Séculos depois do falecimento do compositor e pianista de música clássica Ludwig van Beethoven, poderá ter sido descoberto o mistério por detrás dos seus muitos problemas de saúde. O músico alemão, que morreu vítima de insuficiência hepática e renal aos 56 anos, sofreu de várias doenças ao longo da sua vida, incluindo problemas gastrointestinais, ataques de iterícia, insuficiência hepática grave e surdez.
Uma nova investigação, publicada recentemente na revista científica Clinical Chemistry, revelou que o músico tinha quantidades muito elevadas de chumbo no seu organismo. O grupo de cientistas, pertencentes ao centro de estudo Ira F. Brilliant Center for Beethoven Studies, da Universidade de San Jose, nos Estados Unidos, analisou duas madeixas de cabelo do compositor, detetando, para além de elevadas concentrações de chumbo, outros elementos que permanecem no seu cabelo quase 200 anos após a sua morte.
Para a investigação, foram utilizados dois métodos para determinar o nível de chumbo presente em duas amostras autenticadas de cabelo do compositor. A primeira madeixa autenticada, conhecida como Bermann – e que terá sido cortada entre 1820 e 1827 – mostrou 64 vezes mais chumbo do que o nível esperado – o nível normal desta substância no cabelo é inferior a quatro microgramas. Já a segunda madeixa, denominada Halm-Thayer – que Beethoven terá entregue ao pianista Anton Halm em 1826 – revelou 95 vezes mais chumbo do que nível normal. Ambas as amostras de cabelo do pianista foram autenticadas como sendo de Beethoven recorrendo a análises de ADN. Durante a época em que Beethoven viveu, era comum guardar-se madeixas de cabelo de entes queridos ou de pessoas famosas, o que explica a sua existência até aos dias de hoje.
Para além do chumbo, as amostras estudadas continham também níveis bastantes elevados de arsénio e mercúrio – cerca de 13 a 14 vezes superiores à quantidade esperada. Todas são substâncias que os investigadores acreditam terem-se vindo a acumular ao longo de décadas através do consumo de comida e bebida com estes componentes – na época era comum que certos alimentos e o vinho envolvessem a adição de acetato de chumbo, utilizados enquanto adoçante e conservantes.
Contudo, terá sido o chumbo o principal responsável por vários dos problemas de saúde do compositor, tais como a sua surdez. Nas suas conclusões, os investigadores explicam que os níveis elevados de chumbo idênticos aos encontrados no cabelo de Beethoven estão normalmente associados a doenças gastrointestinais e renais e à perda da audição. Contudo, não seriam o suficiente para provocar a morte do compositor, tendo sido apenas um dos fatores responsáveis que contribuíram para os seus problemas de saúde. “Estes níveis são considerados como envenenamento por chumbo”, explicou Nader Rifai, professor na Universidade de Medicina de Harvard e um dos autores do estudo.
Os resultados desta investigação surgem depois de, no ano passado, uma equipa internacional de investigadores ter publicado um relatório onde revela que o músico tinha fatores de risco genéticos significativos para doenças do fígado e infeções por hepatite B antes da sua morte. Este estudo, feito a partir de madeixas do seu cabelo, recorreu a análises de ADN de Beethoven para determinar a veracidade do material genético utilizado. Contudo, não tendo os resultados respondido às perguntas sobre as possíveis causas da sua surdez, a equipa de investigadores, disponibilizou o material genético autenticado de Beethoven ao público, com a esperança de que cientistas de todo o mundo pudessem ajudar a resolver o mistério por detrás dos problemas de saúde do músico.
A causa dos problemas de saúde que levaram ao falecimento do compositor tem vindo a ser estudada por vários cientistas há décadas. Aliás, desvendar o mistério por detrás das suas doenças terá sido um dos últimos desejos de Beethoven. O compositor expressou o seu desejo de que as suas doenças fossem estudadas e partilhadas. Numa carta, conhecida como Testamento de Heiligenstadt, de 1802, o compositor escreveu aos irmãos, pedindo que ao seu médico que determinasse e partilhasse a natureza da sua “doença” quando Beethoven morresse.
O estudo marca a primeira vez que os níveis de chumbo foram estabelecidos para Beethoven, juntando-o a outros fatores que terão contribuído para os problemas de saúde, como a predisposição genética, infeção por hepatite B e elevado consumo de álcool.