Santos, para lhe tirar a vida, Rower Figueiroa terá pedido aos jovens que abandonassem a sala – ao que Paula terá respondido com o furto do carimbo com que o profissional do SNS emitia as suas receitas.
Armando, com 23 anos agora, e Paula, de 25, são de famílias desestruturadas e passaram uma vida difícil, tanto mais que o jovem, à altura dos acontecimentos pernoitava ou no carro ou em casa de amigos. O coletivo de três juízes levou esse complicado contexto social em conta. Refira-se que o jovem “revelou ter um caráter impulsivo e imponderado, que terá contribuído para a prática dos factos em apreço, agravada pela situação de saúde em que o arguido se encontrava, tanto mais que à data o arguido encontrava-se a viver na rua dentro de um veículo, sem suporte familiar”, lê-se no acórdão.
Saliente-se que os 120 dias de multas, que resultam de um cúmulo jurídico dos 150 dias a que foi condenado, perfazem uma multa de 600 euros. Além do acompanhamento técnico dos Serviços Prisionais, Armando C. tem também de “sujeitar-se a acompanhamento psicológico”. Os mil euros que terá de pagar de pouco servirão à vítima já que se trata do valor que acabou por despender com o seu advogado e nem cobrem o valor do telemóvel que foi destruído.
Já Paula, de quem o médico Vítor Santos se queixava de o ter manietado para que o jovem o agredisse, viu o Tribunal absolvê-la desse crime.