PESTO EM ITÁLIA
por Ingrid K. Williams
Depois de viver na Ligúria durante quatro anos, comi pesto, a especialidade culinária que melhor define a região, colocado sobre pizzas, espalhado sobre focaccia, salpicado sobre mariscos e barrado sobre massa. Comprei frascos de pesto em lojas e mercados locais e, em certa ocasião, tentei mesmo confecionar uma versão caseira, triturando manualmente manjericão fresco, pinhões, queijo ralado, sal e azeite na minha bancada de mármore.
Mas o pesto mais fresco e cremoso que já provei teve uma origem improvável: uma máquina de venda automática de pesto – chamada Pesto Mat – em Porto Venere, uma vila à beira-mar na costa da Ligúria. Embora a Pesto Mat tenha recentemente deixado de estar em funcionamento, a loja que conservava a máquina abastecida com frascos desse pesto divino ainda prospera. A Bajeico (de “manjericão”, no dialeto da Ligúria), fica numa estreita ruela pedonal, atrás da fila de casas em tons pastel que se alinham na pitoresca frente marítima de Porto Venere. Dentro da minúscula loja com paredes de pedra, os frascos de vidro estão dispostos atrás do balcão como esmeraldas em exposição, cada um deles cheio de pesto cremoso feito diariamente segundo uma receita de família tradicional (e secreta) -pronto para ser guardado no seu saco de compras ou numa mala bem almofadada. (O frasco de 200 gramas custa 7 euros.)
QUEIJO EM EDIMBURGO
por Alexander Lobrano
Estando a beber uma cerveja num pub de Edimburgo, no ano passado, enquanto esperava que uma tempestade passasse, travei conversa com o dono da galeria que se encontrava ao meu lado no bar. “Se vive em França, então com certeza que se delicia com o queijo de lá”, disse ele. “Bien sûr”, retorqui, mas acrescentei que, quando vinha à Grã-Bretanha, comprava sempre um bom pedaço de cheddar artesanal para levar para a minha casa em Paris. “O melhor cheddar do mundo é escocês… Vem da ilha de Mull”, afirmou ele. “Visite o Iain Mellis, ao virar da esquina, e ele dar-lhe-á a provar esse queijo.” Foi o que fiz.
O que eu não sabia até ao momento em que entrei nessa lojinha exemplar era que a Escócia produz uma pequena gama, embora magnífica, de queijos artesanais. Numa tarde chuvosa, o afável Mellis, de 49 anos, que abriu sua loja em 1993, a Iain J. Mellis Cheesemonger, depois de trabalhar 15 anos na indústria do queijo, deu-me generosamente uma interessante explicação.
“O queijo que fazemos, apesar de não ser em grande quantidade, tem muito carácter”, disse-me, enquanto eu provava um pouco de rimbister, queijo artesanal de Orkney, quebradiço e com um ligeiro sabor a limão, feito com leite de vaca não pasteurizado. Adorei o cheiro turfoso do aveludado Bishop Kennedy, que tomou o nome de um bispo do século XV de St. Andrews, sendo também um queijo de leite de vaca não pasteurizado. “A casca é lavada com whisky de malte durante a fase de maturação”, afirmou Mellis. Mas o que realmente me tornou um grande apreciador do queijo escocês foi o enorme prazer causado pelo intenso Strathdon Blue do produtor Ruaraidh Stone, um queijo azul feito numa cervejaria convertida em queijaria à beira-mar. De uma ou de outra forma, a verdade é que nunca vou à Escócia sem me abastecer no Mellis, em Edimburgo, ou numa das suas outras cinco lojas espalhadas pelo país.
AGUARDENTE EM COPENHAGA
por Seth Sherwood
A bebida espirituosa nacional da Dinamarca tem a astúcia de se mostrar de várias formas. Surge sob diversos pseudónimos -aguardente para muitos, aquavit (“água da vida”) para os poéticos, braendevin (“vinho de fogo”) para os ainda não convencidos -e são muitas as suas variedades. Elaborada a partir de batatas ou cereais destilados, esta bebida forte (geralmente com cerca de 40% de álcool) pode apresentar-se como uma infusão de ervas, sementes e bagas, numa só ou em múltiplas combinações, o que resulta em saboresquase infindáveis. Entre os produtores encontram-se desde grandes marcas veneráveis como a Aalborg Akvavit até casas mais recentes e requintadas como a Braunstein. O melhor lugar para experimentar a bebida é num dos bares e restaurantes tradicionais.
Não há muito tempo, em Copenhaga, o meu meio-irmão dinamarquês Jonas e eu fomos ao restaurante Told & Snaps para provar as suas bebidas espirituosas. Uma aguardente elaborada com espinheiro-amarelo foi a primeira. Era clara, leve, doce e floral. Uma variedade com sabor a frutos de roseira brava (“boa para dores reumáticas”, anunciava a ementa) irradiava um tom dourado profundo e tinha um gosto delicado de baunilha. Depois de bebermos outra de um estilo em que se misturava a faia -cremosa, adstringente, reconfortante -, ficámos a sentir-nos especialmente bem. “Consuma com moderação, porque pode ser extremamente viciante”, era o aviso bem-humorado queconstava da ementa. Esta frase provavelmente deveria estar estampada em cada garrafa de aguardente dinamarquesa.
TRUFAS NA CROÁCIA
por Alex Crevar
Nos bosques em torno de Livade, uma aldeia situada nas montanhas do centro-norte da Península da Ístria, na Croácia, o outono significa caça às trufas. Os cães avançam por entre folhas outonais e ramos de carvalho, ao longo de caminhos quase impercetíveis abertos por gerações anteriores, e conduzem os seus donos até às apreciadas iguarias brancas.
Estas trufas, que alguns consideram ter melhor sabor e aroma do que as suas primas mais famosas da região italiana do Piemonte, acabam frequentemente por chegar aos mercados e restaurantes de Livade, o centro das trufas do país. Se comparássemos as trufas brancas, que podem custar milhares de dólares por quilo, com os diamantes, poderíamos chamar a Livade a Antuérpia da Croácia. Apesar da população minúscula de 190 habitantes, estabelecida em torno de uma única rotunda com três restaurantes, é em Livade que têm lugar duas feiras de trufas durante o outono. Uma delas, os Dias do Tartufo do Zigante, começa em outubro, durante a época das trufas brancas. Ao longo de seis fins de semana, o festival proporciona demonstrações sobre a forma como procurar, comprar e cozinhar estes cogumelos subterrâneos da região.
Durante os festivais, com o aroma pungente e térreo das trufas no ar (noz, mel e alho são palavras muitas vezes usadas para descrever o seu cheiro), uma diversidade de peregrinos gastronómicos saboreiamnas cortadas por cima dos bifes, em massas cremosas, até em gelados; nada, segundo parece, escapa às trufas. Giancarlo Zigante, proprietário do restaurante que organiza o festival, é o rei informal das trufas da região, tendo já encontrado uma monstruosa trufa branca merecedora de registo no Guinness, com 1,3 quilos de peso e o tamanho de uma pequena abóbora.
Quando lhe perguntei se as trufas são afrodisíacas, como se costuma dizer, ele respondeu perentoriamente: “As trufas são o cheiro da minha vida.”
DAMASCOS NA ÁUSTRIA
por Kimberly Bradley
No inverno de 2008, experimentei pela primeira vez Wachauer Marille, designação que inclui diversas variedades de damascos cultivados apenas no vale de Wachau, na Áustria, aproximadamente a 65 quilómetros a noroeste de Viena. Tinha ido a uma loja chamada Wieser Wachau na aldeia de Dürnstein, onde, durante cerca de uma hora, provei aguardente, compota, cerveja amarga e chutney, produtos estes confecionados com fruta da região.
Segundo me disseram, era o clima – ameno de dia e frio à noite – que conferia a estes damascos a sua doçura particularmente suave. E, apesar de deliciosos sob a forma de conserva, para verdadeiramente apreciar os frutos havia que comê-los frescos no verão, quando se tornam a sensação local: toda uma semana de julho é dedicada à sua celebração; um trilho de caminhada foi concebido para conduzir os visitantes pelos pomares.
No entanto, precisei de esperar três anos até ter a oportunidade de experimentar o fruto fresco. Em julho, a avó de 92 anos do meu parceiro telefonou em pânico, porque o seu damasqueiro estava repleto de frutos maduros prestes a cair. Tínhamos de ir imediatamente para lhe dar uma ajuda na colheita. Meia hora depois, lá em cima nos ramos cheios de damascos, apanhei um exemplar perfeito -bastante macio e ligeiramente avermelhado – e dei-lhe uma dentada. Puro êxtase.
AÇAFRÃO EM FRANÇA
por Dan Saltzstein
Durante centenas de anos, o açafrão, a especiaria mais cara do mundo, era cultivado no Sul de França, juntamente com alfazema e videiras. No século XIX, porém, uma conjugação de geadas intensas e guerras levaram ao desaparecimento dessa cultura. Em 2003, François Pillet, hoje com 61 anos, e a sua mulher, Marie, 55 anos – ele é arquiteto, ela é decoradora – mudaram-se de Paris para a região de Vaucluse, na Provença, onde abriram L’Aube Safran, um hotel de cinco quartos cujo tema é o açafrão, perto da pequena cidade de Le Barroux.
O açafrão é uma especiaria difícil de caracterizar; o seu sabor é térreo, mas subtil – tem mais probabilidades de ser notado (quando esperado) pela sua ausência do que pela sua presença. E sem a sua cor homónima, o que seria de pratos como a paella e a bouillabaisse? No L’Aube Safran, contudo, o seu fascínio impõe-se de forma muito mais imediata: nos campos de cor púrpura que circundam a propriedade. Com vista para os impressionantes picos agrestes da cadeia montanhosa das Dentelles, o casal Pillet cultiva cerca de 200 mil plantas de açafrão, com as suas flores roxas (o açafrão é o estigma vermelho da flor e deve ser extraído manualmente). Toda a colheita proporciona apenas um quilo da especiaria,que pode ser vendida a centenas de dólares por onça (cerca de 28 gramas).
Por ocasião de uma visita a um amigo em Le Barroux, a minha mulher e eu visitámos o L’Aube Safran; felizmente para nós, era época da colheita, que decorre de outubro a novembro. Foi uma experiência inesquecível.
PRESUNTO DA FLORESTA NEGRA NA ALEMANHA
por Gisela Williams
Pensava que conhecia o presunto da Floresta Negra. Depois, saboreei o autêntico na Metzgerei & Wursterei Peter Dirr, uma pequena empresa familiar de comércio de carnes situada no coração desta região alemã e cuja fundação data de 1897. O presunto subtilmente fumado e tenro fez com que tudo o que eu já tinha provado na minha vida soubesse, em comparação, a algo semelhante a pastilha elástica. Aparentemente, o que eu estava a saborear era história. “Ainda o fazemos como o faziam há cem anos”, disse Markus Dirr, filho de Peter, chef com formação internacional que regressou ao país há 15 anos, para deixar a sua marca na empresa familiar.
Embora se possa encontrar presunto da Floresta Negra em todo o mundo, há algo de especial no facto de o saborear nesta região do sudoeste da Alemanha. Em parte, isso acontece porque a família conserva a sua técnica secular. Enquanto me mostrava as salas de defumação subterrâneas na sua pequena fábrica, Dirr explicou o meticuloso processo usado – os presuntos são defumados repetidamente durante dois dias e depois ficam a secar durante outros dois dias.
A fábrica também serve como uma espécie de ateliê, onde Dirr faz experiências com uma variedade de presuntos secos por ele curados com especiarias exóticas, por exemplo cominhos e sementes de papoila. Foram essas experiências de charcutaria que levaram os gastrónomos alemães a considerarem Dirr como o Ferran Adrià dos talhantes. Na verdade, os seus presuntos são tão cobiçados na Alemanha que ele os distribui por todo o país e trabalha com muitos chefs da região que obtiveram estrelas Michelin.
O seu desafio mais recente foi lançado pelo chef alemão Günther Seeger, residente nos Estados Unidos, para criar a suprema bratwurst, um tipo de salsicha alemã. Dirr está à altura do desafio. “Ideias não me faltam”, afirmou.
PÃO COM MANTEIGA EM PARIS
por Oliver Strand
Embora o voo noturno de Nova Iorque até Paris raramente seja relaxante -muito curto para uma noite inteira de sono, demasiado longo para apenas uma refeição e um filme -, sinto-me reconfortado por saber que, pouco tempo depois da aterragem, irei comer pão com manteiga. E não um pão com manteiga qualquer. Primeiro, dirijo-me à Du Pain et des Idées, uma padaria no 10.º Arrondissement, hoje na moda, e compro um pedaço de pain des amis, um pão estaladiço de estilo rústico com um sabor ligeiramente amargo. A massa fica a fermentar durante a noite e é cozida sob a forma de pães largos com a espessura de um pesado edredão de inverno. Depois, vou ao Breizh Café, uma creperia no 3.º Arrondissement, e compro 125 gramas de manteiga meio sal da Bordier, uma crémerie na Bretanha que faz as delícias de chefs com estrelas Michelin.
Paris pode ser imprevisível no que respeita a comida, tendo os restaurantes tantos êxitos como fracassos, mas um pedaço de pain des amis aberto e barrado com manteiga Bordier é uma opção segura. A comida é muito mais complicada do que isto, mas raramente se torna melhor.
COGUMELOS SELVAGENS EM BARCELONA
por Katie Parla
Em setembro e outubro, as bancas do Mercat de Santa Caterina, no bairro de La Ribera, em Barcelona, expõem montes de rovellons, nome dado a certos cogumelos da região. Constituem uma rara iguaria sazonal, quando chega o outono, e são colhidos nas vizinhas florestas da Catalunha. Dependendo do solo em que crescem, o seu sabor pode ser subtilmente amargo, azedo ou mesmo doce.
Tradicionalmente, são incluídos em omeletas ou salteados em azeite com alho e salsa. No outono passado, a minha mãe e eu cozinhámo-los em lume brando, para ficarem tenros. Um excelente petisco do outono catalão.