1.Devemos congratular-nos com os recentes números sobre o estado das finanças públicas e da economia. É melhor ter menos défice, menos desemprego, menos dívida e mais crescimento… mesmo sabendo que há algum artifício pelo meio e que os dados são muitíssimo incipientes. Pensemos que, no mínimo, isto ajuda-nos a ficar livres da troika, mas tem outra importante vantagem: diminui, consideravelmente, a cortina de fumo sobre o verdadeiro papel do Governo na aplicação de um programa ideológico cujos eixos fundamentais são a diminuição dos direitos sociais e a desvalorização do fator trabalho. A invocação ad nauseum dos credores foi um excelente álibi, mas é preciso não esquecer que por trás de cada imposto, de cada corte nos rendimentos, de cada despedimento estão políticos de carne e osso que todos conhecemos. Segundo relatórios recentes da Comissão Europeia e de instituições presentes em Davos, o empobrecimento e a concentração da riqueza são tendências a nível mundial – nunca tão poucos acumularam tanto! Mas também nunca se assistiu a tamanha capitulação da política face à agenda e à cupidez dos mercados.
Por cá, os governantes andam felizes, embora o perfume dos números não inebrie todos por igual. O crescimento anémico, a debilidade da procura interna, a fraca qualidade do emprego criado exigiria mais prudência da parte de quem já deita foguetes, como se o tempo fosse de festa. Pelo que se percebe, não é isso que vai acontecer. Daqui até às eleições europeias, a euforia vai em crescendo e o calendário promete. Em fevereiro, serão conhecidos os números finais do défice de 2013 que, como é sabido, deverá ficar abaixo dos 5%; depois, é natural que aconteçam mais emissões (bem sucedidas) de dívida; de seguida, vêm os dados do primeiro trimestre, com a provável revisão em alta do crescimento da economia e, lá para abril/maio, bem pertinho das europeias, será anunciado o desfecho da intervenção dos credores.
Sair do programa de ajustamento sem ter de recorrer a um programa cautelar é o Plano A de Pedro Passos Coelho. Embora dependente da evolução dos mercados, internamente só novo chumbo do Tribunal Constitucional lhe poderá estragar a festa. Claro que a falta de um acordo com o PS também não ajuda nada, mas esse será um capital de queixa (importante, diga-se) para esgrimir na bravata eleitoral. Aliviado da pressão dos resultados, Passos pode agora dedicar-se mais à política pura e dura. E já o começou a fazer. Com uma vitória por KO no primeiro round, despachou Marcelo. Agora, prepara-se para fritar António José Seguro.
2. O PSD é o partido com mais militantes críticos por metro quadrado. Os de maior visibilidade são ex-ministros, muitos simultaneamente ex-líderes do partido, a esmagadora maioria com programas próprios de opinião, nos media. Pois bem, à beira de um congresso marcado para fevereiro, muito poucos tencionam comparecer para fazer valer os seus argumentos. Provavelmente, não iam mudar nada, pois um partido domesticado é um partido domesticado e ponto final. Mas, ficava-lhes bem olharem de frente os seus companheiros e, corajosamente, dizerem tudo o que lhes vai na alma. A exceção será Nuno Morais Sarmento. Ao menos alguém para salvar a honra do convento.