O padrão de doentes hospitalizados com Covid-19 nos Estados Unidos da América alterou-se com a nova variante Delta. Agora quem chega aos hospitais são pessoas com menos de 50 anos e não vacinadas, uma grande diferença relativamente ao padrão de doentes no início da pandemia.
Na cidade de Baton Rouge, no estado de Louisiana, jovens adultos sem fatores de risco (obesidade e diabetes) estão a dar entrada nos hospitais, bastante afetados pelo coronavírus. Por todo o país, médicos que trabalham diretamente com casos de Covid, dizem que os pacientes são diferentes dos que atenderam no ano passado. A maioria são jovens com idades entre os 20 e 30 anos, chegam mais doentes do que os pacientes com a mesma idade recebidos no ano passado e a doença avança mais rapidamente. E não estão vacinados.
Os médicos criaram uma espécie de slogan, para caracterizar os atuais pacientes: “younger, sicker, quicker”, que em português significa “mais novos, mais doentes, mais rapidamente” e acreditam que a causa pode ser a variante Delta.
Em Portugal 98,3% dos novos casos são causados pela variante Delta, segundo dados do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, divulgados a 3 agosto. Nos EUA, os valores são um pouco inferiores representando 80% das novas infeções.
Alguns estudos internacionais sugerem que a variante pode causar doença mais grave, mas não há dados definitivos que mostrem que é de alguma forma pior para adultos jovens. Uma possível justificação apresentada pelos especialistas para que o coronavírus esteja a afetar os mais novos, deve-se ao facto de as faixas etárias mais velhas terem uma percentagem superior de vacinação completa.
“Não acho que existam fortes evidências sobre se [a variante Delta] causa doenças mais graves”, disse Adam Ratner, professor de pediatria e microbiologia da Universidade de Nova Iorque ao The New York Times. “Isto pode ser comportamental, uma combinação do facto de estarmos a abrir as coisas e, em alguns sítios, já não se usar máscaras, o que é diferente de há um ano ou 15, 16 meses”, acrescentou.
Mais de 80% dos americanos com idades entre 65 e 74 anos já foram totalmente vacinados, enquanto a percentagem de pessoas com idades entre os 18 e 39 está abaixo dos 50%, de acordo com os dados do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças. Em Portugal, a faixa etária entre os 65 e 79 já conta com 96% de vacinação completa, enquanto a faixa etária dos 18 aos 24 tem 11,6% de vacinados e a faixa etária dos 25 aos 49 tem 50% das pessoas com vacinação completa, de acordo com a DGS.
Relativamente aos internamentos nos EUA, 97% das pessoas que chegam ao hospital não estão vacinadas.
O Centro de Controlo e Prevenção de Doenças descreveu, num documento acedido pelo The New York Times, “que a variante Delta é tão contagiosa quanto a varicela e pode causar doença mais grave do que a variante alfa”.
A idade média dos internados Covid, em Portugal ronda os 55 anos, quando, entre janeiro e fevereiro, situava-se nos 70 anos. Em novembro de 2020, cerca de 4% dos internamentos eram pessoas com menos de 40 anos e 63% dos pacientes com 70 ou mais anos. Na segunda metade do mês passado 68,1% dos doentes em unidades de cuidados intensivos tinham menos de 59 anos. Mais uma vez esta situação traduz-se no efeito da vacinação.
“Algo sobre este vírus é diferente nesta faixa etária”, disse a Catherine O’Neal, diretora do Centro Médico Regional Nossa Senhora do Lago em Baton Rouge, ao The New York Times. “Acabamos por nos questionar o porquê de algumas pessoas apanharem Covid-19. Agora estamos a ver isso com mais frequência. Acho que é uma nova Covid”, acrescentou a médica americana.
Cam Patterson, diretor da Universidade de Ciências Médicas no Arkansas, disse ao The New York Times que a idade média dos pacientes admitidos durante o inverno era 60 e agora passou para 40. “A nossa sensação é que as pessoas mais jovens e saudáveis são mais suscetíveis à variante Delta do que as variantes anteriores”, disse Patterson.
A variante levou pouco mais de um mês a provocar a maioria das novas infeções. “A transição que vimos em relação aos pacientes mais jovens e às pessoas que adoeciam mais rapidamente coincidiu quase precisamente com o surgimento da variante Delta no Arkansas”, explica Patterson. “Para nós parece uma doença totalmente diferente”, acrescentou.
Angie Honsberg, a diretora dos cuidados intensivos do centro médico Universitário de Las Vegas, concorda que os pacientes jovens estão a adoecer mais rapidamente, que antigamente os doentes resistiam mais tempo aos sintomas em casa e no hospital demoravam mais tempo a precisar de cuidados intensivos. “A minha suspeita é que a variante Delta, provavelmente, se comporta de uma maneira um pouco diferente”, completou Angie.
Terrence Coulter, diretor dos cuidados intensivos do CoxHealth, no estado do Missouri, observa o mesmo. “Pensávamos que na primeira vaga, os pacientes jovens e as crianças iriam contrair coronavírus sem se aperceberem ou teriam uma doença leve. Com a variante Delta, não é assim. É muito mais grave, sem dúvida, do que a variante original”.
Um estudo realizado na Escócia concluiu que os infetados com a variante Delta correram quase o dobro do risco de serem hospitalizados, em comparação com aqueles infetados com a variante Alfa. Num estudo realizado no Canadá, os especialistas concluíram que o risco de os doentes serem internados nos cuidados intensivos era quase quatro vezes maior com a variante Delta, em comparação com pacientes infetados com outras variantes. Os pacientes com a variante Delta tinham o dobro do risco de hospitalização ou morte. Um outro estudo realizado na Índia obteve conclusões semelhantes e acrescentou que a probabilidade era maior em doentes com menos de 45 anos.
A teoria de alguns especialistas é que a gravidade com que a variante Delta parece afetar as pessoas pode ser simplesmente justificada pelo facto de ser mais contagiosa. Havendo mais infeções, o número total de doentes graves tende a aumentar, mesmo que a variante em si não cause doenças mais graves do que as variantes anteriores.