Quem não conhece Marco Polo, o famoso viajante veneziano que, nos finais do século XIII, andou 24 anos pelo Oriente – Ásia Central ao longo da rota da seda, China setentrional e meridional, Japão, Índia, Sudeste Asiático e costa oriental de África? Todos lemos, ou pelo menos vimos e folheámos, resumos juvenis e ilustrados do livro que ele nos deixou, constantemente editado desde que existe uma indústria editorial moderna e um público consumidor. Já serão em menor número as pessoas que conhecem de facto o texto originalmente escrito pelo homem cujo nome quase se tornou sinónimo de “viajante”. A bem dizer, Marco Polo não escreveu o livro: ditou-o a um companheiro de cela (Rusticiano de Pisa, autor de romances de cavalaria como os que levariam D. Quixote à loucura), quando, no regresso a Itália, se viu envolvido numa guerra entre duas repúblicas rivais – a sua Veneza e a inimiga Génova.
Conhecido na época por Il Milione (O Milhão) – ou porque contava inúmeras maravilhas ou porque o título derivava do apelido de família do viajante, que era Emilione –, o livro de Marco Polo levou também à loucura, não um fidalgote anónimo da Mancha, mas o mundo inteiro. Foi este pequeno volume escrito em linguagem viva e direta que, nos séculos XIV e XV, incendiou a imaginação de geógrafos, astrónomos, reis, príncipes portugueses – como o D. Pedro das Sete Partidas ou o infante D. Henrique –, “simples” viajantes – como Cristóvão Colombo –, inventores de mundos, fruidores de sonhos e calculadores de probabilidades comerciais. O público português interessado tem, agora, o novo ensejo de ler com facilidade este texto fundamental da cultura ocidental que, por contraste, se debruça sobre a oriental – o que, aliás, explica o seu sucesso através dos séculos.
Viagens (Clube do Autor, 316 págs., €16), o célebre livro de Marco Polo, tem agora mais uma edição em língua portuguesa, esta prefaciada e recomendada por Gonçalo Cadilhe, no âmbito da coleção Os Livros da Minha Vida.