A greve dos agentes da polícia civil e militar no Estado do Espírito Santo, sudeste do Brasil, desde sábado, está a assustar a população devido aos crescentes casos de assaltos, saques e mortes violentas resultantes da falta de policiamento.
Em declarações à Lusa, Rodrigo Pereira Valente, bancário de 35 anos residente em Vitória, capital do Espírito Santo, disse que o ambiente é “muito tenso”.
“As pessoas estão com medo de abrir os comércios e não temos serviços públicos como transportes e escolas funcionando. Todos estão com medo dos bandidos. Eles estão se sentindo à vontade para cometerem crimes porque não tem nenhum policial para os deter. Um amigo meu foi assaltado dentro do seu carro por um criminoso armado”, disse.
Na segunda-feira, o Governo Federal começou a enviar militares para Vitória numa ação de emergência insuficiente para acalmar a população.
Para Rodrigo Pereira Valente, a presença dos militares é ainda pouco sentida, porque os miliares não têm poder de polícia.
“Vi carros do exército, mas como os militares ainda não tem poder de polícia acho que estão aqui mais para trazer uma sensação de conforto (…) Ninguém da minha família está saindo de casa, eu mesmo não estou indo trabalhar desde ontem”, garantiu.
Carlos Mattoso, empresário de 38 anos, disse à Lusa que mesmo em Alegre, uma pequena cidade do interior de Espírito Santo, o clima de apreensão é forte entre os moradores.
“Ontem (segunda-feira) foi assustador. Nenhum comércio estava aberto e ouvimos relatos de muitos saques nas cidades próximas. Aqui mesmo [em Alegre] ficou tudo fechado. Estou evitando sair com minha família na rua”, relatou.
“Vi num telejornal local que aconteceram arrastões nas estradas e assaltos em pelo menos trinta cidades da região”, acrescentou.
Rodrigo Pereira Valente contou que tem recebido pela aplicação de mensagens WhatsApp imagens de pessoas fazendo justiça com as próprias mãos.
“Vi vídeos e recebi relatos de pessoas prendendo bandidos e defendendo lojas armados. A todo a hora surgem relatos de pessoas fazendo justiça com as próprias mãos”, afirmou.
Os agentes da polícia de Espírito Santo reivindicam aumentos salariais já que não têm atualizações há alguns anos, e exigem ainda o pagamento de subsídios, além de criticarem as condições de trabalho, que classificam como más.
Como por lei eles não podem organizar greves, já que o policiamento é um serviço público essencial, são as famílias dos agentes que estão na frente dos quarteis e esquadras, impedindo-lhes a saída.
“O Governo (de Espírito Santo) tem vindo a tratar da segurança com desdém, está a precarizar os serviços, não investe na segurança e não dá valor ao pessoal”, disse, na segunda-feira, o presidente do Sindicato de Polícias Civis estadual, Jorge Emiliano Legal, à agência Efe.
Nos últimos três dias houve um aumento da criminalidade, principalmente de “homicídios, roubos e furtos”, os quais resultaram, até ao momento, em 62 mortes, um recorde histórico para Vitória em fevereiro”, afirmou.
Segundo o dirigente sindical, a cidade vive um “verdadeiro caos” no domínio da segurança e os seus habitantes estão nervosos perante os assaltos que têm ocorrido desde que os agentes decidiram entrar em greve.
Desde sábado que familiares dos polícias militarizados, que exigem um maior investimento para garantir o bom exercício das suas funções assim como um “reajuste salarial”, se têm manifestado e impedindo a saída dos agentes e viaturas dos quartéis.
Os familiares dos polícias militares lideram as ações de protesto porque os agentes têm estatuto de soldados e o Código Penal Militar pune com uma pena de até dois anos de prisão a sua participação em greves ou manifestações.
O Ministério da Defesa autorizou o envio de efetivos das Forças Armadas “para garantir a lei e a ordem” na cidade, respondendo a um pedido do governador César Roberto Colnago à Presidência da República.
“Quero ressaltar a inflexível determinação para restaurar e recuperar a normalidade (por parte do Governo). Estou certo de que com o apoio das forças locais, estaremos nas ruas para garantir a integridade das pessoas e das propriedades”, afirmou o ministro da Defesa, Raul Jungmann, em conferência de imprensa.
Raul Jungmann indicou que o exército começou a atuar nas ruas de Vitória, com a presença de 200 militares, esperando-se que, em breve, durante o dia de hoje, cheguem outros mil agentes entre membros da Força Nacional (um corpo de elite da Polícia de caráter federal) e do Exército.
O sindicato considera que a decisão constitui um paliativo que “não vai resolver o problema da insegurança”, já que o combate ao crime apenas pode ser eficaz se se investir na “reestruturação do corpo e em recursos humanos”.
“Vai ser um paliativo porque (o exército) terá que regressar um dia aos quartéis e o crime ficará então livre”, afirmou Legal.