Sem prejuízo “de responsabilidades individuais” que cabem à justiça apurar, o primeiro-ministro demissionário convocou os jornalistas, este sábado, para pedir que não se confunda atos ilícitos com pressão para desburocratizar, incentivando o investimento estrangeiro no país. “A lei não se cumpre na paralisia da decisão”, argumentou, depois de ter pedido desculpa aos portugueses pela escolha do seu chefe de gabinete, Vítor Escária, que tinha cerca de 76 mil euros escondidos no seu escritório em São Bento.
Costa explicou que não estava a “interferir em processo judicial nenhum” e que todo o Governo está disponível para colaborar com a justiça, ressalvando: “À justiça o que é da justiça e à política o que é da política “.
Isto “significa que ao futuro Governo de Portugal – quem quer que seja o primeiro-ministro ou os seus membros – tem de ser garantida a liberdade da ação política para prosseguir uma estratégia legítima”, continuou o chefe do Executivo, que assumiu, neste sábado, também que não voltará a desempenhar mais cargos públicos.
Quanto aos negócios que deram origem a esta investigação, considerou ser seu “dever esclarecer que promover o desenvolvimento do país, eliminar burocracia, promover projetos ambientais são prioridades políticas deste Governo, que exigem determinação – sempre no estrito respeito pela lei”.
Para Costa, o “simplex” administrativo que o seu Executivo estava a levar a cabo é motivo de orgulho, uma vez que “a simplificação promove a transparência”. Tal como é motivo de orgulho os “56 mil milhões de euros” que o Governo conseguiu angariar em investimento estrangeiro, nos últimos oito anos, e que criaram “mais de 640 mil novos postos de trabalho”, disse, ressalvando que “este esforço é regulado por lei, está sujeito a fiscalização e nunca pode resultar de qualquer decisão arbitrária de um qualquer membro do Governo”.
António Costa apresentou a sua demissão na última terça-feira, 7, depois de se saber que o nome do primeiro-ministro foi mencionado em escutas a terceiros, no âmbito da Operação Influencer, uma investigação sobre alegados favorecimentos em negócios do hidrogénio e do lítio. A Polícia Judiciária e o Ministério Público procederam a buscas e detiveram cinco suspeitos, entre eles o então chefe de gabinete de Costa, Vítor Escário, de quem agora o primeiro-ministro se diz “envergonhar”. “Mais do que me ter magoado pela confiança traída, envergonha-me perante os portugueses, a quem tenho o dever de pedir desculpa”, assumiu Costa.
Afastou-se ainda das acusações que atingem o advogado Diogo Lacerda Machado, seu conselheiro e até agora tido como o seu “melhor amigo”, que foi também detido. O primeiro-ministro reafirmou a sua surpresa e quis descolar-se da relação pessoal: “Há muitos anos que [Lacerda Machado] não colabora neste gabinete, não tinha qualquer mandato para fazer o que quer que seja neste caso. Nunca falou comigo a respeito deste assunto em circunstância alguma e, apesar de, num momento de infelicidade, ter dito que ele era o meu melhor amigo, a realidade é que um primeiro-ministro não tem amigos, e quanto mais tempo passa menos amigos tenho….”.
“O que quer que Lacerda Machado tenha feito, nunca o fez com a minha autorização nem nunca falou comigo sobre este assunto”, reafirmou.
Perante a demissão do primeiro-ministro, o Presidente da República optou por antecipar as eleições legislativas para 10 de março, dando margem ao Parlamento para aprovar o Orçamento do Estado de 2024.