Fazer a ronda pelas notícias do ano, um exercício sempre revelador, deixa qualquer pessoa atenta com um nó no estômago. As histórias em torno da emergência climática – palavra do ano para o Dicionário de Oxford – sucederam-se em catadupas.
As más notícias vieram de todo o lado. Soube-se que os últimos cinco anos foram os mais quentes na Terra desde que há registos. Pela primeira vez na História do planeta, a concentração de CO2 atingiu níveis sem precedentes (415 partes por milhão), subindo cerca de 26% nos últimos 50 anos. Descobrimos que estamos a injetar dióxido de carbono na atmosfera a um ritmo quase dez vezes superior ao que aconteceu durante o último evento planetário de aquecimento global, há 56 milhões de anos, quando ocorreu uma extinção em massa de espécies marinhas.
A Organização Meteorológica Mundial das Nações Unidas reportou que a concentração de gases com efeito de estufa atingiu o valor mais alto de sempre e que “não há sinal de um abrandamento, muito menos de um declínio”.
Por outro lado, um estudo do Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas apurou que, independentemente de quanto forem cortadas as emissões, os fenómenos extremos em torno dos níveis das águas, que até agora acontecem uma vez por século, em 2050 acontecerão todos os anos. Em risco de perder as suas casas e o seu modo de vida estão, pelo menos, 300 milhões de pessoas. A Oxfam diz que, em média, já hoje uma pessoa a cada dois segundos é forçada a sair de sua casa devido a crises climáticas.
Do Polo Sul chegam também tristes novas. Na Antártida, poucos já têm esperança em relação aos efeitos do ritmo de degelo, seis vezes maior do que durante os anos 80. Os glaciares são já dados como perdidos pelos cientistas, que consideram os danos irreversíveis e que apenas debatem sobre quando acontecerá, algures adiante, uma subida das águas dos mares – que pode ir até seis metros.
Outro estudo recente mostrou que os oceanos estão a desoxigenar rapidamente, e há algumas áreas que já perderam 40% a 50% do oxigénio. Uma das zonas mais afetadas é a Grande Barreira de Coral, onde as coisas se agravaram a olhos vistos. Soube-se que o coral sofreu uma perda nos últimos três anos que chega quase aos 90%, e que os estragos se agravam à medida que as águas aumentam de temperatura.
Dos Himalaias vêm mais relatos de potenciais catástrofes. Até ao final deste século podem perder a quase totalidade dos seus glaciares milenares, o que determinaria uma crise de refugiados de enormes proporções.
Para piorar a sensação de desolação, um conjunto de cientistas climáticos assinou um artigo na Nature em que disse que vários dos pontos de não retorno podem já ter sido ultrapassados, ameaçando uma cascata de eventos imparáveis que causaria “um risco existencial à civilização”.
É pois fácil perceber porque o Parlamento Europeu declarou, no fim de novembro, o estado de emergência climática e ambiental, no mesmo ano em que, do lado de lá do Atlântico, os EUA de Trump começaram as manobras de retirada formal do Acordo de Paris.
Perante uma catástrofe anunciada, este estado de alerta global teve uma porta-bandeira improvável: Greta Thunberg, a miúda sueca que é o rosto de uma geração zangada com a inércia dos dirigentes que há três décadas voltam a cara aos problemas. Greta, vilipendiada por tantos, incluindo o Presidente do Brasil que lhe chamou “pirralha”, foi justamente eleita figura do ano pela Time.
Para terminar esta triste radiografia do ano, viajemos até à Islândia, onde a população fez uma cerimónia fúnebre para marcar o fim do primeiro glaciar perdido para as alterações climáticas. O Okjökull ocupava mais de 16 quilómetros quadrados e agora nada resta. No seu lugar, foi colocada uma placa com uma “carta para o futuro”, em que se lê: “Este monumento serve para reconhecer que sabemos
o que se está a passar e o que precisa de ser feito. Só vocês saberão se o fizemos.”
Na altura em que estamos prestes a entrar num novo ano, e numa nova década, cabe a todos perguntarmo-nos se estamos a fazer a nossa parte.