Não há verniz que aguente isto, nem o das unhas nem o outro. Acreditem, bolas, acreditem que ainda vamos chegar lá! Temos tudo a nosso favor: somos os maiores nos empates, temos as ganas e o espírito de equipa, temos a tática segura – nada de fazer bonitos, interessa é o resultado. E temos o nosso Ronaldo, esse anjo de ouro, artista maior dos dois pés e da cabeça também, tão lindo o Menino, bom pai de família e tudo. Somos os maiores, toda a gente sabe.
Só que não. O ecrã gigante do “bar de copas” no Casco Viejo de Bilbau mostra o Uruguai a ganhar, e os bascos a rirem-se do meu sofrimento. Sempre que o nosso menino tocava na bola, via-se que torciam para que a perdesse ou, pior, para que torcesse um pé. Queriam vê-lo no chão, os sacanas.
Aqui o Real Madrid é o inimigo da capital, Ronaldo o Deus maior que eles não conseguem pagar. A inveja é lixada. Uruguai!, Uruguai!, gritavam os tipos de cerveja na mão e coração do lado errado – toda a gente sabe que o lado certo é com os de branco.
Branco, se calhar é por isso! Detesto quando jogam assim, todos de branquinho, de vestes virginais – se o vermelho do sangue e o verde da esperança e da relva não lhes fica mesmo mesmo a matar. Assim, parece-me a mim que vão para a missa e não para a luta, que isto dentro das quatro linhas é uma guerra. Mas siga, rola a bola, estamos com eles seja qual for a cor. O nosso coração está sempre do lado certo.
Aqui e acolá, quando a câmara filma o Menino, um “Siiiiiim” para nos fazer lembrar que sim, estávamos a perder e o Ronaldo quase nem tinha tocado da chicha.
Os meus filhos embaraçam-se com isto de ter uma mãe que vibra mas não percebe nada de bola, grita falta e não livre, e tem, admita-se, uma dificuldade elevada em reconhecer um fora de jogo. Calma, mãe, calma, que figura, que está tudo a olhar!
Pois que olhem, sabem lá eles. Nunca viram a esperança assim estampada, uma mulher que acredita com o coração na boca, um impropériozito aqui e acolá, aqui que ninguém nos entende não faz mal.
Dão quatro minutos de prolongamento, bora lá que já vimos este filme, aos 92’ é tão boa altura para marcar golos. A música alta demais, a bombar um rock manhoso e a fazer-me disparar para a loucura os batimentos cardíacos, em vez de algo para me acalmar os nervos, uma bossanova sei lá.
Nem o Quaresma tirou do saco a trivela, nem o nosso Menino um daqueles lances do Olimpo. Paciência. Toda a gente sabe que os melhores do mundo somos nós, os astros é que se alinham de vez em quando de forma errada, desafiando as leis do justo universo. Se calhar foi do branco, ninguém de tira isto da cabeça… Os deuses não gostam disso, o branco é deles, toda a gente sabe. Dizem que a equipa deu tudo e eu acredito, vamos pensar assim. Por mais anos que viva, não há maneira de me habituar a este agri-doce da derrota. Cá para mim foi do branco, havíamos de fazer uma abaixo-assinado para que não se repita. Para quê arreliar os deuses?
Amanhã vou torcer pela Rússia, vocês vão ver, ó bascos. Não me orgulho de desejar uma pequena vingança, mas hão-de aprender a lição: o coração tem de estar do lado certo, e é do nosso, caramba!