Primeiro, retiremos os escudos da Praça do Império, arrasemos o Monumento aos Descobrimentos e, já que estamos com a mão na massa, destruamos as pirâmides e demolamos a Muralha da China. Assim, limparemos a História da exploração do Homem pelo Homem!
Se não fosse perigosa, esta mentalidade era no mínimo ridícula.
A História tem um tempo e o tempo tem as suas circunstâncias que, aos olhos de hoje, são muitas delas ignóbeis, desumanas, mas que eram assim, foram assim. No fundo, estes símbolos deveriam ser encarados, para além de obras de arte que o são, como marcas da evolução humanista.
Portugal foi um país que se alargou a outros continentes, que contribuiu para o conhecimento de outras culturas, que fomentou e contribuiu para uma época gloriosa em termos de crescimento económico europeu. Isso não é motivo de vergonha, mas sim de orgulho. Naturalmente que ninguém hoje pode negar que tudo isso foi feito com um desrespeito pelos povos existentes nas regiões “descobertas”. Mas temos que encarar esses momentos com o distanciamento devido e com o olhar no tempo em que aconteceram e as circunstâncias que os rodearam. Sem esquecer que, de todos os países colonialistas, Portugal foi o que mais promoveu a integração e a mistura entre “raças”. Coloco em aspas os termos porque hoje eles, de facto, não fazem qualquer sentido, mas faziam-no na altura!
Quer as pirâmides quer a Muralha da China (entre centenas de outros símbolos dum tempo histórico) foram construídos na base do sangue, da escravatura, no desrespeito pelos direitos dos seres humanos, aos quais não era reconhecida essa qualidade, fosse pela cor da pele, credo ou apenas nacionalidade.
Em escritos de Direito Romano podemos encontrar a definição de “homicídio” e ficaremos a saber que matar um escravo não era crime e só o seria caso o escravo pertencesse a outro senhor. Circunstância em que se tratava dum crime contra a propriedade.
A evolução faz-se conhecendo a História, olhando-a com o distanciamento necessário e não repetindo os erros que lhe reconhecemos.
A evolução faz-se conhecendo a História, olhando-a com o distanciamento necessário e não repetindo os erros que lhe reconhecemos
Mais do que os brasões da Praça do Império (tivemos um império, bolas! Retirar os brasões não apaga esse facto!) ou derrubar o Monumento aos Descobrimentos (descobrimos novos Mundos. Uns habitados, outros não. Isso é um facto, quer tenhamos ou não monumentos que no-lo recordem!), deveria preocupar-nos muito mais os indícios atuais de xenofobia e intolerância que surgem um pouco por todo o lado.
Devíamos condenar, averiguar e punir o que sucedeu na sessão online do Liceu Camões, onde se debatiam a escravatura e o racismo, onde elementos entraram indevidamente na sessão e agrediram com palavras e imagens os que nela participavam.
Isso, sim, é preocupante. Isso, sim, é preciso combater, quer nas narrativas dos meios de comunicação social tradicionais, quer nas redes sociais. Esses são os símbolos que devemos derrubar.
Alguma coisa vai mal quando uma pessoa com responsabilidades políticas faz declarações públicas do teor das que assistimos recentemente.
Evidentemente que é a sua opinião pessoal e só vincula quem a profere. Mas há responsabilidades que um servidor público ao mais alto nível tem e deve assumir.
Uma delas é dizer sempre a verdade. Outra é evitar levantar polémicas tontas sem necessidade.
Até porque a opinião pessoal dum dirigente, político ou figura mediática é sempre pública quando divulgada.
Como dizem os franceses: ça vient avec le boulot!!!