A reforma de supervisão do Governo, que passa pela criação de uma entidade independente para coordenar o trabalho dos reguladores já existentes e, ao mesmo tempo, ficar com os poderes do Banco de Portugal (BdP) em matéria de resolução bancária e de supervisão macroprudencial, “não levanta qualquer problema jurídico, em teoria”, disse à VISÃO Eduardo Paz Ferreira, professor catedrático da Faculdade de Direito de Lisboa e presidente do Instituto de Direito Económico Financeiro e Fiscal (IDEFF).
Nuno Pena, sócio fundador da CMS Rui Pena & Arnaut, tem a mesma opinião: “Em tese, é possível. De acordo com as diretivas europeias, a autoridade de resolução tanto pode ser o banco central como outra entidade independente”. Ambos os juristas apontam o exemplo do Reino Unido, onde os poderes de resolução dos bancos em dificuldades estão concentrados numa entidade externa ao Banco de Inglaterra. Desde o início da União Bancária que naquele País é assim.
Embora sem conhecer os pormenores das alterações que o Governo quer introduzir, tanto em matéria de resolução bancária como de supervisão macroprudencial, Paz Ferreira afirma que, do seu ponto de vista, “não chocam em nada com a legislação europeia. Podem é chocar com outras sensibilidades, mais políticas”.
Na quinta feira, o ministro das Finanças anunciou que o Governo vai criar uma nova entidade de supervisão financeira para coordenar o trabalho dos órgãos reguladores já existentes – Banco de Portugal, Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF). Os poderes de resolução bancária, que permitiram ao banco central decidir, em 2014 e 2015, respetivamente, a intervenção nos antigos BES e Banif, serão também transferidos para essa nova entidade.
Este último ponto vai de encontro a uma proposta do governador do Banco de Portugal, que há já algum tempo vinha chamando a atenção para o “desconforto” de resolver um banco para, de seguida, negociar a sua venda, ao mesmo tempo que continua a exercer funções de supervisão bancária.
A nova entidade que, segundo o ministro, terá a “responsabilidade última da estabilidade financeira”, terá também as funções de supervisão macroprudencial, a área que cruza variáveis macroeconómicas como Produto Interno Bruto (PIB), inflação ou finanças públicas com os balanços e contas dos bancos, com o objetivo de tornar o sistema financeiro mais sólido.
Por enquanto, o BdP desconhece o novo enquadramento regulatório, que só deverá ser apresentado depois de Junho. Até lá, o Ministério das Finanças vai efetuar uma consulta pública do anteprojecto do documento de reforma regulatória elaborado pelo ex-presidente da CMVM, Carlos Tavares. Só depois haverá uma “proposta legislativa” do Governo, segundo anunciou o ministro.