Com as visões críticas do passado a ganharem cada vez mais terreno, onde se contam os recentes episódios como os apelos para a retirada das sete pinturas do Salão Nobre do Parlamento ou para o desmantelamento do Padrão dos Descobrimentos, os historiadores Paulo M. Dias e Roger Lee de Jesus alertam para o risco das leituras fáceis, “rápidas e descartáveis” da História, quando se trata de um trabalho que não deve decorrer sob a batuta de uma agenda política mas como um “ato de reflexão, ponderado e atento”.
“O passado tem de ser visto não como um lição – porque é difícil tirar lições; que lições vamos tirar da Batalha da Aljubarrota ou da Guerra da Restauração? Muito poucas. O passado tem de ser visto de uma forma muito particular; ou seja, qual é a visão do amanhã sobre o passado? Tem de ser uma visão clara e plural, diversa e ponderada, que está bastante longe da visão polarizada”, disse Roger Lee de Jesus, na tarde deste sábado, no VISÃO Fest, durante o painel “As lições da História”, onde esteve ao lado de Paulo M. Dias.
De acordo com Dias, perante a invasão do mercado livreiro com “pseudo obras” de leituras históricas pop, muito baseadas em episódios polémicos do passado nacional ou mundial “não podemos olhar para a história de uma forma rápida e descartável”. “A História precisa de tempo para pensar e, hoje, vivemos no imediato”, lamentou, salientando que tais trabalhos nem sequer são pioneiros a descobrir polémicas da História. “A conversa da decadência do País vem desde a Idade Média; aliás, estamos em permanente decadência”, disse.
Já Roger Lee de Jesus contrapôs que “os portugueses do passado não são os de hoje”. “Não me quereria encontrar num beco escuro com um português do século XV”, ironizou, destacando que “a memória histórica é construída. Recordar não é um ato neutro, e os monumentos não são neutros”.
Sobre o Estado Novo, um dos períodos mais polémicos, os historiadores admitiram que houve nessa altura “uma manipulação da História a bel prazer” do regime; ainda que “não haja [dessa altura] uma História oficial, guiada por motivações políticas”. “O salazarismo inventou muito pouco da História”, defenderam.
A dupla autora do podcast “Falando de História” concluiu que a historiografia “é uma profissão que requer o seu tempo e empenho”.