1 – Bloqueio da Ponte: o princípio do fim
A mais grave crise política com que o Governo de Cavaco Silva teve de lidar ficou conhecida como “Bloqueio da Ponte”. Motivados pelo aumento de 50% nas tarifas das portagens da Ponte 25 de Abril, em pleno verão, milhares de automobilistas iniciaram um protesto que, ao terceiro dia, culminou numa operação de bloqueio da ponte, com a ajuda de camionistas. O Governo, comandado por Fernando Nogueira (Cavaco estava na Grécia), ordenou uma intervenção policial que foi recebida com pedradas. Os confrontos intensificaram-se até que, na madrugada de 25 de julho, um rapaz de 18 anos foi atingido por uma bala de borracha, ficando paraplégico.
2 – Propinas: “Não pagamos!”
Precedida de uma guerra sem precedentes contra a Prova Geral de Acesso, a luta contra o aumento das propinas foi longa e tornou-se numa das maiores dores de cabeça do final do cavaquismo. Na altura, Passos Coelho era líder da JSD e, apesar de ter concordado com a introdução das propinas, discordou do modelo adotado pelo governo. Foi uma época de concentrações, RGAs (reuniões gerais de alunos), debates, ocupações, greves e, claro, manifestações. A mais polémica de todas realizou-se em novembro de 1994 e ficou marcada pela violência policial contra os estudantes. Couto dos Santos, então ministro da Educação, acabou demitido.
3 – O veto à Lei dos Coronéis
Cavaco Silva queixou-se, em diversas ocasiões, das obstruções levantadas pelo Presidente Mário Soares à sua atividade de primeiro-ministro. Uma das primeiras foi consubstanciada no veto à chamada “Lei dos Coronéis”, que previa a redução de elementos no quadro de oficiais das Forças Armadas, das quais era Comandante Supremo o PR. A Assembleia da República acabou por aprovar o diploma, meses mais tarde, depois de o Governo ter introduzido algumas alterações.
4 – O discurso das “forças de bloqueio”
A segunda maioria absoluta de Cavaco foi marcada pelo desgaste das relações entre o primeiro-ministro e o Presidente da República a tal ponto que em 1993 vários jornais escreviam sobre a eventualidade de haver eleições antecipadas. Tal não chegou a acontecer, mas ficaram célebres várias queixas de Cavaco em relação a Soares. “As forças de bloqueio ao Governo têm um rosto”, acusou num congresso do PSD. “Podem ficar nos palácios, ir aos jantares, fazer intrigas, mas deixem-nos trabalhar”, disse, ainda, num comício no Castelo de S. Jorge.
5 – ‘Portugal: que Futuro?’ visto do Pulo do Lobo
O auge do mal-estar entre Belém e S. Bento deu-se a 7 de janeiro de 1994, dia em que teve início o congresso Portugal: que Futuro?, patrocinado por Soares. Várias figuras anti-Cavaco juntaram-se em torno de um manifesto que era demolidor para o primeiro-ministro. Mário Soares abriu o congresso, que não foi poupado nas críticas ao Governo. Ao seu melhor estilo, Cavaco nunca comentou o evento. Limitou-se a referir que, à hora do discurso de Soares, estava no Pulo do Lobo, Alentejo profundo, a comer caracóis.
6 – ‘O Independente’: o detonador de crises
O maior pesadelo do cavaquismo nasceu em maio de 1988 sob o nome O Independente. Dirigido por Miguel Esteves Cardoso e Paulo Portas, este jornal depressa se transformou numa “máquina de triturar políticos”, como lhe chamaram Filipe Santos Costa e Liliana Valente, autores do mais recente livro sobre o fenómeno. As principais vítimas d’O Independente, que ficará na História por ter ajudado a desmontar o poder de Cavaco, foram alguns dos mais destacados cavaquistas Fernando Nogueira, Braga de Macedo, Costa Freire, Duarte Lima, João de Deus Pinheiro, Leonor Beleza, Miguel Cadilhe, etc.
7 – Caso BPN: uma questão de honra
Num futuro volume da autobiografia política de Cavaco Silva não poderá faltar um capítulo sobre o escândalo financeiro que estoirou durante o seu primeiro mandato presidencial: o caso BPN. Cavaco foi apanhado na teia por ter sido acionista (tal como a filha e o genro), entre 2001 e 2003, da Sociedade Lusa de Negócios (dona do BPN) e por ter lucrado mais de 145 mil euros quando vendeu as suas ações (comprou por um euro e vendeu por 2,4). Este caso beliscou os maiores ativos de Cavaco: a seriedade, a honorabilidade e a credibilidade.
8 – Estatuto dos Açores
Em 2008, o Presidente da República interrompeu as suas férias para fazer uma declaração ao País sobre o Estatuto Político-Administrativo dos Açores, uma lei ordinária através da qual Cavaco previa que estivessem a tentar restringir os poderes e as competências do PR. Em Belém, este caso foi visto como a primeira tentativa de desgastar o Presidente e a primeira vez que José Sócrates, enquanto primeiro-ministro, lhe terá faltado à palavra. O diploma foi chumbado pelo Tribunal Constitucional e devolvido à AR.
9 – Escutas ou um problema de vigilância
Em cima das legislativas de 2009, foi noticiado que havia consultores de Belém a ajudarem na campanha de Manuela Ferreira Leite contra Sócrates, atribuindo ao PR uma evidente falta de isenção. Vários socialistas queixaram-se desta parcialidade de uma forma que levou Fernando Lima, assessor do PR, a questionar-se, perante uma jornalista do Público, se Belém não estaria sob vigilância. O caso das escutas incendiou o verão e terminou com uma declaração de Cavaco a confirmar a existência de “vulnerabilidades” no sistema de comunicação da Presidência da República. O assessor em causa foi afastado da ribalta, mas continua em funções, em Belém.
10 – Pensão que não paga as despesas
A maior crise pessoal do mandato de Cavaco Silva foi motivada por uma declaração sobre pensões, num momento crítico para as finanças dos portugueses. “Eu descontei, quase 40 anos, uma percentagem do meu salário (…). Irei receber 1 300 euros por mês. Quanto ao fundo de pensões do BdP (…) ainda não sei quanto irei receber. Tudo somado, quase de certeza que não vai chegar para pagar as minhas despesas porque eu não recebo salário como PR”, disse Cavaco, em 2012. Os portugueses não perceberam bem a polémica do Estatutos dos Açores e acharam o caso das Escutas uma questão política, mas este episódio das pensões perceberam-no bem. Foi fatal para Cavaco.