Entram na sala como numa espécie de passo de dança bem ensaiado, em fila, mão estendida e sorriso no rosto. Os quatro sócios-gerentes da Estoril Capital Partners (ECP) e, consequentemente, da Solyd, a promotora imobiliária que nasceu de uma joint-venture entre a consultora de investimento e o European Principal Group da Oaktree Capital Management, são experientes, focados e não perdem tempo a ocupar os seus lugares na mesa que temos à nossa frente, numa pequena sala da sua sede, em Miraflores.
Falando de forma metódica e clara, apressam-se a explicar o que os levou a criar a Solyd, em fevereiro passado: “Achámos que já tínhamos um percurso que nos permitia tornar-nos mais conhecidos, e daí termos criado esta marca nova. A ideia é que as pessoas, daqui a alguns anos, quando pensarem num promotor imobiliário, vejam a Solyd como uma referência. Não há muitos, porque foram desaparecendo ao longo dos anos, sobretudo aquando da crise. Nessa perspetiva, queremos ser um dos principais operadores do mercado”, começa por dizer Gonçalo Cadete. É ele quem assume as rédeas da conversa de cerca de uma hora com a EXAME.
O antigo CFO da Rioforte – que esteve sob escrutínio sobretudo durante 2015, na altura em que a Comissão de Inquérito à resolução do BES o obrigou a responder perante os deputados – explica ainda que a Solyd acaba por ser uma evolução natural da empresa. A Estoril Capital Partners nasceu há cinco anos pelas mãos de Cadete, João Paula Santos e João Pinho Cardão. Poucos meses depois, a equipa foi reforçada por Tiago Belo e mantém até agora a mesma constituição, sendo todos managing partners da organização.
De olhos na classe média
Depois de um tempo dedicados sobretudo à reabilitação, pareceu-lhes óbvio que havia um segmento nacional que não estava a ter a atenção devida: é na classe média que a Solyd está a apostar, com projetos que acreditam ser diferenciadores e que, atualmente, se dividem entre as regiões de Lisboa e de Setúbal. “Neste momento estamos a fazer investimentos bastante fortes para o segmento médio, médio-alto português.
A ideia foi também lançar uma marca cuja reputação temos vindo a construir, para que quando um cliente for à procura de um apartamento e vir um nosso, ter essa referência – com qualidade, de uma empresa que tem uma certa solidez e robustez”, explica João Paula Santos. Para os responsáveis do projeto, o mercado reagiu à crise com a reabilitação e um investimento elevado, mas virados, sobretudo, para turistas e para estrangeiros.
No entanto, recordam, grande parte das famílias portuguesas deixou de ter como comprar uma casa, ou porque não tinha condições financeiras – algo para o qual também contribuiu a quebra na concessão de crédito por parte das instituições bancárias – ou porque os projetos que havia no mercado não correspondiam às suas necessidades.
Nos centros das cidades, salientam, as casas sempre foram mais pequenas e, mesmo que se queira, os projetos não conseguem crescer em escala. Mas os casais continuam a ter filhos e a precisar de ter onde morar, notam com um sorriso. “Há 18 meses, achámos que devíamos, ou que poderíamos, complementar a reabilitação com construção nova para o segmento médio, médio-alto do mercado, porque, na verdade, os portugueses nos últimos anos compraram muito pouco – não só pelo desemprego e pela falta de crédito mas também por falta de produto”, garantem. “E, portanto, começámos a desenvolver produtos para esses segmentos.
O que significa que hoje em dia temos a maior parte da nossa atividade em vários projetos dirigidos precisamente para essa classe, em Lisboa, mas também em Setúbal”, continua Cadete. “Em termos de montantes, isso já representa mais de metade do nosso portefólio. Temos na Alta de Lisboa o projeto ALTEAR, e com o que temos em Setúbal, em Miraflores, na Avenida de Berlim… O investimento total do portefólio bruto, que atualmente conta com 15 projetos, representa cerca de 400 milhões de euros. Temos sete comercializados, dois em comercialização e seis em desenvolvimento”, clarificam.
Potenciar localizações
Com a segurança de um investidor internacional por detrás, e com vários anos de experiência em instituições financeiras, os quatro responsáveis esclarecem ainda que pretendem tornar-se uma promotora de âmbito nacional em breve. “Hoje em dia somos maioritariamente um promotor da Grande Lisboa, mas a nossa ambição é ser um promotor nacional. E queremos complementar essa atividade com outros centros urbanos, o que esperamos fazer num futuro próximo. Quais é que são mais ou menos lógicos para nós? Porto, Coimbra, eventualmente Algarve, embora seja um mercado diferente. No fundo, estes catapultar-nos-iam para uma presença nacional”, começam por referir.
Mas, para já, concentram alguns esforços em Setúbal, onde se orgulham de ter um projeto enquadrado naquilo que chamam “um plano maior”. Esclarecem que estão a construir o Fontaínhas One, ao lado de um jardim público já existente – o Camilo Castelo Branco –, “educativo, ligado à Ciência e a energias renováveis, e que a própria Câmara Municipal de Setúbal está também a apostar fortemente na requalificação daquela zona da cidade“, onde existe bastante atividade empresarial e industrial. A 45 minutos de Lisboa, com praia perto e uma economia saudável, Setúbal tornou-se uma aposta quase óbvia para a Solyd, tendo em conta os clientes a que querem chegar.
“Podemos servir um segmento de pessoas que procura uma segunda habitação, outro em que as pessoas podem trabalhar em Lisboa mas que querem ter melhor qualidade de vida e/ou, então, que trabalham e vivem em Setúbal”, referem. “Entre Lisboa e Setúbal, existe uma atividade comercial e industrial muito importante. E o que vemos é que há quadros que trabalham em Setúbal e que, se calhar se tiverem uma opção no nosso projeto, até ficam lá a viver…”
Lamentam que a fraca capilaridade dos transportes públicos e a ausência quase total destes em algumas zonas do País dificultem as migrações e esperam que haja investimento público nesse sentido, em breve. Sublinham a importância do desenvolvimento imobiliário de zonas consideradas limítrofes às grandes cidades para responder à procura, e apontam, precisamente, a rede de transportes comuns e, mais recentemente, a redução dos preços dos passes mensais para as famílias nacionais como mais-valias, não só para quem compra mas, naturalmente, para quem investe na construção. “Uma das razões pelas quais apostamos na Alta de Lisboa é porque está muito bem servida de transportes”, salientam, exemplificando com as três estações de metro que podem permitir chegar ao ALTEAR – Ameixoeira, Quinta das Conchas e Lumiar.
“E podemos sensibilizar [as entidades responsáveis] e há algumas associações do setor que têm sido bastante vocais sobre isto junto de quem de direito. Portugal, de facto, nos últimos anos, tem tido restrições de investimento – ou por necessidade ou por opção política – em infraestruturas. Há uma grande discussão sobre de que forma agora, que estamos finalmente com superávites em termos orçamentais, podemos usá-los para um maior investimento público.
E parece-nos, a nós, e naturalmente que temos algum enviesamento, que investimentos nos transportes urbanos e suburbanos seriam interessantes”, atiram com um sorriso.
Procura crescente
A título de exemplo, o projeto ALTEAR prevê a construção faseada de dez prédios com 530 apartamentos. A primeira fase, que começou há uns meses, inclui dois edifícios com 101 habitações que deverão estar prontas em 2021. Só na fase de pré-comercialização foram disponibilizados 39 apartamentos vendidos em apenas dois dias. A maior parte dos compradores é portuguesa, muitos deles moradores da Alta de Lisboa que procuravam casas maiores. Num projeto em que o preço médio por metro quadrado ronda os 3 mil euros, é possível encontrar uma habitação que custe entre os 250 mil (para apartamentos com 68 m2) e os 800 mil euros (para T5 com 300 m2).
O início auspicioso do ALTEAR já levou os sócios da Solyd a considerar aumentar o empreendimento, se forem postos à venda mais terrenos, na certeza de que continuará a haver procura sobretudo por parte das famílias portuguesas.
Mas estão ainda a apostar em Miraflores, na Graça – onde têm 46 apartamentos com garagem para comercialização –, nas Avenidas Novas, no Príncipe Real, no Campo Pequeno, na Expo, no Monte Estoril, tal como já foi referido, e no Estoril. Segundo os gestores, depois de um período em que os investidores estrangeiros, turistas ou residentes ajudaram a inflacionar o preço do imobiliário em Portugal, os clientes estão mais atentos ao que é o mercado. E, garantem, estão disponíveis para pagar uma habitação, desde que esteja a ser vendida por um preço justo, que tenha qualidade e que sirva aquilo que são as suas necessidades.
Passado e futuro
Sete anos depois de a economia nacional ter vivido o seu pior ano da década, consequência da crise financeira, os quatro responsáveis da Solyd fazem uma pequena avaliação daqueles que foram os maiores desafios ao começar um negócio numa altura em que investimento era, possivelmente, do que menos se ouvia falar em Portugal. O primeiro, notam, foi convencer “um grande investidor internacional que, após uma crise ultraprolongada, valia a pena investir em Portugal”.
Se hoje em dia é relativamente evidente que o País está com uma saúde recomendável, em 2014 havia muito mais dúvidas do que certezas. “Depois, era preciso convencer os agentes de que íamos fazer um projeto consistente e com escala. Houve vários bancos que acreditaram em nós desde o início, e estamos superagradecidos por isso”, recordam. “Para terem uma ideia, quando em 2015 começámos a falar com os bancos, para muitos deles o primeiro investimento em imobiliário pós-crise foi o que fizeram connosco”, sublinha João Cardão. “Nós não somos as pessoas mais otimistas do mundo, mas achámos que fazia sentido” avançar com o projeto, acabam por rematar, sorrindo-nos.
Entre a conversa com a EXAME, no início de julho, e o fecho desta edição, ainda não havia desenvolvimentos nas fases em que está cada projeto atual da Solyd. No entanto, os quatro responsáveis acreditavam que, até ao final do ano, poderia haver novidades. Para já, estão concentrados sobretudo em fortalecer a marca Solyd – que conta atualmente com 11 colaboradores –, enquanto mantêm a funcionar o braço de exploração de alojamento local da ECP (a Hello Lisbon) e, claro, as atividades de consultoria da empresa-mãe. Numa altura em que todos os olhos estão postos no imobiliário, como uma das grandes promessas económicas do País, a Solyd estará, certamente, debaixo de vários holofotes, durante os próximos tempos. EImobiliário