Há quem diga que as memórias que guardamos dos vinhos são muito impactadas por quem nos acompanha quando os bebemos. Como se misturássemos o gosto e as sensações que cada vinho nos provoca com aquelas que sentimos pelas pessoas que estão à nossa volta. É muito possível que isto seja verdade – tenho a certeza de que, se pensar bem, haverá um vinho de que gostou muito em determinado momento, mas que já não lhe soube ao mesmo quando o voltou a beber. Pode ter a ver com o seu humor, com a comida com que o bebeu nas várias ocasiões ou, efetivamente, com o contexto em que estava.
A mim acontece-me recorrentemente – e ainda bem, porque muitos vinhos de qualidade mediana usufruem de memórias bem melhores do que aquelas que às vezes merecem, só porque foram bebidos em boa companhia.
E o mesmo podia facilmente ter acontecido com este champanhe Dom Pérignon x Lady Gaga de 2008, também. Mas a questão é que mesmo que o beba em condições adversas – pode estar triste, com frio, desconfortável, o que queira… – duvido de que ele não lhe vá saber bem.
O primeiro champanhe engarrafado sob a marca Dom Pérignon remonta a 1921 (foi vendido pela primeira vez em 1935), ainda que a sua história comece no século XVII, com o monge beneditino que lhe dá nome. Apesar de ter sido amplamente divulgado que este teria sido o inventor do método tradicional de produção de champanhe, vários registos históricos mostram que a lenda é menos real do que ficaria bem no enredo – já havia quem fizesse champanhe, mas Dom Pérignon terá apenas continuado a aperfeiçoar a técnica nos campos da Abadia de Hautvillers, onde o monge era mestre da adega.
A marca francesa, que pertence à casa Louis Vuitton Möet-Hennessy (LVMH), sempre se afirmou como uma das mais exclusivas na produção de vinho, com champanhe a ser sempre vintage – ou seja, são utilizadas as melhores uvas de um ano apenas, e o champanhe só vê a luz do dia se for excecional. Com um mínimo de oito anos de estágio, os Dom Pérignon foram ganhando prestígio e lugar às mesas mais luxuosas, e com todo o mérito. Entre 1921 e 2012, houve apenas 44 vintages brancos engarrafados, e só muito raramente acontece haver vinhos desta referência por mais de dois anos consecutivos.
Em 1959, a casa começou a produzir champanhe Rosé, que se destacou pela irreverência e delicadeza, continuando a ganhar adeptos ao dia de hoje – até agora, houve 26 Dom Pérignon rosé produzidos.
A edição que foi lançada recentemente, um Rosé de 2008, resulta de uma parceria entre a Dom Pérignon e Lady Gaga – desde o ano 2000 que a marca convida artistas como Andy Warhol, Jeff Koons ou Lenny Kravitz para desenhar as embalagens de alguns vinhos – e representa “a tensão criativa entre Maison e artista”, numa edição limitada em que a embalagem de metal parece deformada, como que a tentar sair de si própria. Sem perder a sua forma clássica e design inconfundível, esta embalagem revela, porém, já um pouco da irreverência que se encontra no champanhe.
Com notas florais a sobressair, é um vinho que pede queijos fortes ou pratos um nadinha mais estruturados, que aguentem a acidez muito promovida por aromas mais verdes, que se juntam no final longo e pronunciado. Com uma bolha fina e um equilíbrio quase perfeito, é um vinho que dispensa muitos comentários – não é por acaso que as edições limitadas rapidamente esgotam, e que ao longo de 100 anos esta referência se mantém entre os melhores champanhes do mundo. A parceria com Lady Gaga traz mais irreverência para a mesa – quem não quer ter uma embalagem rosa metálica a brilhar em momentos de celebração? – sem deixar de mostrar no copo aquilo a que ambas as marcas nos habituaram ao longo dos anos: uma elevada qualidade e consistência.
[Sobretudo] Em tempos de incerteza, brindemos a isso. E a mais edições limitadas que nos façam sonhar.
Em Portugal, pode comprá-lo no Club del Gourmet dos El Corte Inglés Lisboa e Gaia, por €475 a garrafa.