A crise quando aperta pode adiar a compra de uma casa ou de um carro ou cancelar umas férias mas mais dificilmente afeta a aquisição de bens alimentares, uma decisão com impacto direto também no imobiliário. Os novos projetos orientados para o retalho estão assim entre os mais imunes à recessão, uma realidade que a Gesconsult, empresa de gestão e fiscalização de obras, responsável por projetos nas áreas do retalho, hotelaria e residencial, bem conhece. Recentemente, a empresa resolveu expandir a sua atividade para região Norte, alicerçada em alguns projetos imobiliários que se destinam à área de distribuição alimentar, entre os quais a remodelação do Auchan na cidade da Maia.
“O retalho é um segmento de mercado que acaba por passar sempre ao lado das crises. Por isso aproveitámos alguns projetos específicos para nos lançarmos e alavancar a abertura de uma delegação da Gesconsult a Norte, até porque há investidores atentos a olharem para oportunidades nesta região do país”, referiu Nuno Garcia, diretor-geral da GesConsult.
O responsável acredita que zonas como Braga, Guimarães, Viseu, Vila do Conde, Espinho ou Famalicão têm potencial para crescer em termos imobiliários até porque na área metropolitana de Lisboa, a mais cara do país em termos imobiliários, já se começa a registar sinais de alguma cautela perante a incerteza do futuro.

Projeto Gesconsult
“Os terrenos e imóveis para reabilitar na cidade de Lisboa e mesmo nas zonas mais próximas já estão a atingir preços de venda altíssimos e, isso por si só, já obriga os investidores a olhar para outras localizações. Mas depois há também a questão dos custos de mão-de-obra e matérias-primas que ainda agravam mais o problema”, reforça o engenheiro.
A vantagem competitiva da região norte assenta assim não só no valor dos terrenos disponíveis para edificar projetos imobiliários mas também na própria máquina já mais oleada do próprio setor da construção.
“Nós sabemos que no norte há uma tradição muito grande das empresas deste setor portanto o valor da construção é ligeiramente abaixo dos preços apresentados no centro ou em Lisboa. Estamos também a viver uma fase de escassez muito grande na mão de obra, seja ela indiferenciada ou qualificada. Porém, mesmo em profissões nas áreas da carpintaria ou serralharia é mais fácil conseguir encontrar soluções a norte onde o nível dos preços não é muito grande. Já para não dizer que sempre se consegue encontrar quem saiba fazer esse trabalho mais qualificado”, explica Nuno Garcia.
Para o responsável da Gesconsult “há vários fatores para a escassez de mão-de-obra, desde logo o grande fluxo de emigração que ocorreu na crise de 2008 e que se prolongou até 2011. Nessa altura, muita gente saiu para França, Inglaterra, Holanda ou Espanha e já não voltaram, criando um problema grave”.
Nas áreas menos qualificadas também surgiram problemas que tardam a ser solucionados. “Tínhamos anteriormente um fluxo de trabalhadores que vinha de Angola, Moçambique ou Cabo Verde e tem vindo a reduzir-se. Basta ir a uma obra para perceber que a maioria dos trabalhadores que agora lá estão são indianos, nepaleses, pessoas cuja cultura e língua é diferente da nossa e isso implica mais formação para que se adaptem aos nossos métodos de construção”, realça ainda Nuno Garcia.
Mas não só. A crise de mão-de-obra é em todas as frentes. Nas áreas de qualificação superior, as dificuldades repetem-se. “Também aqui temos um problema gravíssimo de formação. Muitos engenheiros emigraram e os cursos superiores não estão a conseguir repor essa falta com novos licenciados. Pura e simplesmente não temos engenheiros suficientes disponíveis no mercado”, salienta o diretor-geral da Gesconsult, acrescentando que o mercado tem tentado colmatar essa falha através de engenheiros brasileiros.
Apesar das dificuldades, o mercado imobiliário irá reagir de uma forma distinta em relação ao que ocorreu em outros períodos recessivos, mesmo no segmento residencial na área da grande Lisboa, faz questão de sublinhar o responsável. “Existe essa cautela por parte dos investidores para tentar perceber como é que vai ser a evolução no mercado mas todos nós sabemos que este está muito mais bem preparado do que estava em 2011”, rematou Nuno Garcia, dando como exemplo o grau de exigência a que os bancos estão obrigados a cumprir no que respeita à capacidade financeira dos seus clientes.