1. Faro-Oeste, de Pauliana Valente Pimentel, Galeria Quadrum
Pauliana Valente Pimentel já havia começado a retratar algumas famílias da comunidade cigana algarvia, na zona de Castro Marim e de Vila Real de Santo António. Estávamos em 2019, e um convite do Festival Verão Azul para uma residência artística levou a fotógrafa a alargar o território. Fotografou em quatro acampamentos (Cerro do Bruxo, Horta da Areia, Alto do Relógio e Monte João Pequeno), em Faro, Loulé e Boliqueime, onde esse festival acontece.
Faro-Oeste foi mostrada, em 2021 e 2022, no Museu Municipal de Faro e no Centro Cultural de Lagos, respetivamente. A exposição está agora em Lisboa, na Galeria Quadrum, no complexo de ateliers de artistas dos Coruchéus, em Alvalade, onde Pauliana Valente Pimentel é residente. Uma seleção de fotografias, que mais parecem pinturas impressas em grandes panos e dispostas em estendais, ocupa a galeria, para mostrar como estas famílias mantêm as suas tradições, “com o intuito de combater preconceitos e estereótipos racistas e xenófobos de que são constantemente alvo”, escreve a artista, no texto de apresentação. I.B. Complexo dos Ateliers Municipais dos Coruchéus, R. Alberto de Oliveira, 52, Lisboa > T. 21 583 0022 > até 25 jun, seg-dom 10h-13h, 14h-18h > grátis
2. Histórias de uma Coleção, Fundação Calouste Gulbenkian
Um mural, a lembrar as montagens oitocentistas, abre Histórias de uma Coleção na galeria principal da Fundação Calouste Gulbenkian. Uma espécie de aperitivo, erguido numa estrutura de madeira onde estão dezenas de obras, adquiridas desde os primórdios do acervo do Centro de Arte Moderna (CAM) a anos recentes, e que espelha os diferentes movimentos e práticas artísticas.
Mas o que é uma coleção? Como se constitui? Que histórias nos conta? É o que somos convidados a descobrir em quatro núcleos expositivos, com 207 trabalhos de 187 artistas portugueses e internacionais (a atual coleção, que vai no seu quinto diretor, cada um com diferentes formas de a orientar, soma 12 mil obras de 1 200 artistas). Por entre as ripas de madeira do tal mural, anteveem-se sete em destaque: de Retrato de Fernando Pessoa, de Almada Negreiros, a pintura e escultura de Amadeo de Souza-Cardoso, Maria Helena Vieira da Silva, Paula Rego, João Cutileiro, David Hockney e Phillip King.
Na exposição, recordam-se não apenas 40, mas 65 anos de aquisições que têm vindo a dar forma a uma das mais importantes coleções de arte moderna e contemporânea em Portugal. O edifício do CAM inauguraria a 20 de julho de 1983, para mostrar o que os artistas estavam a produzir (em Portugal, não existia sequer um museu dedicado à arte do século XX). Mas a aquisição de obras pela Fundação Calouste Gulbenkian começa em 1958 por vontade do seu primeiro presidente, José de Azeredo Perdigão, no âmbito do apoio a artistas. A intenção era também reunir peças para serem apresentadas em exposições itinerantes, no País e no estrangeiro.
A retrospetiva surge da necessidade de criar um contacto com o público, esclarece Leonor Nazaré, uma das quatro curadoras da exposição. O edifício do CAM encontra-se em obras de renovação, projetadas pelo arquiteto japonês Kengo Kuma, e deverá reabrir no primeiro semestre de 2024. Até lá antecipa-se o futuro, diz Benjamin Weil, através de exposições na fundação e de um conjunto de projetos fora de portas, como o CAM em Movimento, com o objetivo, aponta o atual diretor do Centro de Arte Moderna, de pensar o novo centro. “Queremos apresentar as formas mais inovadoras de arte contemporânea, mantendo o foco na formação de novos públicos.” I.B. Av. de Berna, 45A, Lisboa > até 18 set, seg, qua-sex e dom 10h-18h, sáb 10h-21h > €6, grátis dom a partir das 14h
3. BD Portuguesa, Museu Bordalo Pinheiro
Chegará o dia em que, em Beja, vai ser inaugurado o Museu da Banda Desenhada. O mais importante já existe: um projeto em curso da câmara municipal e, sobretudo, uma valiosa coleção de materiais que contam a história da BD em Portugal, do século XIX aos nossos dias. É, precisamente, uma (pequena) parte desse acervo que pode agora ser vista no Museu Bordalo Pinheiro, em Lisboa, na exposição BD Portuguesa – Um Olhar Sobre as Coleções do Museu da Banda Desenhada de Beja, com curadoria de Paulo Monteiro.
Nas paredes podem ver-se pranchas originais de autores como, entre outros (num total de 14), Carlos Botelho, José Ruy, Artur Correia e Fernando Relvas. Os criadores de BD mais recentes ali representados são Filipe Abranches e Miguel Rocha. Do humor à representação de episódios históricos, passando por imaginários mais oníricos e até pelo clássico género de westerns aos quadradinhos, são muitos os estilos que provam a riqueza da História da BD nacional. Paralelamente, uma outra exposição no mesmo museu mostra-nos como Rafael Bordalo Pinheiro foi um pioneiro, mesmo a nível europeu, nesta arte de misturar desenhos e palavras, que começou por nascer, em meados do século XIX, numa ligação direta ao mundo dos jornais e revistas. P.D.A. Campo Grande, 382, Lisboa > T. 21 581 8540 > até 18 jun, ter-dom 10h-18h > €3
4. Recursos Naturais, de Miguel Palma, Hangar
Numa era de interpretações literais e rápidas indignações, a ironia tem de ser, muitas vezes, sinalizada. É o que acontece na folha de sala de Recursos Naturais, individual de Miguel Palma, com curadoria de Pedro Gadanho: “O título da exposição é, naturalmente, irónico”, lê-se. É verdade que a Natureza irrompe muitas vezes na obra do artista, mas sempre filtrada pela tecnologia e pela irrequietude do ser humano na Terra. Nestas peças, raramente mostradas, mistura-se, como muitas vezes na obra de Miguel Palma, uma dimensão lúdica com um sentido crítico que, de forma mais ou menos óbvia, nos motiva a colocar questões (mais do que a encontrar respostas). A sensação de ameaça, de futuro comprometido, de risco de esgotamento dos recursos naturais por causa das ambições humanas, perpassa a exposição – que, no entanto, nunca se parece com uma qualquer espécie de manifesto ambientalista.
A obra mais antiga agora presente na sala do Hangar é de 1996: Projecto 2080, com árvores no lugar do céu, remete para um plano europeu de reflorestação como uma espécie de utopia salvífica. E a mais recente, de 2023, é agora mostrada pela primeira vez. Palafita nasceu numa velha casa de bonecas – Miguel Palma continua a abastecer-se no circuito de bricabraques e velharias para as metamorfoses que opera no seu atelier/oficina – com oito divisões habitadas por “espaços de experiências, pequenos laboratórios” em que a água, símbolo do início da vida e presença frequente em tantas tecnologias do engenho humano, ocupa um lugar central. A água também está presente em Bypass, de 2012, com uma raiz que envolveu um cano de plástico – o orgânico e a intrusão artificial, humana –, peça que se encaixa naturalmente nesta exposição: o artista criou um circuito alternativo para que o líquido continue a circular, sem bloqueios. A arte pode salvar o mundo? Não serão as bizarras máquinas e criações de Miguel Palma a dar-nos a resposta, mas… P.D.A. R. Damasceno Monteiro 12, Lisboa > T. 93 415 5100 > até 17 jun, qua-sáb 15h-19 > grátis
5. Fernanda Fragateiro – Em Bruto: Relações Comoventes, CCB
A exposição que agora ocupa o piso 0 do Museu CCB (designação provisória e precária, depois do fim naquelas instalações do Museu Berardo e antes do futuro Museu de Arte Contemporânea MAC/CCB) partiu de um convite feito pela Fundación Cerezales Antonino y Cinia, de León, Espanha, a Fernanda Fragateiro. Foi aí que pôde ser vista pela primeira vez, em 2022. No centro de tudo está uma grande instalação que remete para os códigos e a linguagem da artista portuguesa, com uma “estrutura complexa de traves, cavaletes e barrotes que convocam noções de reconstrução do espaço e da sua reconfiguração”, como se pode ler na apresentação de Em Bruto: Relações Comoventes.
Mas o público tem pistas para fazer uma leitura mais completa, profunda e proveitosa da obra de Fernanda Fragateiro a partir desta exposição. No final há uma sala de leitura com livros de arquitetos e arquitetas que são direta e discretamente citados na instalação e, de algum modo, influenciaram a sua autora. E, no início, naquilo a que a artista chama Materials Lab, há uma panóplia de objetos (“livros, artigos, mapas cromáticos, restos de materiais usados noutras obras, fotografias e manuscritos”) que nos ajuda a sintonizarmo-nos com o universo e o imaginário de Fernanda Fragateiro, nome central da nossa arte contemporânea. P.D.A. Pç. do Império, Lisboa > T. 21 361 2400 > até 10 set, ter-dom 10h-19h > €5
6. Rui Chafes e Alberto Giacometti – Gris, Vide, Cris, Fundação Calouste Gulbenkian
O artista suíço Alberto Giacometti morreu em Coira, na Suíça, em 1966, o mesmo ano em que, em Lisboa, nascia o escultor Rui Chafes. Agora, as suas obras – esculturas esguias de bronze e delicadas cabeças de barro ao lado de misteriosos objetos de ferro negro – convivem num mesmo espaço, a galeria do piso 0 da Fundação Calouste Gulbenkian.
O impulso inicial para esta exposição nasceu na vontade visionária da curadora Helena de Freitas. Rui Chafes recorda-se da reação quando, em 2016, lhe foi proposta a concretização deste projeto, pôr as suas obras a comunicarem com as de Giacometti: “Disse-lhe, ‘Helena, isso nunca vai acontecer, é um sonho, nem sequer poderia tocar com um dedo numa escultura do Giacometti, o gigante da montanha.’” Mas ela insistiu, e contactou a fundação parisiense dedicada ao escultor suíço. Depois de uma reunião em Paris, a ideia seguiu mesmo o seu curso.
Já na preparação da exposição, Rui Chafes foi ainda mais surpreendido quando recebeu um email a propor-lhe “completar uma peça do Giacometti que estava inacabada” – “É como pedir para completar uma composição do Mozart…”, comenta, agora, à VISÃO. Daí nasceu La Nuit, que integra o tal fragmento de uma obra inacabada de Giacometti, Le Nez (1947-1950), e é central nesta mostra, Gris, Vide, Cris (três palavras extraídas de um poema de Giacometti).
Os títulos em francês explicam-se pelo facto de esta exposição ter tido uma primeira versão, em 2018, na delegação da Gulbenkian em Paris. Agora, em Lisboa, pode ver-se uma versão revista e aumentada (a Fundação Giacometti cedeu mais quatro obras; Rui Chafes realizou seis novas esculturas). O projeto expositivo, assinado pelo arquiteto José Neves, tem aqui um papel preponderante na sua simplicidade eficaz, de cores claras, frias, a contrastarem com o ferro e o bronze. Duas peças em particular levam a comunicação entre artistas mais longe, com grandes estruturas negras a funcionarem como estranhos e escuros casulos para a delicadeza das peças de Giacometti. P.D.A. Av. de Berna, 45, Lisboa > T. 21 782 3000 > até 18 set, ter-dom 10h-18h > €4, grátis dom a partir das 14h
7. Hello! Are You There?, de Luísa Cunha, MAAT (Central Tejo)
“Luísa, Luuuuísa, Luiiísa…”. O chamamento insistente reverbera nas enormes caldeiras da Central Tejo, em Lisboa, levando-nos, inevitavelmente, a perguntar onde estará Luísa. Talvez seja a mesma pergunta que Luísa Cunha fez quando criou, em 2015, Artista à Procura de si Própria. É este o prelúdio da ironia que promete Hello! Are You There?, a primeira exposição retrospetiva da obra de Luísa Cunha.
“O universo da Luísa é intrigante e provocador, e exige de nós muita atenção, ao deslocar-nos para outros espaços e paisagens mentais”, explica a curadora Isabel Carlos. De facto, temos a sensação de sermos convidados a esquecer como nos ensinaram a ver o mundo e a aceitar descobri-lo através da representação visual, sonora e, de certa forma, poética que a artista faz dele.
As obras desarmam e são capazes de provocar espanto, desafiando-nos a redescobrir, através de perspetivas novas, espaços, objetos e emoções que já conhecíamos. Carregadas de ironia e de humor, “que Luísa trabalha de modo único e singular”, vão-se encadeando legendas para as paisagens interiores, que constroem o mundo da artista.
Numa sala que Isabel Carlos define como “profundamente autorreferencial”, surgem, por exemplo, um retângulo, que representa a altura e largura de Luísa, e uma série de nove “fotografias”, nas quais lemos descrições textuais daquilo que a artista, com 58 anos, vê ao olhar para fotografias suas com 2 anos. “O jogo entre o título das obras e o que vemos é também muito importante”, como acontece, por exemplo, em Obra com Nível – um nível de bolha de ar pendurado na parede.
A ironia, além de se ler, também se ouve, nas esculturas sonoras, que a curadora fez questão de espalhar um pouco por todo o primeiro andar da Central Tejo. É a palavra feita matéria, sob todas as formas possíveis, que a artista encontrou para nos perguntar “are you there?” Mariana Almeida Nogueira Av. Brasília, Lisboa > T. 21 002 8130 > até 28 mai, qua-seg 9h-18h > €9 (o bilhete dá acesso a todas as exposições no MAAT)