Seis meses após a primeira invasão à Ucrânia, a Rússia está a ser confrontada com um grave défice tecnológico. Após a utilização de armas muito mais do que o previsto, o país liderado por Vladimir Putin está limitado em termos de stock de antigas munições da Era Soviética e a capacidade em adquirir equipamentos eletrónicos que necessita para manter o esforço de guerra está cada vez mais comprometida, devido às sanções impostas pelo Ocidente. Com as importações suspensas, os militares russos estão a recorrer a chips destinados a eletrodomésticos para utilizar em equipamentos militares, como armas e mísseis.
O acesso a chips de alta tecnologia que a Rússia pode – ou não – conseguir ter, pode vir a marcar a evolução (ou o desfecho) da guerra. A Ucrânia está empenhada em garantir que esta aquisição seja fortemente limitada, enviando alertas internacionais aos aliados ocidentais para que o inimigo russo não consiga obter o que necessita da sua “lista de compras”. O primeiro-ministro ucraniano, Denys Shmyhal, sublinhou que a escassez de produtos está a tornar.se um fator decisivo na evolução da guerra. “De acordo com as nossas informações, os russos já gastaram cerca de metade do seu arsenal de armas”, referiu, acrescentando que não têm qualquer possibilidade de restabelecer os stocks.
A “lista de compras” elaborada pelo Kremlin, a que o jornal Politico teve acesso, está dividida em três categorias prioritárias e contém semicondutores, transformadores, conectores, invólucros, transístores, isoladores e outros componentes, produtos que Moscovo costumava encomendar às empresas do Reino Unido, da Holanda, da Alemanha, do Reino Unido, entre outras.
O programa de aquisições militares russo é “extenso, bem financiado, e tem uma enorme base militar e industrial que produz material”, explica James Byrne, diretor do Open-Source Intelligence and Analysis Research Group, do centro de defesa e segurança britânico RUSI, citado pelo jornal Politico. “Mas agora gastaram tanto na Ucrânia, que precisam de um grande volume de novos fornecimentos. E as sanções vão tornar-lhes [a tarefa] mais difícil…Portanto, vão ter de dar prioridade às coisas críticas, e é por isso que estamos a ver estes documentos. É óbvio que pensamos que eles estão a lutar para garantir os abastecimentos”, conclui.
Problemas no bloqueio de exportação
Os países ocidentais fortaleceram as sanções à Rússia, com controlos de venda de chips mais rígidos, com o objetivo de diminuir a capacidade militar russa. No entanto, há quem defenda que este regime de controlo de exportação pode não conseguir impedir as transferências de tecnologia. “Depois de os chips saírem das fábricas, é muito difícil ter a certeza para onde vão parar”, refere Diederik Cops, investigador na organização Flemish Peace Institute, citado pelo Politico. O medo do presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, é que a Rússia consiga obter os produtos através de países intermediários, como a China ou o Irão, que compram a tecnologia e depois vendem-na a Moscovo.
“Países como a Coreia do Norte e o Irão acumularam anos de perícia para contornar as sanções. A Rússia preparou-se certamente para lidar com isto nos últimos meses…Os russos podem também contar com a aptidão histórica para criar os tais canais, também foi rotina durante a Guerra Fria. E existem longas fronteiras com os países vizinhos e uma grande rede de países aliados com quem trabalhar”, explica Cops.
Os EUA, a Europa e outros aliados ocidentais criaram regimes de licenciamento para impedir que as empresas exportassem tecnologia militar potencial para clientes que pudessem ser considerados um risco para a sua segurança. Mas é “um enorme desafio monitorizar os canais ilegais de proliferação, e mesmo os canais legais, para ver quem é o utilizador final”, diz ainda o especialista.