A Euronext, a bolsa de valores europeia da qual Portugal faz parte, tem “vários pedidos de investidores para a criação de índices de diversidade e igualdade de género nas empresas”, à semelhança do que já sucede com os índices que classificam as empresas cotadas de acordo com os indicadores de sustentabilidade, afirmou Isabel Ucha, presidente da Euronext Lisboa, no painel dedicado ao tema do ESG Talks – Reconstruir o Futuro, um ciclo de conferências que hoje tem início em Carcavelos sobre sustentabilidade ambiental, social e governança corporativa.
À semelhança do que já acontece em relação aos cerca de uma centena de índices de sustentabilidade do mercado Euronext – que são, segundo Isabel Ucha, “uma espécie de cabaz de empresas selecionadas pela dimensão e liquidez, mas também pelo rating da sustentabilidade” –, agora os investidores “olham cada vez com maior atenção” para os indicadores de diversidade e igualdade de género que as empresas apresentam nos road-shows, e que já fazem parte dos ratings de ESG (Environmental, Social and Governance). Contudo, a presidente da Euronext não precisou se está já em preparação a criação de novos índices nessa área.
Os participantes no painel – João Bento, CEO dos CTT, e Luísa Soares da Silva, executive board member do Novo Banco, além de Isabel Ucha – descreveram as preocupações e as iniciativas das respetivas organizações em matéria de diversidade e igualdade de género, referindo também diversos estudos internacionais sobre o tema que indicam que as empresas com maior representatividade são também mais competitivas e resilientes no mercado mundial.
Um desses estudos, referido pela presidente da Euronext Lisboa, foi realizado em 2021 pela Comissão Europeia para apurar as causas da falta de progressão das mulheres na carreira. De acordo com as conclusões, as principais razões são a distribuição das tarefas familiares e domésticas, já que a divisão só acontece em um terço dos casais, os horários longos e pouco estruturados que dificultam o equilíbrio entre vida pessoal e profissional e, por último, “uma questão cultural”, assente no preconceito ainda existente no recrutamento e na promoção das pessoas de acordo com os critérios de diversidade e igualdade de género.
Isabel Ucha admitiu ainda a existência de “discriminação positiva” no recrutamento de mulheres para a Euronext, ao abrigo de uma política para a diversidade iniciada em 2018. E deu como exemplo o seu próprio caso: “Em Portugal, demorei mais dois ou três meses a recrutar um diretor porque queria ter uma senhora.”
A representante do Novo Banco, por seu turno, defendeu que «quando há mulheres com representação nas administrações dos bancos, há discussões mais construtivas”, embora frisando que é importante “criar condições para que as mulheres cheguem a cargos de topo mas também para que sejam ouvidas.”
Para o CEO dos CTT, “interessa pouco perceber as razões que conduzem à diversidade nas organizações, quando a evidência empírica é tão grande. As empresas não podem ignorá-lo”. Considerou ainda que a falta de representatividade das mulheres não se revela ao nível dos cargos superiores das empresas, mas sim no seu percurso até chegarem ao topo. “Se ignorarmos os traços culturais, não avançamos”, disse ainda, reconhecendo que a resolução dos problemas de equilíbrio entre a vida pessoal e profissional “é o maior contributo para a criação de oportunidades de ascensão de mulheres nas empresas.”
Os três oradores mostraram-se pouco favoráveis à criação de quotas para a representatividade das mulheres, embora tenham reconhecido o seu contributo para a paridade de género. “As quotas deviam vir com ações, da parte dos governos e das empresas, para mudarem a cultura e as condições ao nível da parentalidade e da divisão de tarefas”, sugeriu Luísa Soares da Silva. “Senão, só pelas quotas não chegamos lá”, acrescentou.