Passaram onze meses desde que o ciclone Idai devastou o centro de Moçambique, e cerca de nove meses desde que o Kenneth destruiu parte da zona norte do país. E apesar de os relatos que chegam do terreno darem conta de que ainda está praticamente tudo por fazer, o Fundo Monetário Internacional mostrou-se satisfeito com a evolução da economia moçambicana.
O subdiretor-geral do FMI, Tao Zhang, visitou aquele país entre os dias 8 e 11 de fevereiro, e revelou-se “satisfeito com o facto de a economia moçambicana se estar a recuperar dos efeitos dos ciclones tropicais Idai e Kenneth no ano passado. Para que o crescimento acelere ainda mais e se torne mais inclusivo, é importante que as políticas económicas permaneçam prudentes e as reformas continuem. Isso inclui ações para o fortalecimento da governação e transparência, enfrentar vulnerabilidades climáticas, e alcançar as metas do desenvolvimento sustentável”, referiu aquele responsável num comunicado libertado no final da sua visita.
Por outro lado, o Instituto Nacional de Estatística de Moçambique deu conta, há uns dias, de que o custo de vida no país não tem parado de subir, com destaque para os preços dos bens alimentares, que em janeiro registaram um aumento de 1,5% em relação ao mês anterior. Em comparação com janeiro de 2019, a subida é de 7,66%. Um cenário de que a VISÃO tem vindo a dar conta, e que se tem vindo a agravar nos últimos meses, com a escassez de alimentos a pesar na oferta.
Apesar dos esforços que têm sido empreendidos por organizações humanitárias e pelas próprias populações para refazer os campos e as colheitas, a verdade é que o clima não tem dado muitas tréguas e as colheitas de março – que seriam as primeiras pós-ciclones e fundamentais para garantir a sobrevivência das populações – estão também em risco.
Isto numa altura em que milhares de pessoas estão sinalizadas como estando em insegurança alimentar pela Rede dos Sistemas de Aviso Prévio contra a Fome (FEWS NET, na sigla em inglês).
Os olhos do FMI, entretanto, estão também postos no norte do país, onde um gigantesco complexo de exploração de gás deverá animar a economia de Moçambique durante os próximos anos, embora a região tenha estado a sofrer com uma onda de violência que nos últimos três anos já matou centenas de pessoas e desalojou milhares de famílias. Apesar de haver pistas que ligam os ataques a aldeias e cidades a organizações terroristas, as autoridades internacionais também não descartam que os negócios de gás possam ter algo a ver com o assunto.
“O setor do GNL em desenvolvimento no norte de Moçambique tem um potencial elevado e, dadas políticas e salvaguardas apropriadas, pode tirar milhões de pessoas da pobreza. Também ajudará a reduzir gases de efeito estufa, embora combustíveis com emissão zero ainda serão necessários na luta contra as mudanças climáticas”, referiu Tao Zhang. Recorde-se que integram estes consórcios de exploração de gás gigantes como a Total ou a Exxon Mobil.
Seja como for, o movimento positivo da economia moçambicana fez com que o FMI reforçasse a sua disponibilidade para “fortalecer ainda mais sua colaboração com as autoridades moçambicanas e ajudá-las a executar sua agenda de reformas.”
Recorde-se que o apoio do Fundo ao país foi retirado aquando do escândalo das dívidas ocultas, descoberto em 2016, e que levou Christine Lagarde, então presidente da instituição, a suspender a assistência financeira prestada a Moçambique, e que previa uma ajuda de 282,9 milhões de dólares. A instituição acabou por libertar alguma verba após o Idai, para ajudar à recuperação da região da Beira, mas apesar de repetir que quer estreitar a cooperação com aquele país, tarda em apresentar uma data e uma modalidade em que o vá fazer.
Enquanto isso, cerca de 90 mil pessoas continuam a viver em campos de reassentamento, depois de os ciclones as terem deixado sem nada, e de ainda não haver uma alternativa aos espaços de emergência criados logo após a tempestade tropical.