Não é segredo para ninguém que as igrejas cristãs estão em decadência no hemisfério norte. O número de católicos americanos que frequentam a missa é metade do que já foi há alguns anos, e os protestantes não estão melhor. O número de igrejas filiadas na grande denominação Southern Baptist é o mais reduzido dos últimos 47 anos.
As estatísticas dizem que os “Nones” (ateus, agnósticos e os que desvalorizam a sua religião) constituem agora o maior grupo no país (28%), os adultos não filiados superam os católicos (23%) e os protestantes evangélicos (24%).
O período pós-pandémico não reverteu as quebras de filiação e da prática religiosa anteriormente verificada. Mas também não serão alheios à situação os escândalos sucessivos que prejudicaram a reputação das comunidades religiosas, em especial desde os anos oitenta, nem a marcha da secularização no Ocidente. No Reino Unido apenas 6% da população assiste regularmente a um serviço religioso.
Afinal, talvez a Igreja tenha que mudar a sua estratégia de alcance, passando a valorizar mais o modelo do chamado Bom Samaritano. Repare-se que esta figura da estória que Jesus Cristo contou tinha uma religião diferente da do judeu moribundo, todavia foi o amor ao próximo que norteou a sua atitude para com ele, não se deixando limitar por barreiras religiosas.
Sejamos honestos. Quantos cristãos movidos pela sua fé estão hoje dispostos a ajudar com esforço físico, tempo e dinheiro, muçulmanos, hindus, budistas, espíritas ou quaisquer outros que se encontrem em situação de necessidade e fragilidade, como fez o homem de Samaria?
Não estarão hoje muitos chamados cristãos distraídos com uma estratégia de conquista do poder político, da glória dos homens ou de visibilidade pública? Não estão muito mais interessados em combater contra os que ignoram a sua fé e ética em vez de compreender que o próprio Mestre de Nazaré nunca impôs o seu pensamento, a sua ética e valores pela força da lei nem pela lei da força?
Conhecemos o princípio de Francisco de Assis, que vemos frequentemente citado: “Prega o evangelho em todos os momentos e, se necessário, usa palavras”. Jesus fez as duas coisas. No seu primeiro discurso falou de boas notícias para os pobres, liberdade para os prisioneiros e recuperação da visão para os cegos: “O Espírito do Senhor é sobre mim, pois que me ungiu para evangelizar os pobres. Enviou-me a curar os quebrantados de coração, a pregar liberdade aos cativos, e restauração da vista aos cegos, a pôr em liberdade os oprimidos, e a anunciar o ano aceitável do Senhor” (Lucas 4:18,19).
E naquele que podemos considerado o seu último sermão público Jesus exaltou os que alimentaram os famintos, vestiram os nus e visitaram os prisioneiros: “Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo. Porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber; era estrangeiro, e hospedastes-me. Estava nu, e vestistes-me; adoeci, e visitastes-me; estive na prisão, e foste-me ver. Então os justos lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com fome, e te demos de comer? Ou com sede, e te demos de beber? E quando te vimos estrangeiro, e te hospedamos? Ou nu, e te vestimos? E quando te vimos enfermo, ou na prisão, e fomos ver-te? E, respondendo o Rei, lhes dirá: Em verdade vos digo que quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes” (Mateus 25:34-40).
Philip Yancey disse: “Sociólogos como Rodney Stark apontam para a igreja primitiva como um modelo. Havia poucos missionários ou evangelistas no Império Romano, e não havia uma ‘igreja buscadora’. Em vez disso, os cristãos mostraram aos seus vizinhos uma maneira diferente de viver, adoptando bebés indesejados em vez de os abandonar, auxiliando vítimas da peste em vez de fugir delas, convidando todas as classes sociais para adorarem juntas, compartilhando recursos com os pobres. Em consequência disso os romanos concluíram que gostavam mais da forma como os cristãos viviam do que da sua própria forma de vida, e desejaram o mesmo que eles tinham. Trata-se duma boa fórmula para o crescimento da igreja.”
Talvez seja tempo de entender que o futuro da Igreja exige que os cristãos se esforcem por ser mais parecidos com Cristo, do que permanecer guardiães de doutrinas, tradições e procedimentos. Não que estas coisas sejam más em si mesmas, mas não são o foco principal do evangelho.
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