Dois ou três dias antes de cair o governo foi apresentada publicamente a Estratégia Nacional para a Gestão da Água – Água que Une. Mais uma estratégia. Conforme Luís Montenegro afirmou, a “transformação estratégica e estrutural do nosso país”, como sempre, na água e em tudo, “agora é que vai ser”. Devemo-nos questionar para que serviram todos os planos e estratégias anteriores.
O primeiro-ministro disse muito mais, afirmou que “em Portugal não há um problema de falta de água, há um problema de falta de capacidade de gestão da água”. É um facto, mas não deixa de ser inacreditável.
Quase em jeito de resposta, a ministra do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho, escreveu o seguinte no documento a que tivemos acesso: “Toda a água – superficial ou subterrânea, doce ou salgada – está interligada e deve ser administrada de forma sustentável. Integrada. Conjunta. Consensualizada. Modernizada.”
Conclusão, como muitas vezes afirmo e escrevo: na Europa, somos dos países com mais disponibilidade de água, apenas usamos cerca de 10%, mas somos incapazes de gerir eficazmente tão importante recurso. Às vezes, até parece que não compreendemos a irrevogável importância da “segurança hídrica do País”. Não nos falta sequer competente saber, a maioria das vezes com as pessoas certas no lugar certo, mas, porque “há sempre um mas”, a gestão estratégica e estrutural, a médio e a longo prazo, não se concretiza mais uma vez.
Temos, desta vez, uma forte desculpa, “o governo caiu”. A importância vital da água, bem mais do que um recurso, será outra vez esquecida e adiada, enquanto a procura aumenta e o desperdício prevalece (parece fazer parte do nosso modo de vida), pelo menos até uma nova crise, conhecida por seca. E quando chegar esse novo episódio de seca, a gestão será a emergência que se improvisa e iremos esperar pacientemente que a bendita chuva jorre dos céus.
Efetivamente, o ciclo da água em Portugal é muito assimétrico, variável, irregular e, cada vez mais, imprevisível. No Minho, chove três vezes mais do que no Alentejo, e digo aos meus alunos que esta é a justificação mais remota para que o Minho tenha seis ou sete equipas de futebol na 1ª Liga e o Alentejo nenhuma.
Não importa só quanto chove, mas, também, onde e como chove. Deve igualmente ser referido que a gestão da água em Portugal não é uma questão linear e o desafio não se fica só pela quantidade. Cada vez mais, temos de atender e tomar decisões em função da qualidade das massas de água.
Num contexto realista de restrição de disponibilidade, já que a Estratégia aponta para 6% em 15 anos, e de crescimento da procura em cerca de 26%, é fundamental que o País assuma, definitivamente, uma gestão estratégica que transcenda claramente os ciclos eleitorais. Ou seja, urge um pacto de regime.
Por último, e não menos importante, teremos igualmente de estar cientes de que não haverá nenhum tipo de sustentabilidade sem existir o equilíbrio financeiro entre os custos da água e os valores que os diferentes utilizadores pagam; na água, o balanço é brutalmente negativo.
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