A Relais &Châteux sempre se destacou pela exclusividade e, em tantos casos, pela intangibilidade de algumas das suas unidades. Fazem parte desta associação alguns dos melhores hotéis e restaurantes do mundo, que só podem fazer parte deste grupo de elite depois de visitados por inspetores – que fazem visitas-mistérios – e de passarem no apertado crivo da lista infindável de requisitos que têm de cumprir.
Não apenas em termos de qualidade, comodidade e oferta dos produtos, mas também de serviço. A celebrar 70 anos de existência, a Relais & Châteux incorpora, atualmente, 580 hotéis e cerca de 800 restaurantes em 65 países. Todas as unidades são operadas por proprietários independentes, e não raras vezes são ainda detidas por empresas familiares, o que acaba por se traduzir nas ofertas mais intimistas, calorosas e com um serviço muito virado para um acolhimento diferenciado a cada cliente. Dentro dos requisitos da associação de elite estão muitas variáveis relacionadas com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, que devem atravessar toda a governança de cada unidade que pertence à associação.
Foi, por isso, um passo quase orgânico esta parceria com a UNESCO, que posiciona a Relais & Châteux num patamar de exigência muito significativo, em relação aos seus pares. “Esta parceria com a UNESCO é um passo natural para a nossa Associação: o nosso propósito é apoiar e promover a mudança e continuar a repensar os modelos operacionais das nossas propriedades para que viajar – uma fonte de enriquecimento pessoal – se encaixe nos objetivos ambientais, sociais e económicos”, explica Laurent Gardinier, Presidente da Relais & Châteaux, em comunicado.
A ambição de se tornar uma referência no que se refere à responsabilidade social e ambiental tinha ficado bem explícita durante um almoço com os responsáveis da associação, em Paris, em abril deste ano. Na ocasião, referiam à EXAME que a Relais & Châteaux estava cada vez mais comprometida com o reforço das políticas de sustentabilidade, numa altura em que tantas vezes o luxo e as viagens são apontados como grandes responsáveis pelo agravamento dos desafios ambientais que se vivem. À mesa do restaurante de Pierre Gagnaire, a poucos passos do Arco do Triunfo, os objetivos eram claros: continuar a crescer em membros da associação, sem nunca aliviar a exigência que se exigem a todas as unidades da Relais&Châteaux. “Preferimos ser menos, mas ser os melhores”, diria o responsável de comunicação da marca Lars Seifert.
“É uma honra ver a nossa estratégia apoiada formalmente pela UNESCO: a diretora-geral, Audrey Azoulay, assinou oficialmente o preâmbulo dos nossos compromissos”, reforça Gardinier, congratulando-se também pelo trabalho realizado por Mauro Colagreco, Vice-presidente de Chefs da associação, que durante a última década tem trabalhado os temas da sustentabilidade de forma séria e empenhada.
“Nos últimos dois anos, tenho trabalhado com a UNESCO para promover a biodiversidade e envolver o maior número de pessoas possível no que diz respeito à necessidade de proteger os nossos ecossistemas”, explica Colagreco. “Olho para a gastronomia como um extraordinário vetor de mudança e acredito que temos de repensar fundamentalmente a forma como abordamos os sistemas alimentares. Apercebi-me rapidamente de que precisamos de aumentar a quantidade de guardiões da biodiversidade em todo o mundo se queremos proteger o nosso planeta e as suas espécies. A rede Relais & Châteaux inclui 580 propriedades com um total de 800 restaurantes, por isso, pareceu-me evidente envolvê-las nesta iniciativa”, conclui.
“Jamais no decurso da História a natureza apresentou um declínio tão dramático. Um milhão de espécies, de um total de oito milhões identificadas até à data, enfrentam a ameaça de extinção. Unidas numa só voz, a UNESCO e a associação Relais & Châteaux apelam à mudança das nossas perspetivas e práticas no que diz respeito à alimentação e ao restabelecimento do equilíbrio entre os seres humanos e o ambiente”, afirma, por seu lado, Audrey Azoulay, diretora-geral da UNESCO.
“Na sua dedicação diária à gastronomia e à hospitalidade, os membros da Relais & Châteaux estão em contacto permanente com pessoas de todas as origens e de todos os tipos de comunidades, bem como com a natureza e a sua infinita riqueza e variedade”, continua Gardinier. “A UNESCO trabalha para proteger a biodiversidade que compõe o tecido vivo do nosso planeta, que sustenta o bem-estar atual e futuro da humanidade. Tendo em conta que a nossa Associação partilha deste valor – é, aliás, o princípio orientador de tudo o que fazemos – esta parceria com a UNESCO acabou por surgir naturalmente. É um prazer enorme para mim poder firmar esta colaboração. Estou entusiasmado para ver os nossos membros a colocar estes primeiros projetos conjuntos em prática”, reafirma. E concretiza:
“Em primeiro lugar, a UNESCO apoia os novos compromissos da Associação, “Em Harmonia com Todas as Formas de Vida Terrestres: Os Nossos 12 Compromissos em Matéria de Sustentabilidade”. Isto implica envolver todos os nossos membros na concretização de três grandes missões: preservar as tradições de hospitalidade e de gastronomia do mundo, contribuir para a proteção e o desenvolvimento da biodiversidade e, por último, implementar ações diárias para um mundo mais humano. Em segundo lugar, serão conduzidos diferentes projetos-piloto por membros da Relais & Châteaux que se encontrem nas proximidades de
sítios classificados como Património Mundial da UNESCO. O objetivo será promover estes locais e as práticas tradicionais dos mesmos através da conservação da sustentabilidade e do uso da biodiversidade, bem como o respeito pelas culturas locais”.
Recorde-se que já em maio o L’AND Vineyard, no Alentejo, recebeu um jantar para assinalar o Dia Mundial dos Oceanos, e a resposta ao tema deste ano das Nações Unidas “Awaken New Depths”. Neste sentido, os membros da Relais & Châteux fizeram um apelo para a suspensão do consumo de espécies marinhas sobre-exploradas, baseado em dados concretos e validados pela Ethic Ocean – organização ambiental dedicada à preservação dos recursos piscatórios e ecossistemas marinhos. Na ocasião, esteve presente no Alentejo Elisabeth Vallet, diretora da Ethic Ocean. Em redor do mundo, todos os membros da associação foram convidados a organizar ações locais para celebrar -e apelar à necessidade de – a pesca sustentável.
Este ‘call to action’, que é também uma constante da Relais & Châteux – é a forma que a associação tem de manter ágeis e ativos e pertinentes os seus membros – continuará a fazer parte do modus operandi da associação, com esta nova parceria. E terá até direito a monitorização, para garantir que não são apenas intenções que não saem do papel, garante o presidente da entidade.
“As ações [dos membros] são monitorizadas através de dados quantitativos que são medidos e controlados
com base em critérios do nosso Quality Charter. A qualidade é a componente central da estratégia da Relais & Châteaux e, até agora, avaliámos cada uma das propriedades com base em dois tipos de critério: técnicos e emocionais. Nas discussões exaustivas que decorreram a propósito da readaptação dos nossos Compromissos, foi proposto um terceiro critério qualitativo de análise: o coeficiente de sustentabilidade. Dessa forma, esta dimensão será também avaliada nas nossas propriedades a cada dois anos, a par de coeficientes emocionais e técnicos. Os nossos membros têm um timeline preciso a cumprir, e estamos a fazer de tudo para ajudá-los com novas práticas de gestão para a sua propriedade para que consigam atingir uma descarbonização gradual e bem gerida das suas atividades até 2040″.
E recua um pouco no tempo para explicar por que acredita no nível de compromisso de todos os membros da Relais & Châteaux: “No início, o principal cartão de visita de um proprietário Relais & Châteaux era presentar a sua extraordinária propriedade de família, passada de geração em geração. Uma estadia nessas propriedades dava aos hóspedes a oportunidade de aprender mais sobre a região, a história. Acredito que o objetivo dos proprietários atualmente vá para além disso, pois proporcionam uma forma distinta de explorar o mundo à volta da propriedade e de interagir com ele da forma mais consciente possível, ao mesmo tempo que usufruem de um contacto mais pessoal e próximo”, remata Gardinier.
E desengane-se se acha que a prória Relais & Châteux não está também empenhada em cumprir as mesmas exigências que faz às unidades que compõem a associação: ” Estabelecemos um Departamento de Sustentabilidade, responsável por implementar a nossa estratégia global abrangente e dar apoio direto aos nossos membros nas suas transições para um mundo mais sustentável”, diz Gardinier. A par disto, ” o Conselho de Administração da Associação decidiu, unanimemente, estabelecer um quarto órgão governativo: a Comissão de Sustentabilidade. Esta comissão foi criada em fevereiro de 2024 e é composta por sete membros proeminentes da Relais & Châteaux, conceituados no seu domínio. O seu propósito é encorajar, avaliar e aprovar todas as nossas iniciativas antes de serem votadas pelo Conselho de Administração”, garante.