Vale Torto termina subitamente quando a Rua do Povo começa a estreitar, comprimida pelos muros de pedra exteriores das últimas duas moradias da aldeia, situada na freguesia de Seixo da Beira, Oliveira do Hospital. Passando pelo minúsculo ponto no mapa, segue-se campo aberto, de vegetação seca e rasteira. Para avançar, é preciso tomar por uma estrada rural de terra batida, aparentemente intransitável, sinuosa e esburacada. As coordenadas indicam que o destino fica apenas a 1 200 metros, mas percorrer a distância demora quase o triplo do tempo habitual, tantos são os solavancos, que fazem o carro parecer um barco a navegar à deriva em alto-mar, num dia de borrasca. Não há sinais de civilização e a ausência de árvores de copa frondosa faz recordar os grandes incêndios de outubro de 2017, que mataram 13 pessoas naquele município. O novo desenho da natureza permite, hoje, observar a olho nu a encosta poente da serra da Estrela. Logo depois de uma curva apertada à esquerda, a viagem chega finalmente ao fim. A nuvem de pó dissipa-se lentamente. O silêncio aqui é total.
Do lado de fora de um portão selado a cadeado, as placas não deixam margem para dúvidas. Aqui, num terreno antes conhecido como Quinta dos Sete Poços, dá-se de caras com a porta da frente do autodenominado Reino de Pineal, lar de uma misteriosa seita constituída por, pelo menos, quatro dezenas de pessoas (há quem fale de quase uma centena), que se instalou naquele local em julho de 2020, com o objetivo de criar um “Estado soberano, autossuficiente e ecológico”, segundo documentos que a VISÃO consultou. As placas anunciam a “fronteira”, mas alertam os forasteiros de que é proibido ultrapassar as vedações.