A música é uma língua que nunca morre. Quem sabe ler uma partitura, sabe lê-la quer tinha sido escrita há dois dias ou há 500 anos. Não só a sua forma é universal, como também o seu conteúdo. A música fala de emoções transversais à humanidade: amor, esperança, alegria, dor, tristeza. É possível ouvir uma canção num idioma desconhecido e, ainda assim, intuir o tema. Por muito que não se perceba a letra, ninguém confunde uma música sobre coragem e triunfo com uma outra sobre amor e perda.
A universalidade, a imanência e a transcendência são dimensões indissociáveis da experiência do ser humano com a música. E são essas dimensões que vão ser celebradas na 33ª edição da Temporada Música em São Roque, uma iniciativa da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML). O programa decorre entre 15 de Outubro e 12 de Novembro, na Igreja de São Roque e na Capela do Instituto de São Pedro de Alcântara.

Considerada uma das melhores e mais antigas temporadas de música de Lisboa, o seu programa inclui, anualmente, algumas das orquestras e coros mais importantes do panorama de música clássica portuguesa. Este ano apresenta obras esquecidas em arquivos nacionais e agora, séculos depois, recuperadas e trazidas para o público. É disso exemplo a estreia de seis motetes de Frei Manuel Cardoso – um dos mestres da polifonia portuguesa – durante o concerto Imanência e Transcendência. Mas antes a temporada abre com o coro da Gulbenkian, num concerto intitulado Luz e Sombra, que oferece uma viagem por músicas para vozes femininas, desde a Idade Média até à atualidade. Outra opção recai sobre Cambarito, um concerto onde serão interpretados vilancicos ouvidos pela primeira vez desde o século XVI. E não é por acaso que desapareceram do panorama musical: foram proibidos em 1723 por D. João V – o lado mais popular destas músicas, que fundiam política, devoção e comédia, parece não ter impressionado o monarca. Como não podia deixar de ser, haverá oportunidade para refletir sobre a pandemia com o concerto In Diae Tribulationis, dedicado à música em tempos de peste e às relações históricas entre o covid e o surto de peste em Lisboa em 1570.

Ao todo são dez concertos que decorrem sempre à sexta, ao sábado ou ao domingo e, como os bilhetes são gratuitos – mais uma iniciativa da SCML para apoiar e difundir a cultura –, não há razão para que não se faça a temporada de uma ponta à outra. Para quem não puder estar presente, haverá transmissões online, e um ciclo de sessões de formação para públicos, via streaming, intitulado Ouvidos Para a Música, com Martim Sousa Tavares, com 20 episódios de 10 minutos cada. Os bilhetes, limitados às lotações, podem ser levantados no Museu de São Roque.