Na semana em que cartazes “porcinos” trouxeram o tema do racismo para a luta dos professores, e o “botânico” Marcelo Rebelo de Sousa deu conselhos sobre as artes da poda, o ex-ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, veio reaparecer determinado a provar que, como referiu Filipe Luís, editor executivo com a pasta da Política, da VISÃO, “as notícias sobre a sua morte política eram manifestamente exageradas”. Este Olho Vivo foi gravado à hora em que o ex-governante tinha a sua principal prova de fogo, na CPI da TAP, depois de o seu ex-secretário de Estado, Hugo Mendes, ter aplainado o terreno, defendendo a solução do “mal o menos”, no caso da indemnização milionária de Alexandra Reis – e penitenciando-se pela ideia do “desvio de um avião”, ou antes, do horário de um avião, para, alegadamente, satisfazer o Presidente da República.
Sobre o discurso de Marcelo, no 10 de junho, Filipe Luís ressalvou que, nestas ocasiões solenes, o Presidente “prefere não dar muitos recados políticos, em cima da atualidade, mas sim fazer intervenções de fundo” para convocar os portugueses para se unirem em torno de temas nacionais. “Para os recados tem o resto dos dias, em que intervém quotidianamente”. Ainda assim, este discurso, sem fugir muito ao figurino, “teve mais recados do que o habitual”. E reforça Filipe Luís: “E não apenas pela alusão aos ramos secos que devem ser cortados da árvore, frase interpretada como uma alusão à necessidade de demissão de João Galamba, mas noutras partes do discurso, quando compara a situação atual, em que as Finanças Públicas estão em bom estado [um argumento muitas vezes invocado pelo Governo como sinal de um bom desempenho geral], com os tempos do salazarismo, em que também estavam em bom estado mas em que não havia serviços públicos a funcionar, caso de um SNS em condições…”
Ainda sobre aquela cerimónia, no Peso da Régua, Nuno Miguel Ropio, jornalista da secção política da VISÃO admitiu que, “pelo menos, os 10 de Junho com Marcelo Rebelo de Sousa, ao contrário dos do passado, são os únicos que têm ficado na memória”, e que tendo em conta “a oportunidade única do Presidente da República de ter um palco ali, desde os incidentes no gabinete de João Galamba, para poder abordar aquilo que provocou o maior choque com António Costa”, desde 2016, “assistiu-se um discurso muito crítico, ainda que metafórico, sobre o estado do País”. Já sobre os cartazes dos professores, ou daquele pequeno grupo de professores ligados ao S.T.O.P., que estiveram em protesto no 10 de Junho, “apesar de muito questionáveis, pelas imagens usadas e mau gosto, houve uma reação excessiva, apontando alegado racismo aos seus autores”. E completa Nuno Miguel Ropio: “Não é a primeira vez que tal acontece e estes cartazes não são piores que o coelho enforcado no tempo de Passos Coelho”.
Filipe Luís, por seu turno, desvaloriza o protesto dos professores e os cartazes – “já vimos protestos muito mais violentos noutras paragens, veja-se o caso francês e, mesmo entre nós, a tradição da animalização dos políticos em caricatura remonta a Bordalo Pinheiro”. Mas considera que “a vitimização de António Costa acabou por funcionar a seu favor e contra os professores”.
Sobre a CPI da TAP, Tiago Freire, diretor da EXAME e responsável pela secção de Economia da VISÃO, acusa esta comissão parlamentar de ter prestado “um péssimo serviço ao País”. E explica: “Não porque não fosse justificada a sua existência mas porque os deputados se deixaram cair numa agressividade e num voyeurismo excessivos. O que interessava resume-se a dois pontos: Alexandra Reis, por um lado, e a questão do SIS, por outro. Mas 80% desta comissão não foi sobre isso, foi um exercício de voyeurismo sobre mensagens e um processo de humilhação a quem lá ia ser ouvido, que teve de suportar dez ou 12 horas de interrogatório agressivo, e todos fingimos que isso é normal. Não é, há certamente outras formas de o fazer.”
Nuno Miguel Ropio alinha pelo mesmo diapasão: “A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à gestão da TAP atinge a sua reta final com o seu “objetivo completamente desvirtuado; o que era para ter sido dedicado a perceber o que correu mal com o renacionalização da TAP e, até, o episódio de Alexandra Reis, e os 500 mil euros que lhe foram pagos, acabou por incidir apenas no que aconteceu na noite de 26 de abril no gabinete de João Galamba”, disse, apontando que, após tantas audições polémicas, que o que aí vem, com a discussão do relatório final, poderá “não ser mais pacífico”.
Filipe Luís acrescenta que o problema da CPI foi ter dedicado a sua energia a tentar confrontar o Governo com as suas mentiras: “Mais valia o Governo ter assumido logo, por exemplo, a indemnização de Alexandra Reis, com o seu aval, em vez de fazer o teatro de pedir à TAP esclarecimentos sobre uma indemnização que tinha autorizado, fingindo que não sabia. O pecado original é o da mentira e, portanto, a responsabilidade pela degradação das cenas na CPI é do Governo”.
Tiago Freire resume tudo numa analogia: “Quem come salsichas não quer visitar uma fábrica de salsichas, não quer saber como aquilo é feito. Esta CPI é a fábrica de salsichas do Governo, em que percebemos como as coisas são feitas no dia a dia. Mas muito do que gera indignação, os whatsapp, por exemplo, acontece no Governo, em qualquer Governo, em qualquer organização, em qualquer empresa. Isso não tem problema nenhum desde que os atos sejam devidamente formalizados, que fiquem formalmente registados. Acho que ganhámos pouco com esta CPI, pelo desvario em que se tornou. Foi mau para o Governo, foi mau para os deputados, que deram um mau exemplo, e foi mau para o País”.
Sobre o regresso de Pedro Nuno Santos, Tiago Freire recorre à série Star Wars: “Estamos em tempo de anúncio de sequelas, e por isso podemos falar de Pedro Nuno Santos como o ‘Regresso de Jedi’, aquele que parecia desaparecido mas que ainda está bem vivo…”.
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