Sentir tristeza ao longo da vida é inevitável. Porém, há uma diferença muito grande entre estarmos tristes e sermos atirados para um estado depressivo que faz a vida parecer uma infindável, lenta e dolorosa sucessão de acontecimentos em relação aos quais nem temos forças para reagir.
Quando estamos deprimidos, mais do que sentimentos de tristeza transitórios em relação a eventos da nossa vida, temos, nas palavras da psicóloga Ruth Ministro, “uma perturbação do humor que afeta negativamente a forma como pensamos, como nos sentimos e como agimos”.
As perturbações depressivas são consideradas um grave problema de saúde no século XXI, atingindo cerca de 264 milhões de pessoas em todo o mundo
Sentimos tristeza ou temos vontade de chorar sem motivo aparente, perdemos interesse por atividades que anteriormente nos davam prazer, sentimo-nos cansados, sem vontade de fazer nada, criticamo-nos constantemente, temos problemas de concentração e lapsos de memória frequentes, dores de cabeça, de costas ou de estômago sem haver uma causa física e, no limite, podemos mesmo chegar aos pensamentos sobre a morte, idealizando-a como única saída para acabar com a angústia.
“A depressão é um distúrbio que pode afetar tudo o que uma pessoa faz na sua vida diária, interferindo com os estudos, a carreira, os relacionamentos e a saúde”, conclui a psicóloga Carla Oliveira.
“Tive uma doente que, apesar de ter duas licenciaturas, deixou de se lembrar como é que se tomava banho”, conta Inês Bandeira e Cunha, psiquiatra do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa. “O cérebro fica lento, com alterações da memória e dificuldades de raciocínio, que impedem a execução das diversas subtarefas até ao fim”, explica.
As causas desta tristeza profunda são alvo de cada vez mais investigação, até porque, segundo a Organização Mundial da Saúde, as perturbações depressivas são consideradas um grave problema de saúde no século XXI, atingindo cerca de 264 milhões de pessoas em todo o mundo.
Como sublinha o diretor da Unidade de Neuropsiquiatria da Fundação Champalimaud, Albino Maia, “há cada vez mais evidência a sustentar que a depressão e grande parte de outras patologias psiquiátricas não são doenças de um determinado sítio, mas sim de um sistema, de uma rede que, no caso da depressão, é a mesma que está envolvida na regulação das emoções positivas, do sono e da alimentação”.
Afinal, como funciona esta doença que, nas palavras de Ruth Ministro, “resulta de uma combinação de fatores genéticos, biológicos, psicológicos e ambientais”?
Como funciona um cérebro deprimido
A resposta é difícil e muito complexa. “O facto de existirem imensas hipóteses para o mesmo problema significa que temos de assumir a enorme complexidade do fenómeno da doença mental, de que a depressão é um exemplo, e pensar nele como um fenómeno que não existe apenas a nível biológico”, afirma Albino Maia.
O neuropsiquiatra sublinha que a construção que se faz, do ponto de vista médico, do que é uma depressão, “é uma construção biológica, mas também uma cultural, social e económica”. Ou seja, é verdade que, tal como estamos todos em risco de cair e partir um braço, encontramo-nos todos expostos a eventos de vida mais ou menos adversos, os chamados stressores, que podem espoletar uma depressão.
Porém, isto não quer dizer que toda a gente que passe por tais stressores venha a desenvolver a doença, “uma vez que as pessoas têm graus de resiliência e de predisposição diferentes”, como aponta o psiquiatra Henrique Prata Ribeiro, do Hospital Beatriz Ângelo.
Apesar de, explica Albino Maia, não haver “nenhum bom biomarcador da depressão”, existem várias pistas, uma série de alterações relacionadas com a fisiologia do cérebro, com o sistema endócrino e com o sistema imune, que ocorrem mais frequentemente em pessoas que estão deprimidas. “Sabemos, por exemplo, que os níveis de determinadas substâncias químicas neurotransmissoras, como a serotonina, a noradrenalina e a dopamina, são deficientes nos cérebros destas pessoas”, comenta a psicóloga Ruth Ministro.
As comunicações entre neurónios que ocorrem no nosso cérebro, as chamadas sinapses, libertam neurotransmissores que dão indicações aos núcleos dos neurónios de que devem realizar determinadas tarefas. “Quando as coisas funcionam bem, há um enriquecimento cerebral através desta comunicação interneuronal”; mas quando há uma diminuição dos neurotransmissores, sublinha Inês Bandeira e Cunha, “é evidente que toda esta comunicação acaba por estar mais pobre e desregulada e o fabrico de várias proteínas é muitíssimo menor”.
Mais do que identificar uma razão específica ou uma área do cérebro onde o problema possa estar sediado, a Ciência tem indicado cada vez mais a importância do que se passa ao nível das redes de comunicação entre os neurónios do nosso cérebro.
Estas ligações começam a ser definidas desde o período pré-natal, multiplicando-se depois ao longo da infância. Nesta altura, como explica Inês Bandeira e Cunha, além de estar presente, sobretudo, o papel da genética, há uma influência das nossas experiências, da educação e do contexto de vida que, “de certa maneira, vão decidir quais as sinapses que vão ser reforçadas e quais serão apagadas, como uma verdadeira poda”. Neste processo é muito importante o papel da memória e das ligações neuronais que dizem respeito ao sistema de sobrevivência, estreitamente relacionadas com uma zona do cérebro designada de hipocampo.
Inês Bandeira e Cunha revela que, em depressões muito longas, são até visíveis, nos exames de neuroimagem, “zonas atrofiadas em várias áreas do cérebro, nomeadamente no hipocampo, que tem um papel fundamental na memória, sobretudo na transformação da memória de trabalho, a chamada memória de curto prazo, em memória mais permanente”.
Porém, esta atrofia, com medicação correta, é reversível na maior parte dos casos, “exceção feita às depressões resistentes, que representam ainda 30% dos casos”.
O que nos abate
Além do que se passa dentro da nossa cabeça, a nível químico, existem fatores externos que nos vão moldando e testando a nossa resiliência. Como refere a psicóloga Carla Oliveira, muitas vezes “sofremos com experiências que colidem com os nossos sonhos e ambições e que prejudicam a nossa autoestima e a nossa autoconfiança”.
Um divórcio, uma falência, uma perda de emprego ou a morte de uma pessoa próxima são acontecimentos que os especialistas designam de gatilhos.
“Traumas provocados por maus tratos infantis, bullying, divórcios ou relacionamentos difíceis, podem ser vividos com uma intensidade tal que se torna difícil ultrapassá-las”, aponta a psicóloga, explicando que algumas destas vivências emocionalmente fortes “podem ser reativadas em momentos de maior fragilidade emocional”.
“O nosso próprio comportamento pode afetar positiva ou negativamente as funções neuroquímicas, da mesma forma que estas afetam os nossos comportamentos”, defende ainda a neuropsicóloga do Hospital Lusíadas Porto Júlia Machado.
Ou seja, apesar de poderem existir fatores genéticos que predispõem para a depressão e de certas pessoas serem naturalmente mais pessimistas, se alguém mantiver um comportamento constante de reclamação “vai reforçar neuroquimicamente esse aspeto”.
Da mesma forma, alguém que esteja constantemente sob stresse ou com medo irá ativar redes neuronais relacionadas com o sistema de sobrevivência, “que vão aumentar os níveis de cortisol, em vez de aumentar a dopamina e a oxitocina, por exemplo, que são hormonas relacionadas com o prazer e o bem-estar”, acrescenta a neuropsicóloga.
É que, como sublinha Henrique Prata Ribeiro, tudo o que fazemos, vemos ou ouvimos, desde o nosso pensamento às nossas perceções, passando pelo contacto com o exterior, tem uma tradução neuroquímica. É o eterno binómio mente-corpo, indivisível e indissociável, ao contrário do que a cultura ocidental sempre fez, que foi separá-los.
Albino Maia fala ainda de outros fatores que podem conduzir ao aparecimento de uma depressão, mais relacionados com traumas físicos. É o caso de lesões em determinados locais do cérebro, traumatismos cranianos, AVC, infeções do sistema nervoso central, doenças do sistema imunitário e doenças cardiovasculares.
Um estudo realizado por investigadores espanhóis descobriu que idosos com certos fatores de risco para doenças cardíacas eram mais propensos a relatar depressão do que aqueles com menor risco cardíaco.
O colesterol total acima de 280 foi associado a um aumento de 31% no risco de depressão, e uma pressão arterial diastólica maior de 100 conferiu um risco aumentado de 50%. Já os diabéticos eram 39% mais propensos a serem deprimidos do que as pessoas sem diabetes.
Segundo os autores do estudo, o risco de doença cardíaca e o humor deprimido podem estar ligados, pois alguns dos processos físicos que o espoletam, como inflamação, deterioração dos vasos sanguíneos e redução da sensibilidade à insulina, também contribuem para o início da depressão.
Um outro estudo, publicado na revista JAMA Psychiatry em outubro de 2021, analisou 380 mil pessoas e descobriu que aquelas que tinham genes que aumentavam o risco de depressão também tinham tendência para ter contagens mais altas de glóbulos brancos, indicando algum nível de inflamação no corpo.
A descoberta sugere que o sistema imune pode desempenhar um papel fundamental no aparecimento de sintomas depressivos quando os fatores de risco genéticos já estão presentes. Porém, os autores do estudo ainda não conseguem dizer se os genes relacionados com a depressão impulsionam a inflamação, se a ativação imunológica desencadeia uma tendência genética para a depressão ou se se trata de uma combinação dos dois fatores.
Por fim, existem ainda as depressões que ocorrem e nas quais os médicos não conseguem identificar nada que as justifique. “É a coisa que mais nos angustia”, desabafa Albino Maia.
É hereditária?
Mais ou menos. Podemos herdar uma predisposição para ficar deprimidos, explicam os especialistas. Mas a predisposição não está necessariamente encriptada num só gene, é algo multigénico e ainda em investigação.
“Há alguns genes implicados, mas não há uma evidência clara de existir um conjunto de genes que seja responsável pela maioria dos casos. Parece resultar da contribuição de um conjunto de múltiplos genes e da interação entre esses genes e o ambiente em que a pessoa se encontra”, afirma Albino Maia.
De facto, num estudo publicado em maio de 2021, das universidades de Yale e da Califórnia-San Diego, foram analisados historiais clínicos e genomas de cerca de 1,2 milhões de pessoas a partir de quatro bancos de dados diferentes, identificando-se 178 variantes genéticas relacionadas com a depressão major. E os investigadores levantam a hipótese de haver ainda centenas ou milhares de variantes por identificar.
Ainda assim, a psicóloga Ruth Ministro recorda que, apesar de se saber que os antecedentes familiares de depressão constituem um fator de risco, o facto de haver uma base genética “dá-nos apenas um indicador de uma maior vulnerabilidade da pessoa para desenvolver a doença, não implica forçosamente que ela venha a sofrer dela”.
No fundo, como sumariza a neuropsicóloga Júlia Machado, a forma como somos educados a encarar o mundo pode ser determinante, independentemente da genética. “Uma criança até pode nascer com a predisposição para ver a vida de uma forma mais pessimista, mas se for educada para desenvolver um espírito positivo e encarar a vida com otimismo, tem menos probabilidades de ficar deprimida.”
Começar a ver a saída
Transformar as coisas negativas numa imagem cor-de-rosa é “impossível”, nas palavras de Inês Bandeira e Cunha, simplesmente porque “o cor-de-rosa não existe. Existe, sim, uma maneira mais correta e realista de ver a vida”.
Quando estamos deprimidos, temos tendência para generalizar a partir de uma experiência anterior. Ou seja, acreditamos que, por não termos sido capazes uma vez, então não seremos nunca e que vai tudo correr mal. É o chamado erro cognitivo. Para o corrigir e objetivar a forma de pensar existem vários modelos psicoterapêuticos (ver caixa Como escolher um psicólogo).
Além da psicoterapia, Henrique Prata Ribeiro enfatiza ainda a importância de alterar alguns hábitos de vida, nomeadamente adotar uma alimentação saudável, praticar exercício físico regular, não consumir drogas nem bebidas alcoólicas e ter padrões regulares de sono.
A associação entre sono e depressão tem vindo a ser cada vez mais explorada. Um estudo de 2020, publicado na revista Lancet, revelou que mais de 90% das pessoas com depressão têm problemas a nível do sono. Já o Women’s Hospital, em Boston, concluiu que pessoas que trabalham em turnos noturnos “têm um risco de 25% a 40% maior de doenças mentais, incluindo depressão e ansiedade”.
Num ponto todos os especialistas concordam: não há depressões incuráveis. Júlia Machado frisa que, mesmo que a medicação não funcione mais e já se tenha usado vários tipos de psicoterapia, “pode sempre tentar-se encontrar com a pessoa uma forma de esta sentir algum prazer em certas coisas que faz na vida”.
Se, no caso das depressões ligeiras, a evidência mostra que, com psicoterapia e alteração de hábitos de vida, o problema pode ser resolvido, quando falamos de transtornos depressivos moderados a graves, as combinações de tratamentos podem ser bem mais complexas.
Inês Bandeira e Cunha sublinha que “a partir do segundo ou terceiro episódio de depressão, é fundamental que os doentes percebam que têm de manter a medicação de forma profilática, tal como mantêm para a tensão arterial ou diabetes”. Até porque, quanto mais episódios uma pessoa tem, “mais resistência ao tratamento vai adquirindo e mais episódios terá no futuro”.
“É urgente começarmos a encarar a depressão como uma doença do cérebro, não como um fator de fragilidade”, sublinha a médica.
A primeira linha de tratamento, a par da psicoterapia, são os medicamentos antidepressivos e, atualmente, os mais utilizados pertencem à classe dos chamados inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS).
Estes medicamentos impedem que a serotonina, situada na fenda sináptica, seja recolhida pelos neurónios, permanecendo mais tempo neste espaço de comunicação entre as células do sistema nervoso central. Os antidepressivos aumentam, ainda, a disponibilidade de outras moléculas e favorecem a plasticidade sináptica, ou seja, fazem com que os neurónios mudem a sua anatomia.
Apesar de atuarem na recaptação da serotonina, o que acontece, explica Henrique Prata Ribeiro, é que “quando se toca num neurotransmissor, como estes se encontram todos interligados, acaba por se mexer em vários e há uma série de respostas que vão ser causadas a nível global, através de mecanismos nem todos eles conhecidos”.
Henrique Prata Ribeiro refere ainda que os ISRS têm efeitos secundários mais baixos do que outros antidepressivos e permitem a toma a longo prazo, por não causarem habituação nem dependência, ao contrário dos ansiolíticos, além de mostrarem “resultados inequívocos” nos ensaios clínicos.
Tratamentos inovadores
Por outro lado, também se sabe que os ISRS não são um tratamento eficaz em todas as depressões (cerca de 30% são resistentes à combinação entre antidepressivos e psicoterapia). Por esta razão, médicos e investigadores continuam a procurar compreender melhor os mecanismos que explicam o desenvolvimento da doença.
A mais recente novidade, que, porém, ainda não foi aprovada pelo Infarmed, apesar de já ter sido aprovada pela Agência Europeia do Medicamento, é um spray nasal de esketamina, autoadministrado pelo doente sob supervisão direta de um profissional de saúde, em contexto de hospital de dia.
A esketamina vai atuar sobre neurotransmissores diferentes daqueles sobre os quais costumam atuar os antidepressivos clássicos, contribuindo para a recuperação da função sináptica em regiões cerebrais envolvidas na regulação do humor e do comportamento emocional. “E tem uma resposta quase automática, muito importante em situações de emergência, quando há, por exemplo, intenção suicida”, acrescenta Inês Bandeira e Cunha.
A técnica mais comum permanece, porém, a eletroconvulsoterapia, usada em pessoas com depressão grave ou com risco de vida, que não foi resolvida por outros tratamentos. São desencadeadas crises convulsivas medicamente controladas para aliviar rapidamente a depressão. Os efeitos secundários estão sobretudo relacionados com a memória e, geralmente, são temporários.
Semelhante, mas com muito menos efeitos secundários e não invasiva, é a estimulação magnética transcraniana (EMT), que permite modificar as propriedades elétricas de uma zona muito restrita do cérebro, através de um equipamento que produz campos magnéticos focais.
Recentemente, também há quem recorra ao neurofeedback, uma técnica na qual as pessoas aprendem a modelar a fisiologia do próprio cérebro, a fim de reduzir os sintomas depressivos. Por vezes, quando estamos deprimidos, a zona frontal do hemisfério esquerdo do cérebro, responsável pelo processamento indireto dos estímulos positivos, está a trabalhar um pouco mais devagar do que a zona frontal do hemisfério direito, responsável pelo processamento indireto dos estímulos negativos.
O que o neurofeedback faz é uma espécie de “fisioterapia ao cérebro para que este possa voltar a trabalhar a um ritmo a que já não estava habituado”, explica Francisco Marques Teixeira, psicólogo na clínica Neurobios e diretor do laboratório MuLabs.
Na prática, este treino cerebral faz-se em sessões de meia hora, colocando dois sensores na zona frontal da cabeça, que, no caso da depressão, traduzem os impulsos das zonas frontal esquerda e frontal direita do cérebro em imagens. Passadas cinco a dez sessões, das 20 recomendadas, o psicólogo afirma que a pessoa já começa a regular esta assimetria.
A magia dos cogumelos
Descartadas no passado e relegadas para segundo plano enquanto opções terapêuticas credíveis e viáveis, as drogas psicadélicas voltaram à luz da ribalta – em ambientes controlados e sem os efeitos secundários habituais.
Mas atenção: a terapia assistida por psicadélicos não exclui, de forma alguma, o papel do psicólogo ou do psiquiatra. Até porque, para a experiência ser verdadeiramente transformadora, é necessário processar tudo o que se viveu, de modo a promover a mudança. É o chamado período de “integração”.
Em abril de 2019, a Faculdade de Medicina do Imperial College, em Londres, criou o primeiro centro de investigação em psicadélicos, seguida, em setembro do mesmo ano, pela universidade norte-americana Johns Hopkins, a qual, em novembro de 2020, publicou, na revista científica JAMA Psychiatry, um estudo que mostra que a utilização de psilocibina, uma substância com efeito psicadélico contida nos cogumelos mágicos, administrada com psicoterapia de apoio, produz reduções rápidas e significativas nos sintomas depressivos, ou mesmo a remissão dos sintomas, nas quatro semanas seguintes.
Em fevereiro de 2022, investigadores do mesmo instituto publicaram outro estudo no Journal of Psychopharmacology, com participantes que sofriam de depressão moderada a grave e aos quais foram dadas duas doses de psilocibina com psicoterapia de suporte. A pesquisa conclui que os efeitos antidepressivos do tratamento podem durar, pelo menos, 12 meses após a intervenção aguda em alguns pacientes.
Também por cá, a magia dos cogumelos parece ter suscitado a curiosidade dos investigadores e um estudo internacional foi testado em doentes portugueses com depressão resistente. Realizada na Fundação Champalimaud, e dirigida pelo psiquiatra Albino Maia, a pesquisa deu aos dois doentes portugueses elegíveis uma cápsula de psilocibina.
Os resultados finais ainda estão por publicar, mas os dados preliminares a nível internacional apontam para que, em 25% dos casos, haja sucesso no combate à depressão. “Este é um tratamento muito relacionado com as expectativas que as pessoas têm dele”, afirma Albino Maia.
Esta luta faz-se também recorrendo à ketamina, uma substância com propriedades psicadélicas. Além de ser antidepressiva, “tem efeitos que induzem uma variedade de experiências muito interessantes que podem ser profundamente terapêuticas quando integradas com suporte psicológico”, explica o psiquiatra João Ribeiro, que implementou a terapia inovadora no Hospital Beatriz Ângelo.
Tal como outros psicadélicos, esta substância torna o cérebro e a mente mais moldáveis, facilitando mudanças de pensamento e comportamentais, “abrindo assim uma oportunidade de intervenção”.
No Beatriz Ângelo, a ketamina é administrada ao longo de oito semanas, em sessões de duas horas, nas quais os pacientes “têm acompanhamento médico e são utilizados suportes sensoriais, como vendas para os olhos ou música”, alternadas com sessões de psicoterapia.
Seguindo um protocolo semelhante e sempre na presença de um psiquiatra e de um psicoterapeuta, também a Unidade de Depressão Resistente do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa faz tratamentos de psicoterapia assistida por ketamina.
“Estamos a receber pessoas que sofrem de depressão resistente, ou seja, que não melhoraram com antidepressivos nem com psicoterapia”, revela o psiquiatra Pedro Castro Rodrigues, responsável pela unidade clínica para a utilização de psicoterapia assistida por ketamina.
O objetivo deste tratamento, afirma o psiquiatra, “é criar uma modificação temporária na consciência, permitindo ao paciente explorar novas perspetivas sobre si próprio, sendo a psicoterapia fundamental, pois irá ajudá-lo a selecionar as perspetivas mais adaptativas e trazê-las para o seu dia a dia”.
Quem sabe se, neste maravilhoso mundo novo dos psicadélicos, não irá confrontar-se consigo mesmo de forma mais gentil.