Zeinal Bava, Henrique Granadeiro e outros dois ex-administradores da Portugal Telecom (Luís Pacheco de Melo e Amílcar Morais Pires) vão ter de pagar coimas por não terem revelado nos relatórios e contas da antiga PT todas as informações sobre o verdadeiro investimento em papel comercial do Grupo Espírito Santo (que chegou perto dos 900 milhões de euros) entre 2012 e 2014. O Tribunal da Relação de Lisboa decidiu manter a condenação destes quatro ex-administradores da PT, no processo em que foram condenados pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS) de Santarém.
No acórdão ao qual a VISÃO teve acesso, os juízes decidiram que Zeinal Bava vai ter de pagar 310 mil euros, Henrique Granadeiro 420 mil euros, Luís Pacheco de Melo 300 mil euros e Amílcar Morais Pires 180 mil euros. Ao todo, as coimas ultrapassam a quantia de 1,2 milhões de euros. Já o juiz Eurico Reis, presidente daquela seção do tribunal, apresentou um voto de vencido por discordar de algum conteúdo do acórdão. Frisando não se esquecer que quando os arguidos “ocupavam postos de direção na anteriormente designada Portugal Telecom, o valor dessa empresa, uma das mais importantes e economicamente relevantes, em termos de acréscimo de riqueza ao produto interno do país, caiu a pique”, entendeu que algumas das coimas dos ex-administradores deviam ter sido reduzidas, mas nunca poderiam ser suspensas, porque isso significaria “um desvalor ético-social” das suas condutas.
Crítica, aliás, que nesse voto de vencido deixou à CMVM, por ter suspendido a pena da Pharol, antiga PT: “Porque os tribunais são entidades reguladoras, para mais dotadas de uma especial independência e isenção, nos processos que são submetidos ao seu julgamento não é apenas a conduta daqueles a que é imputada a prática de infrações que tem de ser apreciada, tendo também de o ser a atuação dos reguladores legalmente habilitados para aplicar as correspondentes coimas. Essa é uma das razões pelas quais os juízes são – têm de ser – titulares de um poder de soberania autónomo e independente”.
Neste processo a CMVM condenou a Pharol a uma coima de 1 milhão de euros, mas suspendeu-a por dois anos em dois terços do valor. OTribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS) manteve a coima no mesmo montante, mas suspendeu-a na totalidade e por um período de três anos, por entender que a operadora tinha revelado um “sentido crítico” sobre a sua conduta.
Críticas a Bava e a Granadeiro
Na decisão datada de 12 de fevereiro, os magistrados Carlos Marinho, Ana Pessoa e Eurico Reis concluem que a pena de Zeinal Bava não pode ser suspensa, pois o ex-presidente da Comissão Executiva da PT não se arrependeu das suas ações: “Não está minimamente convencido de ter atuado de forma ilícita. Consequentemente, o arrependimento é impossível. Não se pode deixar de constatar (…) que a sua consciência não está formada para o respeito às obrigações ajuizadas, como se vê da tese de desresponsabilização e não aceitação da culpa reiterada no presente recurso.” Para os juízes que analisaram os recursos, Bava “não assume o desvalor” do que fez e “não assume repulsa” pela sua conduta passada, e, “menos ainda, revela vontade de reconstruir a sua individualidade de acordo com critérios de respeito escrupuloso pelos comandos legais”.
Os juízes chegaram à mesma conclusão sobre o não-arrependimento de Henrique Granadeiro. O ex-presidente do Conselho de Administração da PT invocou ainda que auferira fracos rendimentos nos últimos anos para pedir uma suspensão do pagamento da coima. Mas os magistrados do Tribunal da Relação de Lisboa não se deixaram convencer: “Se um determinado indivíduo recebeu rendimentos milionários durante trinta anos e, no curto período de dois anos não teve rendimentos, não se pode extrair daí a sua indigência ou o seu nível médio. Não é de qualquer forma, de indigência ou dificuldades económicas o quadro que resulta dos autos, nem sequer no que tange à curta amostragem de que se dispõe.”
Na decisão judicial, diz-se aliás que ficou provado “algo bem distinto”: que Granadeiro “revela rendimentos relevantes”. Granadeiro, que tem hoje 77 anos, obteve uma remuneração anual de 1.047.028 milhões em 2014, 667.457milhões em 2013, 1.270.312 milhões em 2012. Já no ano de 2019, anos após a sua saída da PT, declarou, para efeitos de IRS, 84.428.40 euros brutos. É ainda proprietário de um apartamento no centro de Lisboa, avaliado em mais de 360 mil euros pelas Finanças, além de um prédio urbano em Reguengos de Monsaraz e um prédio rústico em Borba.
“Algo de muito claro se extrai, apesar das referidas limitações, deste material acolhido como provado. Os elementos relativos às condições de vida do Arguido, apurados, de forma alguma aconselham a suspensão da execução da coima”, concluiram os juízes.