Quando, no final de 2015, a sociedade gestora de capital de risco Menlo Capital comprou uma participação de 64% na Ach Brito foi porque viu na Claus Porto um “potencial enorme para a sua internacionalização”. Já com alguma notoriedade no mercado norte-americano, a Claus apareceu mesmo no programa de Oprah Winfrey, sinal de que tinha pernas para andar em terras do Tio Sam. Aquiles de Brito, o descendente de quarta geração, reduziu a sua participação para 20%, em troca de investidores, que trouxessem capital para novos e maiores voos.
Um parêntesis: as duas marcas nasceram separadas. A Claus nasce em 1887, por mão de duas famílias alemãs: Ferdinand Claus e Georges Schweder. Achilles de Brito entra para a empresa aos 24 anos como guarda-livros (1903) e torna-se acionista cinco anos depois. Na sequência da 1ª Guerra Mundial, a Claus é nacionalizada. É então que Achilles de Brito funda (1918) a sua Ach Brito e, mais tarde (1924), adquire os ativos da Claus. Desde então, as duas marcas carregadinhas de História (então fabricadas no Porto, agora em Vila do Conde) não mais deixaram de estar juntas. Se, até aos anos 30, a Claus já tinha ganho vários prémios internacionais, incluindo na América, a Ach Brito conquistava almas nacionais com o sabonete Patti. Estava fixado o ADN de cada uma.
E disto não se esqueceu Ricardo Cunha Vaz, cofundador da Menlo Capital, quando lá entrou. A ocupar interinamente o cargo de CEO (novo diretor-geral procura-se), é ele quem nos conta como o caderno de encargos foi cumprido para dar gás à Claus, já que a Ach Brito está consolidada. Primeiro, deu-se uma “coerência” à marca: os livros antigos já transmitiam “uma identidade gráfica brutal” – basta ver os primeiros rótulos das embalagens decoradas ao estilo Belle Époque para perceber o seu poder de sedução – , mas era preciso harmonizar e refinar a imagem. Segundo, “devolveu-se à marca outras categorias de produto” para além dos sabonetes: ressurgiram novas coleções, como a Musgo Real (para homem), a Deco (gel de banho, amaciador, creme de mãos, velas, difusores) ou águas de colónia que “tentam captar fragrâncias de várias regiões de Portugal”. Não tardarão os perfumes.
Vendemos como queremos, interagimos com o cliente, contamos a nossa história, com equipas treinadas e formadas, mostrando que isto é muito mais do que um simples sabonete.
Ricardo cunha vaz, cofundador da menlo capital
Por último, reposicionaram-se os canais de distribuição à altura da qualidade do produto e das embalagens, feitas à mão e seladas com lacre (recorde-se que um sabonete Claus custa €14 e um Ach Brito fica-se por €1). Para captar o afluxo turístico em Portugal, abriram três lojas próprias, duas em Lisboa e uma no Porto. “Assim, vendemos como queremos, interagimos com o cliente, contamos a nossa história, com equipas treinadas e formadas, mostrando que isto é muito mais do que um simples sabonete”, justifica Ricardo Cunha Vaz. Para os Estados Unidos da América, optaram por uma loja online, que conta com um armazém próprio em New Jersey, e outra para o resto do mundo, abastecida a partir de Vila do Conde. O reposicionamento da marca obrigou também a arranjar “os parceiros certos”, para distribuir noutras lojas físicas. “Foi mais moroso do que pensávamos, em particular na Ásia.”
No final de 2019, tudo estava pronto para ver a Claus explodir. Mas chega uma pandemia global. Encerram-se lojas. Desaparece o mercado turístico. “A pandemia afetou muito e os números não mentem”, conta o CEO. “Em 2015, a empresa faturava pouco mais de €3M. Em 2019, faturou €6,2M e já gerava resultados positivos”, observa, especificando que €3,6M eram responsabilidade da Claus, dos quais cerca de meio milhão vindos do mercado norte-americano. “Em 2020, caímos para €4,2M, mas no ano passado já recuperámos alguma coisa, fechando nos €4,9M. Levámos uma pancada grande e já não demos lucro.” Ricardo Cunha Vaz não quantifica as perdas, mas adjetiva de “prejuízos com significado, menos de um milhão”, nestes dois anos dificílimos. Mas confiante que regressará aos lucros este ano. Nestes dois anos, “foi muito bom ter a Ach Brito”. Presente nas grandes superfícies, que nunca encerraram, e sem exposição internacional, mostrou-se resiliente e caiu apenas de €2,6 para €2,2M. Mas o importante é que a Claus está agora “muito bem preparada para dar o salto da expansão”. E se já sobreviveu a duas guerras mundiais, há de sobreviver a mais uma…
Este texto integrou o trabalho “As Fénix Renascem”, publicado originalmente na edição da EXAME de maio de 2022