“O oceano esquecido”. É desta forma que um conjunto de cientistas dos Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Alemanha, Suíça, França, Japão e Trinidad e Tobago se referem àquele que consideram ser um dos pilares do combate às alterações climáticas e de biodiversidade, mas que tem vindo a ser esquecido e ignorado pelas forças políticas em todo o mundo.
O documento The forgotten ocean: Why COP26 must call for vastly greater ambition and urgency to address ocean change (O oceano esquecido: porque a COP26 deve exigir muito mais ambição e urgência para lidar com as mudanças do oceano), publicado na revista científica Aquatic Conservation: Marine and Freshwater Ecosystems, defende que a crise climática e a crise de biodiversidade não se resolvem se o oceano continuar a ser ignorado e não fizer parte dos planos de ação ambiental à escala global, figurando como uma das prioridades.
“A taxa de mudança climática ainda está a acelerar, em grande parte ligada às mudanças no oceano, causando um declínio contínuo na natureza e perturbação em escala planetária ao meio ambiente, às pessoas e a todo o nosso futuro”, alerta o artigo científico do Programa Internacional sobre o Estado do Oceano (International Programme on the State of the Ocean – IPSO), que diz que a COP26 é o “momento” ideal para reconhecer “o papel fundamental que o oceano desempenha”. “A cimeira também oferece uma oportunidade de ouro para estimular a proteção e recuperação do oceano global, que ajudará a enfrentar as perturbações climáticas, reverter a perda de biodiversidade, apoiar o bem-estar humano e permitir que o mundo embarque numa recuperação bem-sucedida da pandemia COVID-19”, frisam os cientistas.
O impacto que o aquecimento global tem nos oceanos é o grande ponto de destaque do documento, que é entregue na COP26 na véspera do Dia do Oceano, celebrado a 5 de novembro na cimeira.
“Observa-se com ‘alta confiança’ que o oceano armazenou 91% do excesso de calor do aquecimento global, com a terra, o degelo e a atmosfera a ocupar apenas cerca de 5, 3 e 1%, respetivamente”, anunciam os cientistas, que defendem que, “para fazer a diferença, é imperativo que comecemos a estabilizar o clima e as mudanças do oceano e evitar qualquer perda adicional da natureza”.
Agir o quanto antes
Publicado na edição de novembro da revista científica dedicada aos estudos do mar, o artigo explica que “para acompanhar “as mudanças aceleradas do oceano e os [seus] efeitos cumulativos” deve-se “melhorar constantemente a nossa compreensão dos processos oceânicos e traduzir rapidamente essas descobertas e outras formas de conhecimento em tomadas de decisão informadas, com base em iniciativas preventivas e proativas”.
Para fazer com que o oceano deixe de ficar esquecido na luta contra as alterações climáticas e, por consequência, que deixe de ser um dos mais afetados pelo estado atual do clima, os cientistas apresentam “seis ações políticas baseadas na ciência que formam um pacote de estímulo de recuperação para as pessoas, o clima, a natureza e o planeta”. As propostas apresentadas destacam o que é necessário “ver, valorizar e tratar o planeta, incluindo o oceano”, pois só assim se garante o futuro do planeta e das espécies.
Uma primeira medida pede a ampliação das soluções para um “nível de paisagem terrestre”, sendo que, aqui, o sugerido é salvaguardar, pelo menos, 30% do oceano por meio de áreas marinhas protegidas. Acelerar e integrar a eficácia das ações do clima e da biodiversidade para obter um maior impacto e efeito é também uma das ações propostas pelos cientistas. Neste ponto, os autores do documento pedem que as áreas protegidas sejam vistas não só como palco de biodiversidade – que deve ser estimado -, mas também avaliadas pela sua capacidade de “sequestro de carbono do oceano”.
Interromper o apoio a qualquer tipo de atividade que possa comprometer o oceano (e as espécies que lá habituam) e impulsionar a recuperação dos oceanos por meio de uma cooperação global são outras duas propostas feitas pelos cientistas, que abordam ainda a importância de se destacar a ligação entre a natureza e a economia, olhando para o “capital natural do oceano”, que, dizem, “é vasto e profundo, e os serviços oceânicos são muitas vezes tidos como certos e usados de graça, com os danos não reconhecidos e não compensados”. Por fim, há ainda o apelo de manter o oceano saudável, produtivo e resiliente através de novas descobertas científicas e de mais interesse académico sobre o tema.