No dia em que Lucília Gago comentou, publicamente, pela primeira vez, o processo que levou à demissão do primeiro-ministro António Costa, a Procuradora-Geral da República (PGR) desvalorizou o facto de o Ministério Público (MP) ter deixado a Polícia Judiciária (PJ) de fora da investigação que resultou na Operação Influencer, o que, como avançou a VISÃO – na sua edição de 16 de novembro –, provocou mal-estar no interior daquela polícia.
“Nesta situação, e em muitas outras, por vezes [o MP] não é coadjuvado por uma polícia criminal concreta”, disse Lucília Gago, acrescentando que “isso não representa nada de especial”. A Procuradora-Geral da República falava, aos jornalistas, à margem do III Fórum Nacional contra a Violência Doméstica, que se realizou na sede da PJ, na Rua Gomes Freire, em Lisboa.
Ja na sua intervenção, no âmbito desta iniciativa, Lucília Gago elogiou a relação entre MP e PJ, ao longo dos anos, considerando que ligação entre os dois organismos “deve ser enaltecida”, “sempre que possível reforçada” e “nunca, em circunstância alguma, colocada em causa” ou “questionada”. A Procuradora-Geral da República reservou, ainda, palavras de simpatia, que dirigiu o diretor nacional da PJ, Luís Neves, também presente. “É com enorme gosto que venho sempre a esta casa cujo prestígio é incontornável”, afirmou.
Recorde-se que os procuradores do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) – João Paulo Centeno, Hugo Neto e Ricardo Lamas – terão conduzido o inquérito por ação direta, sem recorrerem a nenhum órgão de polícia criminal. A Polícia de Segurança Pública (PSP) e a Autoridade Tributária (AT) terão sido apenas ativadas para ações (posteriores) no terreno.
De acordo com a Lei de Organização da Investigação Criminal (LOIC), a PJ tem competência para investigar crimes económico-financeiros, como estão classificadas as suspeitas que envolvem os negócios do lítio, do hidrogénio e do centro de dados de Sines. Mas, observando o histórico, os tribunais portugueses têm validado as decisões anteriores do MP, que descartam a PJ, pois consideram que a LOIC se trata, apenas, de “uma lei para a organização das polícias”, que não vincula o MP, mantendo-se este como titular do processo, e com plenos direitos – constitucionais – para decidir como o conduzir.
A reação da PJ, na manhã de 7 de novembro – dia das buscas –, foi de “estupefação”, confessou, à VISÃO, fonte da PJ, que pediu anonimato. Já um quadro daquela polícia disse à VISÃO que “a PJ tem sido frequentemente ultrapassada pelo MP, quando convém à PGR. Já aconteceu antes. O que está a acontecer é que a LOIC está a ser completamente escamoteada, com base em argumentos que não são reais. Isso permite que o MP investigue à sua maneira. O MP pode ser o titular do inquérito, mas não é polícia. E, neste caso, a PJ seria a melhor escolha, claramente”, afirmou a mesma fonte.