Assim proclamada pelo novo Presidente dos EUA, a nova Era Dourada em muito choca o observador atento. Mais que a negação do mais simples e básico humanismo, o rol de ordens executivas assinadas por Trump no seu primeiro dia demonstram um radical corte com o que criou esse grande país: a liberdade que tanto atraiu gente como os avós do bilionário, agora trasvestido em Presidente ultra protecionista e paladino da luta contra a imigração, ou a sua eslovena esposa.
Os tempos que vivemos, com fluxos migratórios muitíssimo grandes, pede respostas e políticas que não fechem os olhos perante o problema. Ele existe e a prova de que tem de ser enfrentado é o facto de a questão se ter transformado quase exclusivamente em material da extrema-direita.
Contudo, a brutalidade e a insensibilidade na abordagem ao problema por parte de Trump e dos seus sequazes, implica que nos choquemos e procuremos forças e alimento naquilo que nos pode recentrar na busca de soluções que estejam do lado certo da História.
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Emma Lazarus, em finais do século XIX, numa época em que os EUA se debatiam também com imensas levas de refugiados e de migrantes, escrevia um texto que algum tempo depois foi escolhido para estar inscrito na base da Estátua da Liberdade.
Diz Emma Lazarus, uma judia descendente de cristãos-novos da Beira Alta portuguesa:
Não como o gigante bronzeado de grega fama, Com pernas abertas e conquistadoras a abarcar a terra Aqui nos nossos portões banhados pelo mar e dourados pelo sol, se erguerá Uma mulher poderosa, com uma tocha cuja chama É o relâmpago aprisionado e seu nome Mãe dos Exílios. Do farol de sua mão Brilha um acolhedor abraço universal; Os seus suaves olhos Comandam o porto unido por pontes que enquadram cidades gémeas. “Mantenham antigas terras sua pompa histórica!” grita ela Com lábios silenciosos “Dai-me os seus fatigados, os seus pobres, As suas massas encurraladas ansiosas por respirar liberdade O miserável refugo das suas costas apinhadas. Mandai-me os sem abrigo, os arremessados pelas tempestades, Pois eu ergo o meu farol junto ao portal dourado.”
Entre resignação, a incapacidade de olhar mais longe, e os medos de cada momento, sabe bem olhar para o alcance destas palavras, materializadas numa estátua que representa, ela mesma, um coletivo que viu na imensidão das desgraças de cada um a oportunidade para que todos avançassem e se libertassem.
Mesmo quando a Liberdade nos obriga a pensar a liberdade de cada um, somos obrigados ao confronto com o que de atual este poema tem…
Os números do Polestar 3 impressionam. Na versão ensaiada, são quase 500 cavalos de potência, um binário esmagador, bateria com mais de 100 kWh de capacidade e dimensões muito generosas. Comecemos por esta última característica: as rodas grandes e as linhas desportivas ajudam e esconder que este é um carro com 4,9 metros de comprimento e, ainda mais expressivo, 2 metros de largura. O que também significa que o espaço interior é amplo, em qualquer um dos lugares. Até porque este Polestar é baseado numa plataforma exclusiva para carros 100% elétricos, a SPA2, também utilizada pelo Volvo EX90. O que, como já sabemos, permite um maior aproveitamento do espaço interior. A habitabilidade é reforçada por bancos bem conseguidos e acabamentos interiores convincentes. Mas não é para quem gosta de ‘rococós’ já que, como é típico da marca e da origem Volvo, o interior segue as típicas ideias do minimalismo escandinavo.
A tração integral e a possibilidade de aumentar a altura da suspensão permitem passeios fora de estrada
Muito rápido, mas pouco desportivo
A aceleração é o primeiro ponto que impressiona. Os dois motores elétricos desta versão ‘colam-nos’ ao banco e catapultam o SUV de 0 a 100 km/h em apenas 5 segundos. As recuperações são igualmente vigorosas, permitindo ultrapassagens seguras e desembaraçadas. A velocidade máxima está limitada a 210 km/h, mas a sensação de velocidade é amplificada pelo silêncio a bordo.
Apesar do peso (mais de 2,5 toneladas) e das dimensões generosas, o Polestar 3 surpreendeu-nos pela agilidade. O SUV demonstrou um comportamento dinâmico em curva, graças ao sistema de vetorização de binário e à tração integral. A suspensão, com afinação confortável, filtra bem as irregularidades da estrada, mas permite algum adornar da carroçaria em condução mais desportiva. A direção é precisa, mas falta-lhe ‘feedback’, aquela ligação entre o condutor e a estrada que nos faz sentir o que se passa com as rodas. Ainda no que diz respeito à suspensão, é possível aumentar a altura do carro para, por exemplo, facilitar a passagem por zonas alagadas ou ultrapassar outros obstáculos. Esta capacidade em conjunto com a tração integral até permitem lidar com situações fora de estrada. O que verificámos já que, durante os dias de teste, acabámos por ter de sair de uma situação em que, num terreno agrícola, uma chuva repentina e forte transformou uma estrada de terra batida numa estrada de lama. Outros carros ficaram presos, mas o Polestar 3 saiu da situação sem dificuldades.
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No geral, o Polestar 3 conduz-se bem. É um carro competente, seguro e previsível. Mas não transmite a emoção que se poderia esperar de um SUV com este nível de potência. Falta-lhe caráter, ‘alma’ É como se a Polestar tivesse privilegiado demasiado o conforto e a eficiência, esquecendo-se da vertente desportiva que tanto promete. De outro modo, parece-nos um… Volvo.
Demasiados bugs
O Polestar 3 é um ‘concentrado’ de tecnologia. O sistema operativo Android Automotive oferece uma experiência de utilização intuitiva e fluida, com integração nativa de aplicações Google como o Google Maps e o Assistente Google, que está cada vez mais inteligente. Ainda mais importante, este sistema dá acesso a muitas apps através da Play Store. O ecrã central de 14,5 polegadas tem uma excelente qualidade de imagem e o sistema de som Bowers & Wilkins com 25 colunas proporciona uma experiência sonora de alta-fidelidade.
O sistema de infoentretenimento com base no sistema operativo da Google é do melhor que já vimos…. Se não fossem os bugs. É esta a razão da nota Fraco no Tome Nota – se não fossem os bugs, a nota para o infoentretenimento seria Excelente
Mas esta montra tecnológica é ofuscada por falhas graves e inaceitáveis num carro desta gama. Durante os testes, o sistema de infoentretenimento entrou em ‘blackout’ por três vezes, deixando-me às escuras – literalmente. Sem ecrã central, sem painel de instrumentos, sem controlo do ar condicionado e sem qualquer informação sobre o estado do carro. É de assinalar que estas falhas aconteceram após carregamentos em casa, uma delas após uma atualização de software. A solução foi fazer um reset ao sistema, o que se consegue mantendo pressionado o botão de controlo multifuncional, disponível na consola central, durante uns bons 30 segundos.
Mas estes não foram os únicos problemas. A ligação integrada de dados móveis (5G) deixou de funcionar várias vezes, impedindo-nos de usar a navegação com informação de trânsito em tempo real. O Head Up Display também ‘desapareceu’ durante uma viagem, para reaparecer depois de uma paragem.
Estas falhas são simplesmente inaceitáveis num carro que custa quase cem mil euros. A Polestar tem de resolver estes problemas com urgência, sob pena de comprometer a credibilidade deste modelo e da própria marca.
Prós Design minimalista funcional – Autonomia real superior a 500 km – Prestações e comportamento previsível – Sistema de infoentretenimento Google
Este é um carro devorador de eletrões. Não conseguimos ver o computador de bordo a mostrar um consumo médio abaixo dos 20 kWh/100 km. E em autoestrada, não é preciso exagerar na velocidade para ver médias acima dos 30 kWh/100 km. Não podemos dizer que seja surpreendente considerando as especificações, com destaque para o peso e largura dos pneus. Mas, ainda assim, seria bom que a Polestar se preocupasse um pouco mais com os consumos.
Carregamento ultrarrápido? Sim, mas só em postos capazes de fornecer potências elevadas usando a arquitetura de 400 volts. Em muitos postos ultrarrápidos da rede pública, a potência máxima só é obtida com 800 volts, arquitetura que não é suportada pelo Polestar 3
O Polestar 3 Long Range Dual Motor está equipado com um carregador de bordo de 11 kW em corrente alternada (AC), o que permite carregar totalmente a bateria em 11h30 quando a usar uma wallbox trifásica de 11 kW ou um posto de carregamento lento. Em carregamentos rápidos, a potência máxima é de uns impressionantes 250 kW, mas a média já não é tão impressionante: medimos cerca de 150 kW de média em carregamentos entre 10 e os 80% (32 minutos). Atenção que este carro utiliza uma arquitetura de bateria de 400 volts, pelo que em muitos postos ultrarrápidos, que só atingem as potências mais elevadas quando a usar 800 volts ou mais, a potência de carregamento máxima real pode cair para metade. Considerando o segmento do Polestar 3, seria de esperar suporte para 800 volts, tecnologia cada vez mais comum, mesmo em segmentos de preços inferiores.
Diamante por lapidar
O Polestar 3 Long Range Dual Motor é um SUV elétrico com um potencial enorme. Tem um design atraente, uma autonomia generosa, um desempenho competente e tecnologia de ponta. Mas as falhas tecnológicas e a falta de caráter na condução impedem-no de se afirmar como uma verdadeira referência no segmento.
Tome Nota Polestar 3 Long Range Dual Motor– Desde €91.700
Autonomia Muito bom Infoentretenimento Fraco Comunicações Muito bom Apoio à condução Bom
Características Potência e binário 360 kW, 840 Nm ○ Acel. 0-100 km/h: 5 s ○ Vel. máx. 210 km/h ○ Bateria: 111 kWh (107 kWh usáveis) ○ Autonomia WLTP 636 km ○ Potência de carregamento: 11 kW em AC e 250 kW em DC ○ 2,120×1,614×4,900 m (LxAxC)
Os jornais diziam há dias, com espanto, que a Igreja, entenda-se igreja católica (ICAR), não foi convidada para a abertura do ano judicial, e sublinhavam que esta situação era inédita na “laicidade do Estado”.
O Público ainda teve a clarividência de avançar que a decisão tinha sido tomada por unanimidade pelo presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), pelo procurador-geral da República (PGR) e pela bastonária da Ordem dos Advogados (AO), sendo todos eles católicos, talvez para evidenciar que não se tratará de qualquer luta político-religiosa. Mas o Expresso preferiu ocultar esta informação. O título daquele semanário era: “Abertura do ano judicial pela primeira vez sem representantes da igreja católica”, o que sugere confusão onde não parece haver nenhuma.
Quando questionado, o STJ esclareceu que “não irão estar presentes, porque não foi convidada nenhuma entidade eclesiástica de qualquer religião”, e aproveitou para explicar os convites aos representantes das Forças Armadas devido ao facto de existirem juízes militares em funções naquele tribunal.
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A ICAR disse não querer comentar, confirmando a ausência de qualquer convite, mas manifestou desconforto com a nova situação (o que se compreende) não deixando de dar uma “bicada”, pois declarou que tal situação vinha “ao contrário do que acontecia, de acordo com uma longa tradição”. Só que Portugal é um estado de direito e não um “estado de tradição”. A lei vigente retirou há muito aos organizadores de cerimónias oficiais a obrigatoriedade de convidar uma autoridade eclesiástica católica para se fazer representar nas mesmas, em linha com o espírito da constituição e os princípios do estado laico.
Por que razão há-de o bispo duma diocese de estar obrigatoriamente presente com lugar de destaque numa cerimónia civil? E porque não os outros líderes religiosos? Se a constituição portuguesa é tão clara em matéria de não discriminação religiosa, por que razão se haveria de persistir justamente numa discriminação tão evidente? Se a Lei de Liberdade Religiosa segue a mesma linha, por que motivo o Estado haveria de continuar a proclamar liberdade e a negar a sua prática pelas mais altas instâncias?
Desde quando é que a tradição tem valor legal? As próprias instituições religiosas mudam as suas tradições antigas todos os dias, incluindo a ICAR. Um estado de direito não se guia por uma tradição, longa ou não, mas pela legislação que o rege. E a legislação não obriga a tais convites.
Portanto, se os organizadores agiram estritamente dentro da lei, como seria de esperar, porquê o espanto? Também é verdade que a lei não impede que se façam tais convites protocolares, mas já não por imposição legal.
O estado laico é uma conquista democrática e sem ele não existe liberdade religiosa. Bem sei que a notícia é quando o homem morde o cão, mas a comunicação social não tem mais nada de importante a realçar na cerimónia de abertura do ano judicial senão o facto de o representante do patriarcado de Lisboa não ter sido convidado para uma cerimónia, quando não tinha que o ser?
Há notícias que dificilmente se entende porque o são, em especial quando as instituições cumprem escrupulosamente a lei. A não ser que se queira inventar uma questão religiosa onde ela não existe.
O facto de o estado ser laico não significa que a sociedade o seja, por que não é. Mas isto nada tem que ver com os extremismos do laicismo. A laicidade defende a neutralidade e a não confessionalidade do Estado, justamente para não introduzir distorções no campo religioso e não colocar em causa a liberdade religiosa.
Mas o laicismo é outra coisa, implica que o Estado assume uma ideologia hostil à religião. Ora, não é disso que se trata aqui, mas, pelo contrário, da afirmação da neutralidade do Estado face às religiões, como deve ser. Por isso é de saudar a decisão do STJ, da PGR e da OA na afirmação pública da laicidade do Estado e da liberdade religiosa, no respeito para com todo o campo religioso.
Que as outras entidades públicas lhes sigam os passos.
Vítor Bruno é a mais recente vítima de um hábito muito comum no futebol, sobretudo no que se joga neste retângulo à beira mar plantado. Quando as coisas não estão a correr bem, despede-se o treinador e tenta-se a tão conhecida “chicotada psicológica”. O problema é que, na esmagadora maioria das vezes, o expediente não resulta, como já se percebeu no passado e se vai voltar a verificar esta temporada, na qual, há 18ª jornada, já se verificaram 12 trocas de treinadores (inclusive, e pela primeira vez, nos três grandes) e, no fim, só uma equipa será campeã.
Pedro Afonso tinha 13 anos quando o seu pai, José Afonso, já bastante debilitado pela doença incurável que o massacrava, subiu ao palco do Coliseu dos Recreios, em Lisboa, para um concerto histórico. Essa noite de 29 de janeiro de 1983 ficou na memória de todos os que encheram a grande sala lisboeta, sabendo que participavam numa espécie de despedida. Pedro estava bem habituado a acompanhar o pai em espetáculos (e a sua voz de criança até se pode ouvir na faixa Maravilha, Maravilha, do disco Enquanto Há Força, de 1978), mas essa noite também lhe deixou uma memória única: “Mesmo para um pré-adolescente, percebia-se bem que aquele momento era especial, o ambiente impressionava, entre o eletrizante e o emotivo…”
Zeca Afonso no Coliseu de Lisboa, a 29 de janeiro de 1983. (Foto: Joaquim Lobo)
Quarenta anos depois, foi a essa noite que regressou para homenagear o pai e assinalar os 50 anos do 25 de Abril, olhando para o futuro e apostando na vitalidade e na energia dessas velhas canções. Na verdade, a ideia até partiu de Nuno Saraiva, o editor que, ao lado de Pedro, em representação da família de José Afonso, tem promovido nos últimos cinco anos uma reedição sistemática da discografia do músico nascido em Aveiro em agosto de 1929. “Foi o Nuno que me desafiou para este projeto, tentando marcar a diferença na reinterpretação de músicas do meu pai, partindo desse concerto histórico.”
Pedro pôs uma condição: tudo tinha de começar ali, na cidade da Horta, ilha do Faial, Açores, onde reside há cerca 30 anos. “Sinto que a ilha, que conheço bem, até pela minha experiência aqui como agente cultural, no teatro amador e não só, tem uma mais-valia na aproximação de pessoas, na criação de um ambiente de companheirismo criativo, e provoca uma relação única com a Natureza.”
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Rapidamente, a prioridade passou a ser a escolha dos músicos envolvidos nessa aventura atlântica. “A influência africana, mas presente de uma forma moderna e descomplexada, era uma das premissas assumidas, assim como uma aposta em músicos mais jovens, que veem no meu pai, com quem nunca conviveram, uma referência, seguramente musical, e nalguns casos mais do que isso, também cívica.”
O Faial tem uma mais-valia na aproximação de pessoas, na criação de um ambiente de companheirismo criativo
Pedro Afonso
O músico faialense Pedro Lucas – que se afirmou, em 2010, com o projeto O Experimentar Na M’Incomoda, revisitando e recriando a música tradicional açoriana, e faz parte da dupla Medeiros/Lucas – acabou por funcionar como curador nessa primeira fase, ajudando a encontrar os músicos certos para estes novos Cantares do Andarilho, a que chama “um coletivo, uma constelação”. Daí saiu a escolha de um diretor musical: o moçambicano Tiago Correia-Paulo, que tem trabalhado em diversas bandas sonoras e gosta de explorar um lado experimental como compositor e multi-instrumentista.
Certo é que, em abril de 2024, exatamente meio século depois da revolução dos cravos, um grupo de músicos que nunca antes tinha trabalhado em conjunto aterrou na ilha do Faial para uma residência artística de cerca de duas semanas que terminaria num concerto para apresentar, no Teatro Faialense, o trabalho realizado.
Além de Tiago e de Pedro Lucas (Pedro Afonso era o anfitrião, sempre presente, disponível para debater ideias e ajudar, mas sem intervenção direta na criação musical), os artistas que compõem o coletivo Wanderer Songs/Cantares do Andarilho são os Lavoisier (Roberto Afonso e Patrícia Relvas), Selma Uamusse, Augusto Macedo, Diogo Sousa, Nástio Mosquito e Vic Pereiró (estes dois últimos contribuindo sobretudo para o lado visual do projeto, que inclui projeções durante os concertos), o asturiano Nacho Vegas funciona como uma espécie de convidado especial (canta, de forma inconfundível, a clássica Canção de Embalar) e no futuro poderá haver outros nomes a associarem-se, com esse estatuto, ao grupo.
Da esquerda para a direita: Augusto Macedo, Diogo Sousa, Roberto Afonso, Patrícia Relvas e Nacho Vegas (atrás), Tiago Correia-Paulo, Selma Uamusse e Pedro Lucas (à frente). Foto: DR
Desassossego
A ideia inicial era fazer versões, por ordem, de todas as canções do alinhamento do concerto histórico de 1983. Mas, com o avançar do processo, foram feitas outras opções. “Conversámos bastante sobre o assunto e houve músicas que achámos que fazia sentido reinterpretar nos dias de hoje, por exemplo Os Fantoches de Kissinger, que nem é das músicas mais conhecidas do meu pai, mas sentimos que, falando do imperialismo dos EUA, tem bastante atualidade”, recorda Pedro Afonso, lembrando, ainda, que rapidamente concluíram que tocar todas as canções do concerto de 1983 iria resultar num espetáculo demasiado longo.
Ao longo deste processo, perguntei-me muitas vezes o que estaria a fazer o Zeca no contexto musical atual
Tiago Correia-Paulo
Nos dias atarefados da residência artística (“Foram muito intensos”, recorda Pedro Lucas, “passámos muito tempo juntos naquele teatro, muitas vezes nem saíamos para as refeições”), Tiago Correia-Paulo assumiu a tarefa que lhe tinha sido atribuída: dirigir aquela espécie de nova orquestra, em nome das canções de José Afonso. Curiosamente, entre todos, o músico moçambicano seria o que menos teve contacto com a obra do autor de Grândola, Vila Morena ao longo da vida. “Cresci a saber quem era o Zeca Afonso e aquilo que ele representava, mas tenho de confessar que não estava muito a par da sua discografia, salvo alguns temas, como a Grândola, Venham Mais Cinco e outros dos clássicos”, conta-nos, por email, a partir de Maputo, a sua cidade, que vive dias turbulentos desde as eleições de outubro.
O concerto na Horta, Faial, a 19 de abril de 2024, que deu origem ao primeiro disco do coletivo Wanderer Songs/Cantares do Andarilho. Foto: DR
“Quando este processo começou, passei semanas e semanas trancado no meu estúdio a consumir compulsivamente o cancioneiro do Zeca. Passado algum tempo, comecei a entender algo que transcendia a música e que penso que se relacionava mais com a pessoa, o seu estilo de composição e, talvez, o sítio especial a partir do qual ele escrevia. Quando comecei a relacionar-me com esse sítio, encontrei o lugar criativo para começar a reinterpretar algumas das músicas. Quis adicionar-lhes uma espécie de modernidade, afrocentrismo e experimentação – talvez até um pouco de audácia, arriscar um pouco. Ao longo deste processo, perguntei-me muitas vezes o que estaria a fazer o Zeca no contexto musical atual, e o que me surgia sempre mais naturalmente era imaginá-lo rodeado de jovens e novas sonoridades, a guiar-nos para fazer algo semelhante ao que estamos a fazer agora.”
Essa intuição bate certo com várias declarações do próprio José Afonso, sobretudo nos últimos anos de vida. “O que é preciso é criar desassossego, quando começamos a procurar álibis para justificar o nosso conformismo, então está tudo lixado!”, disse em entrevista ao jornalista Viriato Teles. Pela mesma altura, a uma publicação juvenil afirmou que preferia atuar para “a malta” de 15 ou 16 anos do que para o seu público habitual, com quem tinha “afinidades de ordem ideológica, política, de visões de vida”.
Selma Uamusse, cantora moçambicana que vive em Portugal desde 1988, também participa no projeto. Foto: DR
Musicalmente, Tiago valorizou bastante a africanidade que há na música de José Afonso (que viveu vários anos em Moçambique, na infância e na idade adulta): “Foi a partir dessa ligação que o Zeca teve com Moçambique que nasceu a arquitetura e base deste projeto para mim. Esse género de proximidade dele com o universo que mais conheço, e reconheço, deu-me muitas pistas sobre o que fazer e como fazer. Pesquisei muito sobre o período em que o Zeca esteve em Moçambique; imaginá-lo aqui, durante um dia de calor e humidade, sentado numa varanda com uma guitarra acústica ao colo à procura de palavras que rimassem, foi um catalisador para o meu espaço e o meu processo criativo. Por exemplo, no Venham Mais Cinco e n’O Que Faz Falta quis trazer um pouco da marrabenta moçambicana, um dos nossos géneros mais icónicos e celebrados; lembro-me ainda de que quando o talentoso Augusto Macedo, nosso baixista e teclista, começou a tocar m’bira, um instrumento do Sul de África e, consequentemente, de Moçambique, na tentativa de adicionar algo à A Morte Saiu à Rua, houve algo que imediatamente despertou em mim.”
Mas Zeca também o fez voar e estilhaçar fronteiras: “Gosto de misturar mundos, e acho sempre interessante convencer os músicos com quem trabalho a fazerem algo semelhante. Por exemplo, sabia que queria interpretar os Vampiros como se fosse um cover feito por Fela Kuti – há algo de muito semelhante nas letras de ambos, na própria forma de sátira política”, diz Tiago. “Já no Redondo Vocábulo aquilo que me surgiu foi misturar algo bem ocidental e moderno com algo vintage e africano, um género de composição com polirritmos africanos e guitarras à la White Stripes.”
No fundo, como diz Pedro Lucas, “o Zeca tornou-se um símbolo e uma referência cultural; e as referências, precisamente por serem abrangentes e transversais, têm essa capacidade de ser apropriadas e personalizadas individualmente, têm essa maleabilidade”.
O resultado destas leituras e apropriações, quase 38 anos depois da morte do músico, pode ser ouvido nos concertos marcados para esta semana (Casa da Música, no Porto, nesta quarta, 22, e Tivoli, em Lisboa, na quinta, 23), assim como no disco gravado ao vivo na Horta em abril do ano passado e que ficará disponível no próximo dia 24.
A ideia deste coletivo é continuar, e “animar a malta” em novas gravações e concertos nos palcos de todo o mundo.
Wanderer Songs/Cantares do Andarilho > Casa da Música, Porto > 22 jan, qua 21h30 > €20 > Tivoli BBVA, Lisboa > 23 jan, qui 21h > €10 a €20
Um novo estudo científico realizado por uma equipa de investigadores da Universidade de Edimburgo e do King’s College de Londres, no Reino Unido, identificou dezenas de novos genes e variações genéticas associadas à depressão. Para a investigação, publicada recentemente na revista científica Cell, foi utilizada uma amostra populacional grande, com dados de 5 milhões de pessoas – de 29 países – das quais um quarto era de ascendência não europeia.
Os investigadores foram capazes de identificar, ao todo, 697 variações genéticas relacionadas com o desenvolvimento da depressão, das quais 293 nunca tinham sido associados a esta condição. Estas variações genéticas estavam sobretudo ligadas a neurónios, em várias regiões do cérebro, incluindo áreas de controlo das emoções. Foi ainda possível identificar 308 genes específicos associados a um maior risco de desenvolvimento de depressão.
Até agora, as investigações científicas que associavam as variações genéticas à depressão envolveram amostras com menor representação da sociedade. De acordo com os cientistas, a presença no estudo de pessoas com ascendência africana, do leste asiático, hispânica e do sul da Ásia foram determinantes para identificar parte das variações genéticas anteriormente desconhecidas, cerca de 100 das 293. “Estudos maiores e mais representativos globalmente são vitais para fornecer os ‘insights’ necessários para desenvolver terapias novas e melhores, e prevenir doenças em pessoas com maior risco de desenvolver a condição”, explicou Andrew McIntosh, um dos principais autores do estudo, ao The Guardian.
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Para a investigação foi ainda testada a eficácia de mais 1 600 medicamentos – incluindo antidepressivos, a Pregabalina (utilizado para a dor crónica) e o Modafinil (na narcolepsia) – sobre esses genes e se os mesmos poderiam ser utilizados para o tratamento da depressão.
Os autores do estudo acreditam que as descobertas permitirão, no futuro, previsões mais exatas sobre o risco de depressão e o desenvolvimento de formas de tratamento mais diversificadas.
A notícia das buscas foi avançada pelo Público, dava conta de que em causa estão vários crimes de furto qualificado. Fonte policial avançou à Lusa que Miguel Arruda é suspeito de ter furtado malas dos tapetes de bagagens das chegadas dos aeroportos de Lisboa e de Ponta Delgada quando viajava de e para os Açores no início e no final da semana de trabalhos parlamentares.
Segundo a PSP, o deputado do Chega não foi detido, sendo necessário o levantamento da imunidade parlamentar.
O presidente do Chega, André Ventura, já reagiu dizendo que vai exigir explicações e que deverão ser “retiradas consequências se essas explicações não foram satisfatórias”. Não vai haver um milímetro de cedência e vamos exigir as mesmas regras que exigimos para os outros, independentemente de ser ou não um deputado do Chega”, garantiu Ventura.
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“É exigível que sejam dadas explicações e que sejam retiradas consequências se essas explicações não foram satisfatórias. Não vai haver um milímetro de cedência e vamos exigir as mesmas regras que exigimos para os outros, independentemente de ser ou não um deputado do Chega”, sublinhou André Ventura.
A Cegid, empresa europeia especializada em ferramentas de gestão empresarial na cloud, anunciou nesta terça-feira a aquisição da tecnológica portuguesa PHC Software, num movimento estratégico para fortalecer a presença em Portugal, Espanha e África lusófona. Com esta operação, a Cegid visa acelerar o crescimento no mercado de software de gestão para pequenas e médias empresas (PME), um segmento em forte expansão na Europa.
Com sede em Oeiras, a PHC Software é um nome destacado no mercado português desde 1989, fornecendo soluções tecnológicas a mais de 37 mil empresas e apoiando 170 mil utilizadores na região ibérica e África.
Mudança na liderança da PHC
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Ricardo Parreira, fundador da PHC Software, descreveu a venda como “estratégica para o futuro da PHC”, lê-se no comunicado de imprensa divulgado. Após liderar a empresa durante décadas, Ricardo Parreira decidiu deixar o cargo para se dedicar a novos projetos. O novo diretor-geral da PHC será João Sampaio, que anteriormente liderava a unidade de negócios internacionais da tecnológica portuguesa.
“É uma honra assumir esta posição e dar continuidade ao legado de excelência da PHC. Juntarmo-nos à Cegid permitirá consolidar o nosso portfólio e aproveitar novas tecnologias, como a Inteligência Artificial Generativa, para impulsionar a nossa oferta e satisfazer ainda mais os nossos clientes e parceiros”, afirmou João Sampaio.
A integração da PHC na Cegid será imediata, com João Sampaio e a equipa a reportarem diretamente a Javier Torres Ramirez, diretor-geral da Cegid para a Ibéria, América Latina e África lusófona. Pascal Houillon, diretor executivo da Cegid, destacou que a PHC se alinha perfeitamente com os objetivos da empresa, e anunciou a mobilização do Centro de Excelência em Inteligência Artificial, localizado em Braga, para suportar esta expansão.
“A PHC Software reforça a nossa posição como líder na região ibérica e na Europa, particularmente no segmento das PME. Esta aquisição traz sinergias significativas e permitirá oferecer ainda mais valor aos nossos clientes, combinando inovação tecnológica com uma equipa experiente e dedicada”, afirmou Houillon.
Aquisições estratégicas recentes
A aquisição da PHC integra uma estratégia de expansão mais ampla da Cegid, que recentemente adquiriu a EBP em França, a Microdata em Espanha, e estabeleceu um acordo de exclusividade para a compra da Sevdesk na Alemanha.
Com esta operação, a Cegid continua a consolidar a sua posição como uma das principais empresas de software de gestão na Europa, apostando no crescimento sustentável e no apoio à transformação digital das PME.
A Europol pretende reavivar a pressão sobre as empresas tecnológicas para que estas cooperem com as autoridades no desbloqueio de mensagens encriptadas. A diretora executiva da Europol, Catherine De Bolle, considera que a falta de acesso a este tipo de comunicação compromete investigações criminais e ameaça a democracia europeia. A questão será um dos temas centrais nas reuniões que a Europol terá com representantes das grandes tecnológicas durante o Fórum Económico Mundial, que decorre esta semana em Davos, na Suíça.
O uso de encriptação de ponto a ponto em plataformas de mensagens, como WhatsApp, Signal e iMessage, tem gerado tensões entre forças de segurança, governos e as empresas de tecnologia. Para as autoridades, esta tecnologia dificulta a obtenção de provas em investigações, uma vez que impede o acesso às mensagens enviadas por suspeitos de crimes. Por outro lado, as empresas tecnológicas defendem que enfraquecer a encriptação compromete a privacidade e a segurança de milhões de utilizadores.
De acordo com o jornal britânico Financial Times, a diretora da Europol afirma que “o anonimato não é um direito fundamental. Quando temos um mandado de busca e estamos diante de uma casa trancada, sabendo que o criminoso está lá dentro, a população não aceitará que não possamos entrar”, fazendo uma comparação com a situação das mensagens encriptadas nas plataformas digitais. Assim como não se aceita que as autoridades não possam entrar numa casa com um mandado, também não deveria ser aceitável que as investigações sejam bloqueadas pelo acesso a comunicações protegidas, defende.
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No ano passado, chefes das polícias europeias apelaram a governos e empresas para que encontrassem soluções que garantissem a eficácia das investigações sem pôr em causa os direitos fundamentais das pessoas. No entanto, propostas legislativas, como a de combate de conteúdos online de abuso sexual infantil, continuam bloqueadas em alguns países da União Europeia, incluindo a Alemanha, devido a preocupações com a privacidade.
Inteligência Artificial e novas ameaças
A Europol também está a explorar o uso de Inteligência Artificial para otimizar investigações e monitorizar novas formas de ameaça, como as chamadas “ameaças híbridas”. Entre estas, incluem-se alegações recentes de sabotagem de infraestruturas por estados estrangeiros, como o corte de cabos submarinos no Mar Báltico. No entanto, a legislação atual impede a Europol de investigar crimes atribuídos a estados soberanos que não pertençam à União Europeia (UE), sendo necessário um novo enquadramento legal para ampliar o seu mandato.
Resultados alcançados e colaborações internacionais
Nos últimos anos, a Europol destacou-se em investigações como a descodificação de mensagens encriptadas nas plataformas EncroChat e Sky ECC, utilizadas por redes criminosas. Estas operações resultaram em milhares de detenções e processos judiciais, incluindo o maior julgamento criminal da história da Bélgica, que levou à condenação de mais de 100 pessoas.
A agência, que duplicou o número de funcionários desde 2018, mantém colaborações estreitas com países fora da União Europeia, como o Reino Unido e os Estados Unidos. No último ano, foi peça-chave na desativação do grupo de ransomware LockBit, em parceria com o FBI e o Departamento de Justiça norte-americano.
A Europol publicará em março o relatório quadrienal sobre crime organizado na UE.